"A agenda de Dilma é sair da crise", diz ex-marido da presidente

Sérgio Ruck Bueno 

31/08/2015

O ex-marido e conselheiro informal da presidente Dilma Rousseff, Carlos Araújo admite que ela ficou abalada com a crise econômica e a perda de popularidade nos últimos meses, mas permanece tranquila porque sabe que o apoio ao governo vai se recuperar com a volta do crescimento e que as teses de impeachment ou cassação não têm base para ir adiante. Advogado trabalhista, ele diz ainda que, embora tenha optado por um "ajuste fiscal severo", a presidente não vai embarcar na agenda conservadora que prega, por exemplo, a flexibilização dos direitos dos trabalhadores.

"A agenda da Dilma é sair da crise", afirmou Araújo em entrevista Valor. Filiado ao PDT, ele também minimiza o estresse causado pela articulação de parte do PMDB para deixar o governo, porque esta divisão não é de agora. "O PMDB está muito bem no governo, é o aliado mais importante, mas parte substancial do partido já não apoiou a reeleição da Dilma. Não é uma situação nova", avalia.

O advogado considera "artificial" a crise política em torno da presidente, por ser construída basicamente a partir do "desejo" do senador Aécio Neves (PSDB-MG), derrotado na disputa presidencial de 2014, de antecipar a próxima eleição porque encontrou um "parceiro" para isto no presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e porque sabe que não será candidato do seu partido em 2018. "Será o [Geraldo] Alckmin [governador de São Paulo]", prevê. Para Araújo, o senador mineiro também sabe que agora, com o PT fragilizado pela Operação Lava-Jato, é o melhor momento para enfrentar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, na sexta-feira, disse em Montes Claros, norte de Minas Gerais, que, "se for necessário", será candidato novamente em 2018.

Ainda assim, Dilma sentiu o impacto. "Se perguntar se ela está abalada, é claro que uma pessoa que tem a responsabilidade de dirigir o país é abalada por uma crise econômica desta profundidade. Ela também perdeu momentaneamente o apoio da sociedade, mas tem plena consciência de que se trata de um momento e que daqui a pouco vai sair disto, o país vai se recuperar e ela vai se sentir em outro patamar", afirma. "Estive com ela recentemente e ela está totalmente calma", relata Araújo, para quem o governo já atingiu o "fundo do poço" e agora vai começar, "vagarosamente", a sair desta situação.

O advogado diz que as manifestações contra o governo são um "direito" das pessoas que estão insatisfeitas, mas entende que não há base para a interrupção do mandato, seja por impedimento, cassação ou renúncia. "Dilma não está preocupada com o impeachment porque sabe que não vai sair". Na opinião dele, o pedido do ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, para investigar se a campanha da presidente em 2014 recebeu dinheiro desviado da Petrobras "tem perna curta" porque as contas já foram aprovadas pelo próprio TSE. Segundo ele, a presidente entende ainda que a Operação Lava-Jato deve "apurar tudo" o mais rápido possível.

Na opinião de Araújo, a crise política está chegando ao fim depois que, de tanto a Câmara votar projetos contra o ajuste fiscal e o governo, as federações das indústrias de São Paulo e do Rio de Janeiro, mais os presidentes do Bradesco Luiz Carlos Trabuco, e do Itaú, Roberto Setubal, saíram em defesa da governabilidade, e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) aproximou-se da presidente. "A coisa passou dos limites, foi longe demais e o artificialismo começou a atrapalhar a saída da crise econômica. A elite quer ganhar dinheiro".

Os setores que proporcionaram algum alívio político para a presidente estão bem distantes da base social do PT, mas mesmo assim Araújo acredita que Dilma não ficou refém da agenda conservadora, como no caso da reforma trabalhista. "Não há perigo nenhum. Quando [os empresários] começam a ganhar dinheiro, daqui a pouco, isso diminui. Na hora da crise essa agenda sempre cresce, porque é uma saída que eles encontram", comenta.

Para ele, a pior parte das mudanças defendidas principalmente pelo setor financeiro e por alguns ramos da indústria é a ampliação da terceirização, que foi aprovada na Câmara e está agora no Senado. Ele não deixa clara a posição da presidente a respeito, mas afirma que a proposta "tem tantos inimigos neste país porque os resultados são tão nefastos, tão visíveis, que é muito difícil triunfar". Quanto ao possível estabelecimento de uma idade mínima para a aposentadoria pelo INSS, ele acha mais "difícil" fazer uma projeção numa conjuntura "fluida" como a atual. "Mas acho que não prospera".

Araújo reconhece que os movimentos sociais estão "apreensivos" com o ajuste fiscal do governo que 2016 ainda será um "ano duro" para a economia e que a crise "corrói momentaneamente" a base de apoio do PT, pois a sociedade quer "assegurar e ampliar" as conquistas. "A Dilma sabe que só vai recuperar [a base social] e melhorar a situação quando o país voltar a ter algum crescimento", reforça.

Valor econômico, v. 16, n. 3831, 31/08/2015. Política, p. A8