Governo quer reforma administrativa, com corte de dez ministérios

Lucas Marchesini e Ribamar Oliveira 

25/08/2015

O governo federal anunciou ontem estudos para uma reforma administrativa com o corte de dez ministérios. A medida foi discutida na reunião da coordenação política e anunciada sem maiores detalhes sobre quais pastas e quanto isso pode representar para o ajuste das contas públicas. Uma das alternativas em estudo para a redução dos ministérios, apurou o Valor, é a fusão de três secretarias especiais em um único órgão, que está sendo chamado de Ministério da Cidadania. Nessa hipótese, as secretarias a serem fundidas seriam as da Mulher, dos Direitos Humanos e da Igualdade Racial.

A redução do número de ministérios seguirá dois nortes principais, segundo fontes do governo. O Ministério do Planejamento, que ficou encarregado dos estudos, vai analisar, em primeiro lugar, os aspectos administrativos da mudança, procurando verificar aqueles que estão replicando atividades ou que estejam precisando de reforço. O objetivo é olhar os atuais processos administrativos de forma a racionalizar as ações do governo e ganhar eficiência.

O outro vértice da reforma administrativa está relacionado com a análise da viabilidade política da mudança. O governo quer compatibilizar as alterações na sua estrutura administrativa com a necessidade de manter o apoio de sua base de sustentação no Congresso.

O assunto foi discutido na reunião de coordenação política, pela manhã. Uma tentativa do governo de emplacar uma agenda positiva no momento em que o vice-presidente Michel Temer apresentava seu pedido de afastamento da articulação política formal com o Congresso. A reforma foi anunciada após o encontro, pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa.

Serão reduzidos os cargos comissionados - também não foram especificados de que setor e quantos, o número de secretarias dentro de cada ente do governo e lançado um programa para a venda de imóveis da União. Uma outra medida da reforma envolve a redução dos gastos de custeio. O governo não apresentou uma estimativa da economia de recursos, mas especialistas acreditam que não é nada significativo.

"Estamos iniciando o processo formalmente de reforma administrativa do governo federal. Ela já vinha sendo discutida na junta orçamentária e hoje [ontem] apresentamos as diretrizes", disse Barbosa. A reforma "envolve diversos setores do governo federal e melhor governança das estatais", acrescentou ele.

Agora, explicou o ministro, o assunto será discutido em todo o governo e o processo até a definição da reforma será capitaneado por cada uma das pastas. Ele espera recolher sugestões de todos os ministérios e outros entes do governo até o fim de setembro. Uma reforma administrativa vinha sendo cobrada pela oposição e chegou a ser tema da campanha presidencial do ano passado.

A reforma terá "cinco diretrizes" que, segundo Barbosa, devem levar a "ganho monetário e de eficiência". A primeira dessas diretrizes é a redução no número de ministérios que compõem o governo federal. Atualmente, são 39 entes com status de ministério. Esse número deve cair para 29 se a meta explicitada por Barbosa for cumprida. O corte de pastas seguirá critérios "tanto do ponto de vista de gestão pública quanto político".

Os ministérios são usados para garantir a base do governo federal no Congresso, o apoio dos partidos à presidente Dilma, fator que deve ser levado em conta quando for decidida a redução de pastas.

Já o corte de cargos comissionados atingirá o universo de 22 mil pessoas que ocupam postos dessa categoria atualmente no governo federal, calculou Barbosa. Segundo ele, cerca de 74%, ou 16,2 mil, desse total são de funcionários concursados. A terceira diretriz da reforma administrativa envolverá mudanças estruturais dentro de cada ministério e autarquia. Medidas nesse sentido podem ser, exemplificou Barbosa, a fusão de secretarias com atribuições superpostas. Esse tópico foi chamado pelo ministro de "racionalização da máquina pública".

O governo federal também pretende reduzir os gastos de custeio a partir da ampliação do programa já empreendido pela União nesse sentido. Uma medida já realizada pelo governo e usada como exemplo por Barbosa foi a centralização das compras de passagens aéreas. O ministro apontou o transporte de servidores e a limpeza dos edifícios como áreas que podem seguir o mesmo caminho.

A reforma também tem um viés arrecadatório. Dentro do programa, a gestão de Dilma pretende "gradualmente vender imóveis e racionalizar utilização de imóveis onde for possível", ideia já incluída em pacotes anteriores, mas não executada. No caso de terrenos de Marinha, por exemplo, o governo recebe taxas dos ocupantes dos terreno. A ideia é vender a propriedade para o ocupante.

Com a reforma, avaliou o ministro, "a principal economia é o aumento de produtividade". "Com a melhoria de gestão, diminuição da superposição, com o melhor funcionamento da máquina pública, você vai aumentar a produtividade. A gente espera aumentar a produtividade substancialmente no governo porque é uma área que tem potencial para aumentar bastante", disse Barbosa.

Segundo ele, o momento é adequado, porque o governo deve enviar até o fim do mês o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que, como apontou o ministro, será o primeiro elaborado nesse mandato presidencial, já que o que está em vigência para este ano foi redigido pela equipe econômica anterior.

Dilma diz que eliminará mil cargos e faz desagravo a Temer e Lula

A presidente Dilma Rousseff afirmou que o governo errou ao só perceber que a crise econômica era muito maior do que se esperava entre novembro e dezembro do ano passado - depois que já havia sido reeleita. Em entrevista aos jornais "Folha de S. Paulo", "O Globo" e "O Estado de S. Paulo", afirmou que a reforma administrativa vai cortar mil dos cerca de 22,5 mil cargos de confiança. A presidente reconhece que as mudanças vão trazer dificuldade política, mas afirmou que é necessário fazê-las. Ninguém será preservado dos cortes, nem mesmo o PT: "Vamos passar ministérios a limpo".

A presidente mostrou-se chocada com os rumores de que seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estaria de saída do cargo pelo fato de ter viajado para os EUA. "Isso é mentira. Ele foi ver a menina dele (filha), que vai morar na China."

Dilma fez forte desagravo a dois de seus principais aliados políticos: o vice-presidente Michel Temer (PMDB), que devolveu parte da articulação política, e ao ex-presidente Lula. Questionada sobre a frase dada pelo vice de que era preciso "alguém" para reunificar o país, a petista afirmou haver muita "intriga" no ar. "Não acho que o Temer falou com a intenção que atribuíram a ele. Ele é de extrema lealdade comigo", defendeu. "A primeira fase da articulação política [com a aprovação do ajuste fiscal] é um sucesso."

Sobre Lula, disse não achar "correto atitudes de tentar diminuí-lo". "Passam de todos os limites", disse ela, referindo-se à bomba lançada contra o Instituto Lula e ao boneco do presidente lançado nas manifestações de 16 de agosto. Para ela, atos de intolerância são inadmissíveis e "fascistas". Dilma afirmou, ainda, que ninguém pode interromper o processo da Lava-Jato, mas defendeu que, quanto mais rápidas e efetivas forem as investigações, melhor.

Valor econômico, v. 16, n. 3827, 25/08/2015. Brasil, p. A3