O Estado de São Paulo, n. 44501, 20/08/2015. Política, p. A5

Procurador vai atribuir dois crimes a Collor

Por Fábio Fabrini, Andreza Matais e Isadora Peron

 

A Procuradoria-Geral da República incluirá o ex-presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL) na primeira leva de políticos com prerrogativa de foro denunciados por envolvimento no esquema de desvios da Petrobrás. A expectativa, conforme fontes com acesso às investigações, é de que a acusação seja encaminhada ainda nesta quinta-feira, 20, ao Supremo Tribunal Federal.

O texto final das denúncias estava sendo preparado ontem pela equipe do procurador-geral, Rodrigo Janot. A peça deve atribuir a Collor envolvimento em crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Ele é suspeito de receber ao menos R$ 26 milhões em propinas, entre 2010 e 2014, no esquema na Petrobrás.

Desde que foi incluído no rol de políticos investigados na Operação Lava Jato, Collor tem travado uma batalha pública contra Janot.Nesta quarta ele questionou a recondução do procurador-geral na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que vai sabatiná-lo na semana que vem.

As denúncias contra Collor se baseiam em documentos apreendidos na Lava Jato e em depoimentos de delatores, entre eles o doleiro Alberto Youssef. Ele relatou ter feito diversos pagamentos ao senador. Parte dos recursos teria sido entregue, em espécie, a emissários do congressista ou levada por Rafael Ângulo Lopez, tido como um dos “carregadores de malas” do doleiro. A Polícia Federal também encontrou oito comprovantes de transferências bancárias de Youssef para Collor, totalizando R$ 50 mil.

O senador atuaria no esquema de corrupção na Petrobrás viabilizando contratos na BR Distribuidora, dirigida por indicados seus. Por um dos contratos, de R$ 300 milhões, Collor teria recebido R$ 3 milhões de suborno, conforme Youssef. O negócio teria sido intermediado por Pedro Paulo Leoni Ramos, empresário que foi ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos no governo do ex-presidente (1990-1992).

Em despachos já tornados públicos, Janot deu detalhes do suposto enriquecimento ilícito do senador. Na Operação Politeia, um dos braços da Lava Jato, a PF apreendeu em julho cinco carros de luxo em imóveis de Collor. Quatro estão em nome de uma empresa que seria de fachada.

A pessoas próximas, Collor afirma que a denúncia é esperada. Publicamente, ele nega envolvimento no esquema e se diz perseguido por Janot.

‘Vetusto’. O senador apresentou na quarta na CCJ um voto em separado, pelo qual tenta evitar a recondução de Janot ao cargo. O documento foi um contraponto ao parecer do relator, Ricardo Ferraço (PMDB-ES), para quem o procurador-geral cumpre todos os requisitos e pode, portanto, ser sabatinado.

Segundo Collor, que ao ler seu voto usou expressões como “vetusto procurador” e “simpática PGR”, Janot omitiu dados sobre o fato de sua gestão estar sob análise de órgãos como o Tribunal de Contas da União (TCU). O pedido para que dois contratos da Procuradoria-Geral fossem investigados partiu do próprio Collor, depois que vieram à tona indícios de seu envolvimento no esquema de corrupção na Petrobrás.

O ex-presidente é autor de outros cinco pedidos contra Janot no Senado visando o afastamento do chefe do Ministério Público. “Além de todas essas ações, passíveis de julgamento e condenação, há uma infindável lista de condutas ilícitas, reprováveis e abusivas, praticadas pela PGR”, disse o senador.

Em tom de ironia, Collor afirmou que não tinha interesse em se manifestar contra ou a favor de Janot, e sim em trazer “novas informações” para os senadores decidirem seu voto. Ferraço defendeu seu parecer sobre o procurador-geral. Segundo ele, a sabatina será o momento para os senadores colocarem questionamentos a Janot.

 

 

Novos inquéritos de políticos devem ser abertos no STF após primeiras denúncias

TALITA FERNANDES E BEATRIZ BULLA

 

Investigações com base em delações mais recentes na Lava Jato começarão nos próximos dias e devem ampliar o rol de políticos na mira da operação

Novos pedidos de inquérito da Operação Lava Jato envolvendo políticos - com base em delações premiadas feitas recentemente - só devem chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF) após serem oferecidas as primeiras denúncias referentes aos 26 inquéritos já em curso na Corte. A previsão é de que a Procuradoria-Geral da República (PGR) ofereça as primeiras denúncias ainda esta semana. De acordo com investigadores ouvidos pelo Estado, embora casos já em apuração venham sendo conduzidos paralelamente aos fatos recém-chegados, prevalece o entendimento entre os procuradores de que é preciso "resolver o que está aberto antes da abertura de novas ações".

Os procuradores da Lava Jato repetem, nos corredores da PGR, que não há uma "data" para encaminhar as denúncias ao Supremo, já que a prioridade é enviar peças bem elaboradas, mas a expectativa é de que o material seja encaminhado ao STF nesta semana. Os investigadores do grupo de trabalho do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, têm virado noites com confecção das peças e estão "finalizando" esta etapa do trabalho. Ao chegar ao STF nesta tarde, Janot, que tem adotado postura discreta durante as investigações, evitou falar em prazo para oferecimento das denúncias.

A oferta de denúncia é o segundo passo na investigação, que vem após a instauração e realização do inquérito. É quando o Ministério Público entende que já existem elementos suficientes para que um investigado passe a responder a uma ação penal e pode acontecer mesmo antes do vencimento do prazo dos inquéritos abertos, que no caso da Lava Jato se encerra em 31 de agosto. 

 

As investigações referentes à Lava Jato que hoje estão em curso no Supremo, abertos em março, são decorrentes das delações firmadas pelo doleiro Alberto Youssef e pelo o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa. De março até agora, o Supremo já homologou pelo menos duas novas delações: a de Rafael Angulo, o "mensageiro" de Youssef, e do empreiteiro e dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa. A expectativa é de que as informações prestadas por Ângulo sejam anexadas aos inquéritos já em curso.

 

Já o depoimento de Pessoa deve dar origem a novos inquéritos. O Supremo já recebeu 30 "procedimentos" referentes às últimas delações que devem ser transformados em novos inquéritos. Esse número não coincide, necessariamente, com o número de procedimentos coincide com o número de investigados ou de novos inquéritos.

Políticos. O presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o senador e ex-presidente da República Fernando Collor (PTB-AL) estão na lista dos políticos que já devem ser denunciados nesta semana pela Procuradoria-Geral da República. Os dois protagonizaram ataques explícitos a Janot desde a abertura das investigações. Além deles, os investigadores trabalham no total com mais um grupo pequeno de políticos que já devem ser acusados formalmente. Na maioria dos casos, no entanto, investigadores devem pedir a prorrogação de inquéritos por mais prazo - situação em que deve se encaixar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Além disso, há a expectativa de que os procuradores encaminhem ao menos um pedido de arquivamento de investigação: a peça relacionada ao senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), por falta de indícios que o relacionem ao esquema de corrupção na Petrobrás.