Correio braziliense, n. 19096, 07/09/2015. Economia, p. 7

 

Novo tributo duraria dois anos

 

Antonio Temóteo 

O governo estuda criar um imposto provisório com validade de dois anos para cobrir o rombo nas contas públicas. Integrantes da equipe econômica detalharam que, nas reuniões com empresários na semana passada, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, recebeu o apoio de alguns pesos pesados da economia para reforçar o caixa do Tesouro por meio da instituição de um tributo que tivesse prazo de validade para deixar de ser recolhido. Após receber o aval de parte do setor produtivo, o Executivo concentrará esforços em convencer a base aliada no Congresso a abraçar a ideia. 

Assessores de Levy avaliam que terão menos dificuldade de convencer a base aliada a aprovar um novo tributo por dois anos - o prazo seria fixado em lei - do que alterar regras para concessão de benefícios previdenciários. As despesas obrigatórias da União com a Previdência correspondem a 40% do total de gastos do Executivo, e não podem ser cortadas. "É mais fácil levantar os R$ 70 bilhões para cobrir o deficit fiscal e alcançar um primário que corresponda a 0,7% do PIB (Produto Interno Produto) do que fazer uma reforma da Previdência", comentou um servidor da Fazenda. 

Mas o desafio será grande. Dentro do próprio PT, partido da presidente  Dilma Rousseff, há resistência contra elevação da carga tributária. Muitos avaliam que essa medida aumentaria ainda mais a revolta dos eleitores e daria munição para críticas da oposição. Outro problema será convencer o PMDB, maioria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, a se empenhar na aprovação da medida. O grupo anti-Dilma da legenda, que tem como principal liderança o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), por exemplo, defende mais cortes no lugar de aumento de impostos. 

O esforço para convencer deputados e senadores já começou. Na semana passada, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, iniciou conversas com parlamentares para explicar a necessidade de encontrar uma solução para cobrir o deficit primário das contas públicas em 2016, estimado em 0,34% do PIB. Somente a União seria responsável por um desequilíbrio de 0,5%, ou R$ 30,5 bilhões. Novos encontros estão agendados para a próxima semana, e os líderes do governo no Congresso começarão as articulações após a reunião de coordenação política, marcada para amanhã. 

Sinalizações 
Os sinais de que o governo trabalha com a possibilidade de criar um imposto provisório começaram a aparecer há pouco mais de 10 dias. Na ocasião, o governo lançou a ideia de recriar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), extinta em 2007, mas recuou, logo em seguida, diante da rejeição de empresários e parlamentares da própria base aliada. Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff voltou à carga ao afirmar que não descartava nenhuma nova fonte de receita para cobrir o rombo fiscal. Na sexta-feira, por fim, ela disse que o governo não tem mais como cortar gastos. 

O discurso favorável a um novo tributo renasceu em entrevista Levy no sábado, ao fim da reunião do G-20, grupo das maiores economias do mundo, na Turquia, quando ele revelou o debate interno no governo. "Pode ser que seja um imposto para ajudar a gente fazer essa travessia. Algumas pessoas têm sugerido isso, não o ministério. Estamos no meio de uma discussão, numa fase de construir as propostas", comentou. 

O ministro da Fazenda tem reiterado que o importante é evitar que o país perca o grau de investimento concedido pelas agências de classificação de risco, já que isso agravaria a recessão. 

Outro que encampou a tese de que o governo precisa aumentar tributos provisoriamente para reforçar o caixa do Tesouro foi o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Em entrevista a Folha de S. Paulo publicada ontem, ele afirmou que a medida abriria espaço para uma queda mais rápida das taxas de juros. Para Mercadante, isso baratearia o crédito e levaria o país a voltar a crescer mais rápido. Ao ser questionado se o Brasil enfrentaria dois anos de recessão, como prevê a maioria dos economistas, ele projetou que os sinais de recuperação voltarão a aparecer entre outubro e dezembro. 

Em paralelo aos estudos para a criação do imposto, o governo analisa a possibilidade de se desfazer de ativos. Entre as alternativas em discussão, está a venda de direitos de laudêmio, de prédios e terrenos que não são usados por órgãos públicos, além da abertura de capital da Caixa Seguradora. 

