O Estado de São Paulo, n. 44502, 21/08/2015. Política , p. A6

‘Fui escolhido para ser denunciado’, afirma Cunha

ERICH DECAT

 

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) recebeu no fim da tarde de ontem as 85 páginas da denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Após uma reunião com integrantes do seu grupo político no gabinete da presidência da Casa, o deputado divulgou uma nota na qual afirmou que é inocente e voltou a acusar o governo federal de estar por trás das investigações e da acusação formal apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. 

“Como eu já disse anteriormente, fui escolhido para ser investigado e, agora, ao que parece, estou também sendo escolhido para ser denunciado, e ainda, figurando como o primeiro da lista”, disse Cunha, alegando que recebeu a denúncia com serenidade e alívio porque “agora o assunto passa para o Poder Judiciário”. 

“Não participei e não participo de qualquer acordão e certamente, com o desenrolar, assistiremos a comprovação da atuação do governo, que já propôs a recondução do procurador, na tentativa de calar e retaliar a minha atuação política.” 

O peemedebista afirmou também que considera “muito estranho não ter ainda nenhuma denúncia contra membro do PT ou do governo, detentor de foro privilegiado”. 

“À evidência de que essa série de escândalos foi patrocinada pelo PT e seu governo, não seria possível retirar do colo deles e tampouco colocar no colo de quem sempre contestou o PT, os inúmeros ilícitos praticados na Petrobrás”. O peemedebista também disse “achar estranho” o fato de a denúncia ter sido publicada no mesmo dia em que foram realizadas manifestações contra ele nas ruas.

‘Solidariedade’. Antes de divulgar a nota, Cunha se reuniu em seu gabinete – com janelas voltadas para o Supremo Tribunal Federal (STF) – com líderes partidários e deputados que foram prestar “solidariedade”. O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) leu trechos do resumo da acusação de Janot, postado no site oficial do Ministério Público Federal. 

Segundo relatos, Cunha rebateu “ponto a ponto”, considerou a peça acusatória como “ridícula” e disse que “a montanha tinha parido um rato”.

Nas conversas com o grupo de aliados, o peemedebista, segundo relatos, afirmou em várias ocasiões que era alvo de um “complô” arquitetado por Janot, pelo Palácio do Planalto e pelo PT, em razão de ele ter rompido como o governo em julho.

Força. Cunha reiterou que não vai se afastar do cargo. Ele vai participar nesta sexta de um ato da Força Sindical, em São Paulo, organizado pelo presidente do Solidariedade, deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, um dos seus principais aliados. “Ele votou com os trabalhadores. Terá o apoio da entidade”, disse Paulinho. 

Segundo ele, a reunião foi marcada há duas semanas para tratar dos vetos da presidente Dilma Rousseff, entre eles o referente à flexibilização do fator previdenciário. Também está na pauta o veto à extensão da regra de correção do salário mínimo para todos os aposentados. Paulinho disse que, “com certeza” haverá manifestação de apoio a Cunha por parte de dirigentes e da militância.

Além do ato em São Paulo, integrantes do grupo de Cunha vão insistir nos próximos dias o argumento de que é necessário que haja o amplo direito de defesa e presunção de inocência. “O PGR tem a prerrogativa de fazer a denúncia, foi feita, e agora é o momento da defesa. Esse episódio não atrapalha a condução dos trabalhos. Esse é um processo que diz respeito apenas à pessoa do Eduardo Cunha”, afirmou o deputado Sérgio Souza (PMDB-PR), logo após deixar o gabinete da presidência da Câmara. “É importante que ele consiga provar a inocência até para o bem da instituição”, ressaltou Avelino. 

O líder do PSD, Rogério Rosso (DF), disse que a reação de Cunha passa também por colocar em pauta para votação projetos que dialoguem com a “vida real” da população. / COLABOROU DAIENE CARDOSO

 

Oposição diz não querer fazer prejulgamento

DAIENE CARDOSO E BERNARDO CARAM

 

Líderes dos principais partidos de oposição ao governo Dilma Rousseff na Câmara foram comedidos ao comentar nesta quinta-feira, 20, a denúncia contra o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a quem a Procuradoria-Geral da República atribui os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro por envolvimento em um esquema que desviou US$ 40 milhões em dois contratos de navios-sonda da Petrobrás.

Tanto PSDB quanto DEM, que atacam as gestões petistas pelos escândalos de corrupção e miram suas críticas na presidente, dizem que se deve esperar se o Supremo Tribunal Federal vai aceitar a denúncia antes de definir o destino do peemedebista no atual cargo.

“Não vou fazer prejulgamento nem blindar”, afirmou o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE). Para ele, é preciso aguardar os desdobramentos da denúncia antes de se discutir um eventual afastamento de Cunha da presidência da Casa e respeitar o direito à ampla defesa. “Ninguém pode ser condenado previamente”, disse Mendonça.

Para o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), a denúncia é o “início de um processo de apuração e, dessa forma, é preciso aguardar antes de se fazer qualquer julgamento”. “Sempre defendemos o aprofundamento das investigações e o instituto da delação premiada, independente de quem esteja envolvido. Caberá a ele, agora, apresentar a sua defesa e depois disso, o STF irá definir se aceitará ou não a denúncia”, disse o tucano.