Por votos, Dilma oferece dois ministérios a deputados do PMDB

 

SIMONE IGLESIAS, JÚNIA GAMA, CHICO DE GOIS E CRISTIANE JUNGBLUT

O globo, n. 29997, 23//09/2015. País, p. 6

 

De olho nos votos da bancada do PMDB na Câmara, decisivos para a aprovação do ajuste fiscal e de um eventual pedido de impeachment, a presidente Dilma Rousseff ofereceu ontem dois ministérios aos deputados do partido. Recebeu como contraproposta os pedidos dos ministérios da Saúde, um dos mais importantes da Esplanada, e de Infraestrutura, que uniria Portos e Aviação Civil. Deputados diziam que, se Dilma recusar, deverão fazer oposição automática ao governo.

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A bancada definiu uma lista tríplice para cada ministério e caberá a Dilma escolher o nome. Para a Saúde, hoje ocupada pelo PT, as indicações são Marcelo de Castro ( PI), Manoel Júnior ( PB) e Saraiva Felipe ( MG), que já foi ministro no primeiro mandato do ex- presidente Lula. Para Infraestrutura, os indicados são Newton Cardoso Júnior ( MG), Mauro Lopes ( MG) e José Priante ( PA). Como primeiro gesto de boa vontade, a bancada decidiu decidiu apoiar ainda ontem a manutenção dos vetos da presidente a projetos que aumentam despesas.

A expectativa no partido é ficar com cinco ministérios: os dois indicados pela bancada da Câmara; a manutenção de Kátia Abreu ( Agricultura) e Eduardo Braga ( Minas e Energia), ambos senadores licenciados, na cota da bancada do Senado; além da manutenção do ex- presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves no Ministério do Turismo, nome que seria da cota pessoal da presidente.

TEMER NÃO INDICARÁ NOVOS MINISTROS

O nome do ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, ligado ao vice- presidente Michel Temer não foi cogitado pelos deputados do PMDB para representar a bancada. O líder do partido na Câmara, Leonardo Picciani ( RJ), que se reaproximou de Dilma nos últimos dias, a ponto de ser recebido por ela, disse que levaria os nomes à presidente ainda ontem à noite.

— Por ampla maioria, a bancada decidiu que fará a indicação dos nomes à presidente para compor o novo Ministério. A pasta será definida pela presidente. O que está sinalizado seria a indicação de dois deputados, e aguardamos a presidente definir quais serão as pastas — disse.

A bancada do PMDB na Câmara tem votado sistematicamente dividida. A situação melhorou um pouco durante as votações do primeiro pacote de ajuste fiscal, que cortou benefícios previdenciários e trabalhistas — quando Temer e Padilha estiveram à frente da articulação política do governo. Com possibilidade de deixar o governo nos próximos dias, Padilha afirmou que qualquer tratativa entre governo e partidos na reforma ministerial deverá se refletir em apoio no Congresso:

— Nesse caso, ( a sugestão de nomes para o Ministério) está sendo indicada pela bancada inteira e presumo que a bancada vai ter compromisso absoluto com as posições do governo dentro da Câmara — disse Padilha.

No Senado, a posição adotada foi bem diferente. Na mesma linha de Temer, que não indicará ninguém, o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), comunicou a Dilma que não participará das negociações sobre a reforma ministerial e sobre o espaço que o PMDB terá na nova estrutura.

Renan disse que sua função como presidente do Senado é incompatível com esse tipo de negociação. O líder do PMDB na Casa, Eunício Oliveira ( CE), também disse que não indicaria nomes por se tratar de uma decisão da presidente. Apesar de não quererem ficar com a paternidade de nenhuma indicação, os senadores do PMDB avisaram Dilma que não se opõem à manutenção de Eduardo Braga no Ministério de Minas e Energia.

O PMDB ocupa o comando de sete ministérios: Agricultura, Minas e Energia, Turismo, Aviação Civil, Pesca, Portos e Secretaria de Assuntos Estratégicos ( SAE). Na nova estrutura, essas pastas devem ser reduzidas a quatro, com a extinção da SAE e a união da Aviação Civil e Portos e da Pesca à Agricultura.

 

Troca- troca é jogo de alto risco para presidente

 

Reformas ministeriais são, tradicionalmente, momentos de grande tensão política. Dividir o poder envolve obrigatoriamente desagradar a aliados, lidar com intrigas, resistir a interesses corporativos e, não bastasse tudo isso, tentar montar uma gestão eficaz, capaz de produzir marcas simbólicas para o governo.

A reforma em curso no governo Dilma é ainda mais complicada. Ocorre em meio a um recorde negativo de popularidade da presidente, com a base aliada conflagrada e, principalmente, durante a negociação de medidas cruciais para o futuro do governo. Não há espaço para erros.

As mudanças trazem outro complicador. Obrigada a adotar a austeridade econômica para acalmar os mercados, Dilma cortará dez ministérios e fundirá órgãos. Foi instada publicamente a fazer isso pelo próprio PMDB. Mas, como se sabe, cargo é palavra de ordem do principal aliado. Como saciar esse apetite com menos espaço? A conta não fecha.

O discurso austero peemedebista está mais para um jogo de cena. Há quem diga que se trata de uma armadilha. E que o PT mordeu a isca. Cortar ministérios agora é jogo dos mais arriscados, tem efeito apenas simbólico e não representa grande economia.

Ontem, a estratégia do governo ficou mais clara. O objetivo é seduzir a bancada peemedebista da Câmara, arena onde se darão disputas decisivas para Dilma: a votação dos vetos presidenciais, que podem ser fatais para uma economia respirando por aparelhos; as medidas do ajuste fiscal, em especial a CPMF; e, principalmente, o impeachment.

O Ministério da Saúde é um sonho de consumo dos deputados. Seus gastos têm enorme capilaridade e possibilitam que centenas de políticos colham dividendos em suas bases eleitorais.

Mas o jogo é mais complicado. Primeiro, porque o PMDB é muito maior e seus principais líderes têm interesses conflitantes. Há outros oito partidos aliados que também têm suas demandas. E a anunciada perda de espaço do PT pode ampliar o fogo amigo e silenciar quem ainda grita que impeachment é golpe.