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Vem aí o Natal da recessão

Rodolfo Costa


Esqueça as árvores natalinas recheadas de presentes. O aumento do desemprego e da inflação, que corroem a renda dos trabalhadores, deve reduzir o movimento nas lojas e provocar queda do faturamento do varejo no fim de ano. Depois de resultados fracos nas principais datas comemorativas, comoa  Páscoa e o Dia das Mães, o Natal, tido como a melhor época para vendas, será marcado pela troca de lembrancinhas. Para piorar, quem está desocupado e começou a receber o seguro-desemprego entre abril e junho não terá mais um real no orçamento porque já terá recebido as cinco parcelas do benefício. E isso implicará aumento dos calotes.

A Confederação Nacional do Comércio (CNC) espera o pior Natal em 12 anos, e a primeira queda de vendas desde o início da série histórica da entidade. A Confederação Nacional de Dirigentes Logistas (CNDL) prevê redução de 2% nos negócios em relação a 2014, num período em que as vendas costumam dar saltos.

Na opinião do economista-sênior da CNC, Fábio Bentes, até o jantar de Natal será afetado. "Em vez de de comprar vinho importado, o consumidor deve levar para a ceia um nacional. Aquela bacalhoada ou pratos elaborados com alimentos cotados em dólar não estarão na mesa", diz.

Nos últimos 12 meses, a moeda norte-americana já se valorizou 63% - e pode subir inda mais se o país perder o grau de investimento das agências de risco. "Esse quadro traz impactos aos segmentos de hiper e supermercados e de artigos de uso pessoal e doméstico, que foram dois dos que mais contrataram trabalhadores temporários no ano passado", afirma Bentes.

Menos empregos
Sem confiança na economia, a expectativa é de que os empresários mantenham o freio dos investimentos. A compra de produtos para formação de estoques será reduzida em relação ao ano passado. Com menos mercadorias para venda, as contratações de empregados no fim de ano serão inferiores às de 2014, quando foram gerados 139,5 mil empregos temporários. "O número será o menor desde 2009, quando a CNC iniciou o monitoramento de empregos provisórios", prevê Fabio Bentes.

Com os mais de 500 mil empregos fechados de janeiro a julho, conforme dados do Ministério do Trabalho, o número de requerimentos do seguro-desemprego subiu a partir de abril. Nos sete primeiros meses do ano, o gasto com o pagamento do benefício já chegou a R$ 20,4 bilhões. A tendência é que essa renda acabe quando as cinco parcelas forem depositadas. Assim, quem recebeu o primeiro seguro entre abril e junho, não terá dinheiro no orçamento entre outubro e dezembro. "Será, sem sombra de dúvida, um Natal em que os lojistas demandarão menos das indústrias, contratarão menos e venderão menos", afirma Honório Pinheiro, presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL).

Wellington Soares, 23 anos, e Marcos Freire, 23, estão desempregados há duas semanas. Os dois trabalhavam na área de atendimento em uma casa de câmbio, mas a disparada do dólar minou as despesas com viagens das famílias brasileiras. "Havia mais pessoas querendo vender dólar do que comprar. Os clientes que detinham a moeda queriam se desfazer dela como fonte de renda", relatou Wellington, que vai presentear os pais com uma peça de vestuário. "No ano passado, gastei R$ 1 mil com a compra de uma batedeira para a minha mãe e um relógio para o meu pai. Neste ano, vai ser só uma peça de roupa para não deixar a celebração passar em branco", acrescenta.

No ano passado, Freire comprou um guarda-roupa e um armário de cozinha para a mãe, e acessórios de uso pessoal para as irmãs, o que lhe custou R$ 1,5 mil. "Não digo que não vou comprar nada este ano, mas, certamente, serão lembrancinhas ou produtos de menor valor", afirma. A mesma realidade está vivendo Wellington Ferreira Pinto, 49, desempregado há oito meses. "Minha mulher e eu vamos assar um frango, e só. Será uma ceia simples, sem sofisticação nos pratos", lamenta. 

Bolsos vazios
Nas contas da Tendências Consultoria, o poder de compra dos trabalhadores recuará entre 7% e 8% em 2015, e uma nova retração deve ocorrer em 20165, fazendo a renda retragir aos níveis de cinco aos atrás. Quando excluídos os gastos com despesas essenciais - como alimentos, luz e água -, a queda chegará a 11% ou 12%.

"Será, sem sombra de dúvida, um Natal em que os lojistas demandarão menos das indústrias, contratarão menos e venderão menos"
Honório Pinheiro, 
presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL)