Título: Mais juízo com a crise
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Fonte: Correio Braziliense, 21/08/2011, Opinião, p. 20

Visão do Correio

Já não são sinais nem previsões: a economia mundial patina e a contração é iminente. Assim como em 2008, o pânico contamina o mercado financeiro. Na semana passada, pelo menos um banco europeu teve de recorrer a empréstimo. A crise tem seu epicentro nos Estados e na União Europeia, mas mesmo em países com situações internas confortáveis a expansão do PIB vem sendo revista para baixo ¿ casos da China, da Índia e do Brasil. E são eles os motores com que vinha contando o globo. Difícil é saber até quando se sustentarão com a retenção dos negócios.

No Brasil, as exportações acusam o baque. O envio de café, soja e carne para o exterior entrou em declínio em julho. Agosto mantém a tendência, com uma redução na pauta geral para as duas primeiras semanas prevista em 7,8%. Além de vendas menores, os preços das commodities estão em queda, e é justamente desses produtos básicos com cotação internacional que vem a força da balança comercial brasileira. Por ora, ainda há expressivo superavit, mas a conjuntura preocupa.

Para agravar o quadro, a inflação não dá sinais de arrefecimento. Antes pelo contrário. O Índice Geral de Preços-10 (IGP-10) subiu 0,20% em agosto; o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), 0,26%; o IPA agrícola, 0,89%; o industrial, 0,04%. Nessa escalada, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) superou as expectativas, elevando-se 0,27% e acumulando alta de 7,10% em 12 meses, acima da meta do governo, de 6,50%. Isso, com a taxa básica de juros em 12,50%, um dos mais apertados garrotes econômicos do planeta.

Na sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff tentou injetar ânimo no mercado: "A crise lá fora acontece e nós vamos continuar aqui trabalhando, construindo casas, construindo mais indústrias, gerando mais empregos. Este país é, de fato, um país muito rico". Palavras, contudo, certamente serão insuficientes para manter o otimismo do setor produtivo. No mesmo dia, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) anunciava que o Índice de Confiança do Empresário Industrial caiu 1,5 ponto percentual em agosto, atingindo 56,4 pontos.

A questão é que 2008 revelou a brutal carência de uma governança global e a urgente necessidade de aperfeiçoamento dos mecanismos de regulação internacional, mas quase nada foi feito desde então para corrigir os erros. Por sua vez, o governo brasileiro se gabou de estar em situação confortável para enfrentar a crise e também não fez o dever de casa. Descoberto que a crise continua aí, latente, hoje temos os mesmos desafios de reformar os sistemas tributário, previdenciário, jurídico e político, conter os gastos públicos e desenvolver a infraestrutura nacional. Tudo isso e mais o compromisso internacional de sediar nos próximos cinco anos os dois maiores eventos esportivos do mundo.

Não bastasse, a base governamental no Congresso está em frangalhos, dividida depois de a presidente Dilma deflagrar verdadeira faxina em ministérios sob suspeita de abrigarem quadrilhas de assaltantes dos cofres públicos. A hora grave exige resposta à altura dos Três Poderes da República e vigilância extrema da sociedade. Partidos políticos que preferem defender interesses eleitoreiros em detrimento das urgências nacionais precisam ser varridos pelas urnas. Só assim este país se colocará no seu devido tamanho. Só assim estará capacitado a assegurar ao cidadão a saúde, a educação e a segurança que lhe são devidos.