BC, sozinho, não resolve

 

JOÃO SORIMA NETO

O globo, n. 29999, 25//09/2015. Economia, p. 20

 

Nenhuma ação isolada do Banco Central ( BC), como a venda de reservas ou um choque de juros, terá força para conter a volatilidade do mercado, que está estressado com a falta de força política do governo e de um programa fiscal com maior credibilidade, dizem analistas. Sem a sinalização de um ajuste fiscal mais forte pela via do corte de gastos e de uma solução para o impasse político entre o Executivo e o Congresso, o nervosismo no mercado financeiro deve continuar, já que o BC sozinho não tem como determinar a cotação do dólar.

— O governo não quer cortar gastos, e a sociedade não deseja aumento de impostos. Enquanto essa equação, que passa pelo campo político, não for solucionada, a moeda americana vai continuar pressionada a curto prazo, e não é possível prever qual é o teto para a divisa — explica o sócio da consultoria Opus e professor da PUC/ RJ José Márcio Camargo.

Ontem, o dólar e os juros futuros recuaram após a fala do presidente do BC, Alexandre Tombini, mas, segundo analistas, trata- se de um movimento temporário. A ameaça do BC de vender reservas para estabilizar o câmbio assustou os especuladores, que continuam apostando na alta da moeda americana no mercado futuro. Havia uma espécie de consenso no mercado de que as reservas não seriam utilizadas para conter a volatilidade do dólar, mas isso acabou depois das declarações de Tombini.

— Não há fuga de divisas do país. Se o BC entra no mercado vendendo dólares no mercado à vista derruba a cotação, e os especuladores que apostavam na alta da moeda americana tomam prejuízo. A fala de Tombini deu essa sinalização aos especuladores — diz o economista Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências.

Mas o mercado deve seguir testando a disposição do BC de aumentar sua intervenção no mercado de câmbio para evitar uma explosão do dólar, acreditam os especialistas. Assim, o próximo movimento da autoridade monetária seria vender parte das reservas. Alguns economistas consideram o atual nível das reservas internacionais do país, de US$ 370 bilhões, muito elevado. Acham que elas rendem muito pouco ao governo, que tem custo elevado para emitir dívida.

— O BC não pode ficar só ameaçando. Nesse caso, deveria entrar vendendo um pouco das reservas para mostrar que as declarações de Tombini são firmes — afirma Maurício Pedrosa, sócio da Queluz Asset Management.

O efeito colateral de vender reservas no atual cenário de incertezas políticas e fiscais, segundo Camargo, da Opus, é uma possível interpretação pelo mercado de que o BC usou “a última bala da agulha”. Isso porque Tombini afirmou que não vai aumentar juros e que a Selic deverá permanecer no atual patamar, de 14,25% ao ano, por um período prolongado.

— O presidente do BC não poderia ter prometido que não elevará juros. Se houver um overshooting ( disparada) do dólar, com fuga de investidores, o BC poderá ser obrigado a subir a Selic como forma de atrair capital e evitar uma explosão da moeda americana. O problema é que um aumento de juros vai aprofundar a recessão e elevar o custo da dívida pública — analisa Camargo.

Atualmente, o país gasta 8% do Produto Interno Bruto ( PIB) com o pagamento de juros, o que corresponde a um desembolso anual de R$ 500 bilhões. A cada ponto percentual de aumento na Selic, o custo da dívida sobe em R$ 14 bilhões, em um período de 12 meses, segundo um estudo da Fundação Getulio Vargas ( FGV).

Ao sinalizar que pretende manter os juros em 14,25% por um período prolongado, o presidente do BC mostrou ao mercado que está propenso a postergar a convergência para a meta de inflação ( estabelecida em 4,5%) para 2017, evitando elevar o custo com a dívida pública.

— Um choque de juros só deve ser usado quando há uma fuga de capitais, e este não é o cenário atual — diz Cardoso, da Queluz.

O estrategista- chefe no Brasil do banco japonês Mizuho, Luciano Rostagno, acredita que só uma ação coordenada entre o BC e o Planalto, com alta de juros e corte de gastos, mostrando um objetivo comum, poderia reduzir a volatilidade do câmbio neste momento. Ele avalia que o mercado está sem um teto para o dólar e, com a falta de uma solução para a questão fiscal, não “há luz no fim do túnel”:

— Elevar a Selic sem nenhuma ação de política fiscal aumenta a chance de um novo rebaixamento do rating do país. E o dólar não cederia — afirma Rostagno.