Petistas em fuga

 

CRISTINA TARDÁGUILA, CÁSSIO BRUNO, SÍLVIA AMORIM E CHICO DE GOIS 

O globo, n. 30000, 26//09/2015. País, p. 3

 

Primeiro foi o escândalo do mensalão. Depois, o da Lava-Jato. Veio então o embate do ajuste fiscal, o Orçamento deficitário, o dólar a mais de R$4 e a dificuldade do governo federal de tirar o país da crise. Ao somar esses fatores ao calendário eleitoral — que determina que o político precisa estar filiado ao partido pelo qual pretende disputar uma eleição um ano antes do pleito —, o resultado que se verifica na última semana de setembro é um notável êxodo nos quadros do PT.

AILTON DE FREITAS/13-12-2012ALESSANDRO MOLON (RJ) Alegou falta de autocrítica do partido em relação aos casos de corrupção. Ao se filiar à Rede, pode concorrer à prefeitura do Rio em 2016. Sua chance seria praticamente nula se continuasse no PT, que deverá apoiar o candidato do PMDB

Na última quinta- feira, o deputado federal Alessandro Molon (RJ) anunciou que deixava a sigla, rumo à recém-criada Rede, de Marina Silva. O GLOBO apurou que devem segui-lo outros três deputados petistas: Assis do Couto (PR), Toninho Wandscheer (PR) e Weliton Prado (MG). Nenhum deles foi localizado para confirmar a informação. Prado já entrou com ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para se desfiliar sem perder o mandato. Também acaba de deixar o PT o empresário Jesus Rodrigues (PI), deputado federal na última legislatura. Ele ingressou no PSOL, pelo qual pretende disputar a prefeitura de Teresina.

No Senado, o cenário não deverá ser diferente. Em abril, Marta Suplicy anunciou que saía do partido e, hoje, em São Paulo, assina sua filiação ao PMDB. Paulo Paim (PT-RS) disse que até o fim do ano decide seu destino, afirmando que tem conversado com vários partidos para encontrar aquela que poderá a ser sua nova casa. Entre eles estão a Rede, o PDT, o PSB e o PV.

Os parlamentares têm alguns pontos em comum, apontam analistas. Eles estão preocupados em atender ao calendário do TSE para poderem concorrer nas eleições de 2016; em abandonar um partido cuja “marca está em crise”; e em se recolocar no espectro político, conquistando espaço que o PT não lhes daria. Molon e Marta, por exemplo, teriam pouquíssimas chances de disputar as prefeituras de Rio e São Paulo, respectivamente, se permanecessem na sigla.

“ENCOLHIMENTO COM QUALIDADE”

Se analisado o cenário do PT nos estados, o êxodo também ganha evidência. Em São Paulo, até ontem, a legenda havia contabilizado a saída de 12 de seus 68 prefeitos — 17% do total. A “fuga” aconteceu em cidades pequenas do interior como Jaú, Itupeva, Taquaritinga, Sales de Oliveira, Roseira, Piquete, Iracemápolis e Santa Branca. A direção do partido nega que esse movimento tenha a ver com desgaste. Diz que é um “processo que vem ocorrendo desde 2013”.

No Rio de Janeiro, três dos dez prefeitos eleitos em 2012 já haviam deixado o partido até ontem — uma retração de 30%. Dois deles — de São Pedro da Aldeia e de Paraty — alegaram desgaste político para se desfiliarem. O de São Sebastião do Alto, Mauro Henrique Chagas, foi expulso depois de preso pelo crime de improbidade administrativa.

— Acho que quando um partido deixa de ter consonância com a sociedade é um bom motivo para sair — diz o prefeito de Itupeva (SP), Ricardo Bocalon, militante do PT desde 1989, e que se filiou ao PSB de olho na reeleição. — Eu gostaria que o partido pudesse ser renovado e fizesse uma reflexão sobre tudo que vem acontecendo. Mas não fez, e, por isso, não dá mais para ficar.

Para o presidente do PT no Rio, Washington Quaquá, o esvaziamento da sigla não é de todo ruim.

— Estou rezando ao Papa Francisco para que saia mais gente — disse ele ontem. — O PT tem que encolher com qualidade, com gente qualificada e compromisso com as causas populares.

As ameaças de defecção também pairam sobre o PT no Paraná. Na semana passada, o presidente nacional da sigla, Rui Falcão, foi ao estado para tentar debelar a onda de desfiliações. Reuniu-se com 11 prefeitos e diz que, pelo relatório feito pelo deputado Enio Ferri, presidente do partido no Paraná, foi “parcialmente bem-sucedido”.

— Dos 11, 7 ou 8 parece que tomaram a decisão de permanecer — afirmou Falcão.

Tanto para o cientista político e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) Carlos Melo como para o professor de Ciência Política da Unirio Felipe Borba, a marca PT tem um problema. Melo diz que ela está “queimada no mercado”. Borba, que “já não é tão forte”.

— Não são só o mensalão, a Lava-Jato e a pecha da corrupção. Agora tem a crise econômica e a sensação de que o PT não é um bom gestor. Trata-se de uma marca que enfraqueceu — afirma Borba.

 

Lei eleitoral acelera as mudanças

 

Alei eleitoral vigente no país é clara: o político precisa estar filiado ao partido pelo qual pretende disputar um cargo eletivo pelo menos um ano antes do pleito. É por esse motivo que o vaivém de políticos se aqueceu nos últimos dias. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a eleição de 2016 será no dia 2 de outubro — logo, os políticos têm até a próxima sexta-feira para decidir a sigla pela qual concorrerão.

Em outro ponto, a lei eleitoral define que o político que quiser se desfiliar de um partido só mantém o mandato em dois casos: se migrar para uma sigla que acaba de ser criada ou se alegar que a sua legenda não está cumprindo o conteúdo programático. Isso explica, por exemplo, o interesse de alguns políticos pela Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva, que acaba de obter registro.

Mas, sobre essas duas regras eleitorais, paira uma incerteza. Sobre a mesa da presidente Dilma Rousseff estão as novas leis eleitorais — aprovadas pelo Congresso em meio à minirreforma eleitoral. De acordo com a nova legislação, que aguarda sanção presidencial para entrar em vigor, o prazo mínimo de filiação cairia de um ano para seis meses. Haveria ainda uma “janela” de desfiliação: 30 dias para deixar o partido sem perder o mandato após a promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

Para que as novas regras eleitorais comecem a valer já nas próximas eleições, é necessário que a presidente Dilma sancione a lei até a próxima sexta-feira.

Com as mudanças, o tempo de campanha passa a ser de 45 dias. Hoje, são 90. E o período de propaganda em rádio e TV cai para 35 dias. Hoje, são 45.