MARCELLO CORRÊA
O globo, n. 30000, 26//09/2015. Economia, p. 21
Pelo quinto mês seguido, houve redução no emprego formal em agosto. Nos últimos 12 meses, o país eliminou quase 1 milhão de vagas com carteira. O mercado de trabalho formal brasileiro teve o pior agosto em 20 anos. No mês passado, foram extintas 86.543 vagas com carteira assinada, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgados ontem pelo Ministério do Trabalho. Foi o quinto mês seguido de resultado negativo e a maior perda de empregos com carteira assinada num mês de agosto desde 1995, quando o saldo entre admissões e demissões ficou negativo em 116.856 vagas. Para analistas, o número reforça a previsão de que o Brasil vai terminar o ano com 1 milhão de empregos a menos.
Essa marca não está longe. Nos 12 meses encerrados em agosto, o saldo acumulado de vagas ficou negativo em quase um milhão (985.669). Só entre janeiro e agosto, o tombo chega a 572.792 postos formais de trabalho. Segundo cálculos do economista André Gamerman, da Opus Gestão de Recursos, se os dados do Caged dos próximos meses forem idênticos aos registrados entre setembro e dezembro do ano passado, a perda de 1 de um milhão de vagas será confirmado.
— O dado de agosto foi a continuação do que a gente está vendo nos últimos cinco meses. Uma piora consistente do mercado de trabalho — avalia Gamerman.
RESULTADO 10 VEZES PIOR NA INDÚSTRIA
Embora tenha mantido a sequência negativa, o resultado de agosto foi melhor que o de julho, quando o país eliminou 157.905 vagas. Isso, porém, não significa recuperação, porque historicamente agosto tende a ser melhor que julho para o mercado de trabalho. É que as empresas começam a se preparar para a alta de consumo do fim do ano e aumentam as contratações. Em agosto do ano passado, por exemplo, foram geradas 101.425 vagas formais, resultado muito melhor do que o deste ano.
No setor de serviços, um dois únicos que contrataram mais do que demitiram, o número foi tímido. Responsável pelo emprego da maior parte da força de trabalho no país, o segmento gerou 4.965 vagas formais, já descontadas as demissões. Em agosto de 2014, os serviços abriram 71.292 vagas, sustentando o resultado daquele mês. O outro foi a administração pública, com a criação de modestos 730 empregos. O comércio também vai mal: fechou 12.954 postos de trabalho, mantendo o movimento de corte que vem desde o começo do ano.
— Quando a gente fala de emprego no Brasil, muito mais importante que indústria, é comércio e serviços. Até o ano passado, eram setores que seguravam o mercado e estão muito mal neste ano. Mais da metade da piora foi nesses segmentos — destaca Raone Costa, economista da Catho Fipe.
A indústria de transformação liderou as perdas, com um resultado mais de dez vezes pior que um ano antes. Foram 47.944 empregos extintos no mês passado, contra 4.111 em agosto de 2014. Em seguida veio a construção civil, que fechou 25.069 vagas no mês.
O Caged de agosto é o primeiro a ser divulgado após a criação do Programa de Proteção ao Emprego (PPE), anunciado pelo governo em julho, para evitar demissões. O mecanismo permite que empresas reduzam até 30% da jornada do trabalho e os salários de funcionários. Para Costa, o programa tem pouco efeito, em um momento de crise prolongada.
— É importante, é uma medida na direção correta, só que a gente está no meio de uma recessão. É muito difícil evitar demissões, se a indústria não está vendendo para ninguém. A crise que a gente está sofrendo hoje vem de vários anos. O último ano de crescimento bom foi em 2010. Não existe PPE que resolva — afirma o analista.
MINISTRO APOSTA NA CONSTRUÇÃO CIVIL
Para o governo, porém, o corte de vagas em agosto, na comparação com julho, pode indicar uma recuperação do mercado de trabalho. Segundo o ministro do Trabalho, Manoel Dias, uma das saídas para a crise pode ser o aumento do investimento na construção civil, que já eliminou 177.794 empregos formais neste ano. Dias afirmou que o governo contratou R$ 36 bilhões em projetos de moradias populares, como as do programa Minha Casa Minha Vida, que devem gerar 3,7 milhões de empregos. O tempo para oferta dessas vagas, no entanto, é incerto, podendo ser até o fim do ano ou em meados do ano que vem, pelas contas dos técnicos da pasta.
— Historicamente, a área da construção civil começa a contratar em torno do segundo semestre. No início do ano, há a compra do terreno, o projeto, a contratação do financiamento e, geralmente, em julho e agosto aumenta a contratação — afirmou o ministro do Trabalho, que não descartou que o país chegue ao fim do ano com saldo negativo de 1 milhão de vagas formais.
Para a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, mais do que investimento em setores, a melhora passa pela retomada da confiança
— Há um ciclo do mercado de trabalho que não se completou. Está cedo para uma acomodação. A gente teve agora recentemente o agravante da perda do investment grade, da turbulência no mercado, que tem um impacto financeiro no setor produtivo. Se havia a ideia de que a economia poderia chegar ao fim do ano com a sensação de que o pior já passou, essa perspectiva foi adiada. Mesmo a indústria deve demitir ainda mais. Não tem qualquer qualquer luz no fim do túnel — analisa Zeina.
Em comunicado a clientes, o banco Fator também prevê piora do mercado. “A queda nas admissões é muito mais acentuada. A implicação por traz disso é, novamente, muito ruim para o mercado de trabalho: por enquanto a piora se manifesta mais profundamente nas admissões, quando esta começar a ser sentida nas demissões, a situação deve ficar sensivelmente pior.