Dilma avança e pode dar sete ministérios ao PMDB

Andrea Jubé, Bruno Peres e Thiago Resende 

30/09/2015

A presidente Dilma Rousseff avançou ontem nas negociações para tentar desfazer os nós com o PMDB e anunciar amanhã a reforma ministerial. Dilma decidiu oferecer um sétimo ministério ao partido, mas ampliando a barganha: além da manutenção dos vetos presidenciais, ela espera, ainda, a aprovação da emenda constitucional relativa à Desvinculação das Receitas da União (DRU). No balcão de negociações com o PMDB, entraram pastas da cota do PT e do PCdoB. Hoje ela se reúne com governadores do PSB, numa tentativa de atrair a sigla para a base governista.

Ontem Dilma formalizou a demissão do ministro da Saúde, Arthur Chioro, já que a pasta irá para o PMDB. O nome mais forte é o do deputado Marcelo Castro (PMDB-PI). O petista reclamou com interlocutores que teria sido demitido "por telefone" por Dilma. Mas a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto esclareceu que Chioro foi comunicado pela presidente de seu afastamento da pasta em conversa pessoal com Dilma na semana passada.

De acordo com a assessoria, o telefonema de ontem foi uma mera formalização do ato de demissão. Ainda ontem o titular da Secretaria de Direitos Humanos, Pepe Vargas (PT-RS), confirmou que volta ao exercício do mandato na Câmara dos Deputados. Ele esteve com Dilma na semana passada em reunião no Palácio da Alvorada. Sua pasta será incorporada ao novo Ministério da Cidadania, que reunirá Política para Mulheres e Igualdade Racial.

Valor apurou que, ontem, Dilma ofereceu a lideranças do PMDB a opção de assumir o Ministério da Cultura ou o da Ciência e Tecnologia. A pasta da Cultura hoje é comandada pelo ministro Juca Ferreira, do PT, e Ciência e Tecnologia está na cota do PCdoB, com Aldo Rebelo, que poderia assumir outro posto no primeiro escalão.

Hoje, ela recebe no Palácio do Planalto os três governadores do PSB: Rodrigo Rollemberg, do Distrito Federal - de quem ela se aproximou nós últimos dois meses -, Ricardo Coutinho, da Paraíba, e Paulo Câmara, de Pernambuco. O encontro ocorre às vésperas da reunião da Executiva Nacional, em que o PSB debaterá eventual apoio ao impeachment da presidente.

Ontem Dilma reuniu-se pela manhã e à noite com o vice-presidente Michel Temer, que é presidente nacional do PMDB. Uma fonte do Palácio do Planalto disse aoValor que, nas conversas, a presidente garantiu ao vice que buscaria espaço na reforma ministerial para acomodar "todas as forças" do PMDB. Isso implica, na prática, assegurar cotas equivalentes para as bancadas da Câmara dos Deputados, do Senado, e para ministros do núcleo próximo a Temer, ou seja, do PMDB orgânico. Nesse grupo estão Eliseu Padilha (Aviação Civil), Hélder Barbalho (Pesca) e Henrique Alves (Turismo).

Essa acomodação implica garantir sete pastas ao PMDB. "Nós achamos merecido que o PMDB ocupe esse espaço, porque tem partidos que têm o mesmo tamanho do PMDB e uma representação ainda maior no governo", disse ontem o líder da bancada na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), numa alusão implícita ao PT.

A presidente tem sido aconselhada por diversos interlocutores a não se indispor com o vice em troca da aproximação com Picciani e o PMDB do Rio de Janeiro. Temer presidirá o congresso do partido em novembro, quando os pemedebistas decidirão se desembarcam ou não do governo.

Ontem à noite, o desenho mais avançado da reforma apontava para o seguinte, em relação ao núcleo próximo de Michel Temer: Eliseu Padilha continuaria na Aviação Civil, Hélder Barbalho assumiria a Secretaria de Portos e Henrique Alves continuaria no Turismo. Dilma não havia chamado Leonardo Picciani de volta ao Planalto, mas a bancada contava, de igual forma, com a pasta de Portos para o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ), ligado a Picciani e ao presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O aceno mais concreto de que os ministros mais próximos a Temer seguiriam no primeiro escalão foi a atuação de Eliseu Padilha, em dobradinha com o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, nas reuniões com as bancadas da base aliada na Câmara para negociar a manutenção dos vetos presidenciais. Padilha estava afastado da articulação política.

Falta credibilidade ao governo, afirma Marina

A fundadora do novo partido Rede Sustentabilidade, Marina Silva, disse ontem que há no país uma falta de credibilidade em relação aos esforços do governo, diante de "uma crise profunda", com perda de emprego, alta de juros e inflação crescente. Marina enfatizou que as divergências nas soluções para o momento de turbulência do país ocorrem inclusive entre a presidente Dilma Rousseff e o próprio partido (PT).

"A toda semana tem uma medida nova [proposta pelo governo], e o papel mais grave dessa crise é que a presidente Dilma tem um projeto de ajuste para o Brasil, e o partido da própria presidente apresentou um outro projeto criticando o projeto dela", afirmou a ex-ministra, candidata presidencial que ficou em terceiro lugar nas eleições de 2010 e 2014.

Marina Silva referia-se à Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, que divulgou anteontem um documento com duras críticas ao ajuste fiscal comandado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Em palestra em um centro universitário em Brasília, Marina, que conseguiu recentemente registrar seu próprio partido, afirmou que a população anseia por mais representação política, na busca da eleição de "representantes", não de "substitutos".

"Tem um novo sujeito político em curso", disse a ex-ministra e ex-senadora. "Estamos saindo do ativismo dirigido, por quem quer que seja, para um novo ativismo autoral", completou Marina Silva.

Questionada sobre a migração para o Rede de parlamentares, Marina afirmou que está dialogando em busca de qualidade, não de quantidade, para o próprio partido. "Todos os que participam de um partido político têm direito de se colocar como possíveis candidatos, mas, neste momento, eles estão vindo para ajudar a construir o partido", afirmou.

Entre os primeiros nomes a aderirem ao novo partido estão o senador Randolfe Rodrigues (AP), saído do PSOL, e os deputado Miro Teixeira (ex-Pros-RJ) Alessandro Molon (RJ), originário do PT. Randolfe tentou no ano passado uma frustrada candidatura à presidência e Molon é pré-candidato a prefeito no Rio.

Durante a palestra, Marina criticou Dilma pelo anúncio feito na Organização das Nações Unidas (ONU) de propor zerar o desmatamento ilegal em 2030.

Apesar de considerar positivo que o governo brasileiro apresente metas para o meio ambiente, Marina apontou uma falha no formato do anúncio, "talvez por problema de assessoria", ao sugerir uma tolerância ao desmatamento ilegal pelos próximos 15 anos. "Nós conseguimos controlar todas as variáveis que evitam o problema da ilegalidade? Claro que não. Não depende da nossa vontade", disse. "Mas eu não posso anunciar a priori que eu vou ter ainda uma tolerância de 15 anos com aquilo que a lei não permite", acrescentou. Além de propor o fim do desmatamento até 2030, o Brasil defendeu reduzir em 37% a emissão de gases de efeito estufa até 2025. Marina considerou ainda que o Brasil pode fazer "muito mais" do que anunciou como metas na ONU.

Valor econômico, v. 16, n. 3852, 30/09/2015. Política, p. A5