Título: Dólar dispara e já atinge o aluguel
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 18/09/2011, Economia, p. 12

Moeda norte-americana vai a R$ 1.776, maior cotação desde julho de 2010. Valorização eleva o índice que corrige locação de imóveis

» Fortemente influenciado por temores de que a crise vai piorar na Zona do Euro, sobretudo no sistema bancário, que sofre de falta de liquidez, o dólar disparou 2,57% ontem. Com a elevação, a moeda norte-americana terminou o dia cotada a R$ 1,776, o maior valor desde 21 de julho do ano passado, quando havia alcançado R$ 1,784. Para os analistas, ela tem potencial para chegar a R$1,85 e, se os governos europeus afundarem ainda mais no lodaçal do endividamento, a cotação poderá bater nos R$ 2, passando a ter forte peso sobre a inflação brasileira. Mas os efeitos já serão sentidos nos próximos reajuste de aluguel.

Os inquilinos que tiverem o contrato reajustado em outubro vão sentir no bolso a alta do dólar, que disparou quase 12% em setembro. Indicador usado para corrigir a locação de imóveis, o Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) subiu 0,52% na segunda prévia do mês. No acumulado de 12 meses, atingiu 7,33% ¿ ou seja, se fosse mensal, seria esse o percentual mínimo para a correção dos contratos com vencimento hoje. Um aluguel no valor de R$ 1.000,00, por exemplo, subiria para R$ 1.073,30 apenas sob o efeito do dólar.

A cotação do dólar afeta os preços do aluguel porque, para se chegar à variação do IGP-M, os técnicos da Fundação Getulio Vargas (FGV) medem em quanto subiram os preços para a produção. Quando a moeda norte-americana se eleva, o custo de produção para fábricas e agricultores também cresce, devido aos insumos que vêm do exterior. O impacto na formação dessa taxa é imediato ¿ apenas na segunda semana de setembro, o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) subiu 0,59%.

Os produtos agropecuários tiveram forte influência: uma alta de 1,33% no período. As matérias primas brutas, a exemplo de minério de ferro, soja e trigo, encareceram 1,72%. Se o dólar continuar ladeira acima, como esperam os especialistas, o impacto no IGP-M será mais fortemente percebido pelos consumidores ao alcançar ainda produtos que utilizam componentes importados, a exemplo dos eletrônicos.

Derretimento O real foi a divisa que mais perdeu valor frente ao dólar nos últimos 30 dias. Enquanto a moeda brasileira recuou 11,01%, o franco suíço cedeu 11%, o peso mexicano encolheu 6,23% e o rand, da África do Sul, derreteu 6,05%. Com receio de que um banco de grande porte quebre na União Europeia ou de que a Grécia anuncie um calote, investidores estão migrando fortemente para ativos considerados mais seguros, como o dólar e os títulos com vencimento em 10 anos do Tesouro dos Estados Unidos. Tamanha procura vem incrementando a cotação da divisa norte-americana. Frente ao euro, ela subiu 0,80%. "Ninguém quer dormir vendido em dólar. Todo mundo está comprando", resumiu Italo Abucater, gerente da mesa de câmbio da corretora Icap Brasil.

Quando o banco Lehman Brothers foi à lona e o dólar atingiu R$ 2,40. As ações das instituições financeiras da Europa derreteram no pregão de ontem. Em Berlim, as ações do Deutsche Bank e do Commerzbank AG recuaram 5,2% e 3,68%, respectivamente. No Reino Unido, os papéis do Lloyds caíram quase 7%. Em Paris, o Société Générale perdeu mais de 5% de seu valor de mercado. Na Suíça, o Credit Suisse encolheu cerca de 4%.

Cálculo A despeito do dólar estar em tendência de alta em todo o mundo, no Brasil a elevação se intensificou depois que o governo decretou a cobrança do Imposto sobre Operação Financeira (IOF) em operações no mercado futuro e, principalmente, após o corte de 0,50 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic). "Os investidores externos fizeram o cálculo e, com o Brasil pagando menos juros e tributando o capital externo, estão evitando colocar mais dinheiro no país. Isso está reduzindo o fluxo de dólares e elevando a cotação da moeda", explicou Abucater.

Tombini faz apelo O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, apelou ontem por uma maior cooperação internacional a fim de evitar o agravamento da crise financeira mundial, marcada pelo forte endividamento das economias mais desenvolvidas. Em viagem a Lisboa, ele alertou para os desafios e as complexidades do cenário econômico e financeiro internacional. "Nos últimos dois meses, o cenário de desaceleração (da economia) tornou-se mais concreto. O momento requer discussões e cooperação internacional", declarou Tombini. "Se nenhuma ação de envergadura for tomada, a perspectiva é de um agravamento da crise", reforçou.