Título: A tragédia se repete
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Fonte: Correio Braziliense, 20/09/2011, Opinião, p. 16

O horror foi tamanho que se esperavam providências para que não se repetisse. Em Abaetetuba, no Pará, adolescente de 15 anos, apreendida por tentativa de furto, ficou 26 dias presa em uma cela na companhia de homens. Sofria estupros diários em troca de comida. Denúncia anônima feita ao conselho tutelar trouxe a tragédia a público em outubro de 2007.

Nova barbárie foi revelada na oportunidade. A então governadora do estado, Ana Júlia Carepa, declarou que a prática não constituía novidade. Era comum naquela unidade da Federação com a conivência de autoridades do Executivo e do Judiciário. O fato, que atravessou as fronteiras nacionais, cobriu o Brasil de vergonha e indignou as consciências civilizadas do mundo.

Passaram-se quase quatro anos: a governadora amargou a derrota nas urnas, o Judiciário condenou cinco delegados, o Conselho Nacional de Justiça determinou a aposentadoria compulsória da juíza do caso. Os desmandos, porém, continuam. Menina de 14 anos passou cinco dias sofrendo espancamentos e abusos sexuais de detentos da Colônia Agrícola Heleno Fragoso. A unidade penal fica a 50km de Belém ¿ vale dizer, no quintal das sedes dos Três Poderes locais.

Informações do conselho tutelar sugerem a existência de rede de prostituição mantida com a conivência de órgãos do estado. Só assim se explica o fato revestido de dupla gravidade. De um lado, a falta de controle na entrada de pessoas não autorizadas em presídios. De outro, o comércio do sexo envolvendo menores e detentos. Em suma: o império do desmando escancara as portas. O governador Simão Jatene mandou demitir o diretor da penitenciária e funcionários por negligência. Não é suficiente.

A punição deve ser o primeiro passo do processo. Conforme a legislação vigente, o crime de estupro é punido com pena entre 6 e 10 anos de reclusão. Se praticado contra menor de 18 anos, caso resulte em lesão grave, inclusive de natureza psicológica, a pena varia entre 8 e 12 anos. Trata-se de delito que não pode ser beneficiado com anistia, graça ou indulto e não admite fiança nem liberdade provisória. A sentença deverá ser cumprida em regime fechado.

É princípio de direito admitido no Brasil e nos países civilizados o de que quem concorre para o crime incorre em pena semelhante. O pressuposto legal deve ser aplicado aos envolvidos nos desmandos da Colônia Agrícola Heleno Fragoso. Não só. Espera-se que, além da reprimenda penal, os responsáveis, à frente o diretor da instituição, sejam afastados do serviço público. Espera-se, sobretudo, que tais vergonhas sejam banidas do território.