Título: Em debate, a relação do Estado e a iniciativa privada
Autor: Campbell, Ullisses
Fonte: Correio Braziliense, 23/09/2011, Brasil, p. 8

São Paulo ¿ Juristas, estudantes de direito e empresários reuniram-se, ontem, em São Paulo, para discutir a relação entre o Estado e entidades privadas quando o assunto é "cumprimento de contratos". Em comum, todos os debatedores sustentam que o Estado abusa do poder institucional para fazer valer regras de benefício unilateral.

Debateram o economista Delfim Netto; os juristas J.J. Gomes Canotilho e Ives Gandra; Jorge Rendo, diretor do Grupo Clarín; e o jornalista William Waack. Antes das palestras, foi entregue a cinco estudantes o Prêmio Mendes Júnior de Monografias Jurídicas. O vencedor, Ivan Ozawa Ozai, 28 anos, ex-aluno de direito do Mackenzie, ganhou R$ 150 mil e ficou feliz da vida, pois está prestes a se casar e ainda não tem casa própria. Ozai, que teve o trabalho avaliado na etapa final pelos melhores juristas do país, venceu com um texto polêmico. Segundo diz, "boa parte do problema nas contratações administrativas está no alto grau de corrupção existente no mercado".

A monografia saiu de 88 trabalhos de todo o país. Dezesseis deles pré-selecionados para a avaliação de cinco notáveis juristas: Célio Borja, ex-ministro do STF e da Justiça; J.J. Canotilho, constitucionalista português; Judith Martins-Costa, livre-docente pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Luís Roberto Barroso, professor da Universidade Federal do Rio; e Octavio Luiz Motta Ferraz, doutor em direitos humanos e mestre em direito médico e ética médica pela Universidade de Londres.

Para o economista Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda, a relação entre Estado e empresas privadas já foi pior e, hoje, caminha para a harmonia. "O Estado sempre foi um mau cumpridor de suas obrigações", destacou. Ives Gandra também acusou o Estado de usar o poder para prejudicar as instituições privadas. Ele cita que 65% das ações que chegam ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedem para não pagar dívidas com entidades privadas. "Quando são obrigados a pagar, fazem por meio de precatório em parcelas que duram 20 anos." Para ele, essa relação conflituosa só começará a melhorar quando o agente administrativo perceber que sua função é "servir o público e não se servir do público".

Aprimoramento De acordo com Murillo Valle Mendes, presidente da Mendes Júnior, já existe vontade de aprimorar o estado de direito, o que melhoraria a relação entre o poder público e as entidades privadas, principalmente no que se refere ao cumprimento de contratos. "A sociedade civil já percebeu que o desenvolvimento só é possível se o estado de direito tiver qualidade, o que só se alcança se houver esforço e perseverança", destaca.

Segundo o diretor presidente dos Diários Associados, Álvaro Teixeira da Costa, os debates são fundamentais para aperfeiçoar o estado de direito e melhorar a relação do poder público com as empresas privadas, principalmente quando se fala em cumprimentos de contratos entre o setor produtivo e o governo. Ele critica, inclusive, a demora do Estado em cumprir decisões judiciais. "É nítida a defasagem entre as decisões alcançadas pelo setor privado e o cumprimento das decisões jurídicas já proferidas. Há uma demora inexplicável das soluções finais desses problemas que já foram superados no campo jurídico", ressalta. E completa: "Nenhum país alcançará o seu nível máximo de desenvolvimento se não cumprir os contratos firmados".