O Estado de São Paulo, n. 44501, 20/08/2015. Política, p. A6

Desafetos buscam enfraquecer Cunha

DANIEL CARVALHO, PEDRO VENCESLAU E DAIENE CARDOSO 

 

Diante da expectativa de apresentação de denúncia da Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os adversários do deputado preparam uma estratégia para enfraquecê-lo e afastá-lo do comando da Casa. As demonstrações de apoio foram discretas, mas a oposição quer aproveitar a intensificação da ira de Cunha contra o governo para agilizar o andamento do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Cunha soube por volta das 13 horas que a denúncia contra ele estava em vias de ser apresentada. O peemedebista havia acabado de chegar ao restaurante VIP da Câmara para um almoço com parlamentares da América Latina. A informação veio de sua assessoria por mensagem de celular. Ele parou de caminhar, leu rapidamente a notícia, cochichou com uma assessora e seguiu em silêncio para a mesa. Aparentava serenidade, mas se manifestava só quando a senadora mexicana Blanca Alcalá puxava assunto. Deixou o local dizendo que apenas se manifestaria sobre “fato”, e não sobre “especulação”.

A notícia entusiasmou desafetos de Cunha nas bancadas do PT, PSB, PSOL, PSC e PPS, que se reuniram para tratar do assunto. Decidiram que, tão logo fosse apresentada a denúncia, vão redigir um manifesto pedindo seu afastamento da presidência da Casa. Caso o STF acate a denúncia, o PSOL ingressará com uma representação no Conselho de Ética da Câmara pedindo a cassação por quebra de decoro.

“Ele está fragilizado. A denúncia fragiliza a lógica de Cunha de se defender atacando o governo. Essa tática cansou”, afirmou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP). “A manutenção do Cunha na presidência da Câmara pode ser ruim para a Casa”, disse a deputada Maria do Rosário (PT-RS).

Os deputados devem se revezar em discursos para constranger Cunha e pressionarão a cúpula da CPI da Petrobrás a convocar tanto o peemedebista quanto o lobista Julio Camargo, que o acusou de cobrar propina de US$ 5 milhões. O presidente da Câmara disse que qualquer partido tem o “direito democrático” de pedir sua saída, mas que não pretende se afastar.

Apoio. A alguns metros da reunião dos adversários, Cunha conversou com cerca de dez aliados na presidência da Câmara. Aferiu o apoio que tinha entre lideranças de PSDB, DEM, SD, PSC e PSB – as bancadas dos dois últimos estão divididas. Participantes desse encontro descreveram Cunha como “tenso” e “indignado”. Disseram que ele reafirmou inocência, já esperava a denúncia e repetiu se sentir vítima de perseguição do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Aliados de Cunha passaram o dia dizendo que, por ora, o apoio ao presidente da Câmara se mantém. A oposição quer aproveitar a reação do peemedebista à denúncia para fustigar o governo e fazer vingar um eventual processo de impeachment de Dilma. “Se ele tiver mais esta motivação, quem sabe não vai fazer o que já deveria ter feito?”, questionou o vice-líder do PSDB, Nilson Leitão (PSDB-MT).

Entre os tucanos, a avaliação é que a denúncia consolida definitivamente o presidente da Câmara no campo da oposição. Apesar do otimismo, o PSDB manterá uma “distância regulamentar” de Cunha. A sigla não deve se manifestar oficialmente, mas seus líderes se colocarão contra o afastamento dele. “Sem sentença não cabe o afastamento”, diz o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), líder da minoria na Câmara.

 

Movimentos sociais miram em Eduardo Cunha

RICARDO GALHARDO

Protestos programados para esta quinta-feira em 23 Estados terão ainda críticas ao ajuste fiscal e defesa do mandato Dilma

 

 

Alvo da Procuradoria Geral da República (PGR) por suspeitas de corrupção na Petrobrás, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também está na mira de uma série de manifestações marcadas para esta quinta-feira em todo o País.

"Estamos torcendo para que a denúncia (da PGR contra Cunha) saia hoje ou amanhã (ontem ou hoje)", disse Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos populares (CMP).

Segundo ele, os sindicatos e movimentos sociais que organizam os atos estão incentivando a confecção de faixas e cartazes com a frase "Fora, Cunha".

Manifestações foram programadas em 23 Estados e em alguns deles são uma espécie de contraponto aos protestos de que pediram o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Mais de 20 grupos participam da organização. Os mais conhecidos são a Central Única dos Trabalhadores (CUT), Movimento dos Sem Terra (MST), Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), União Nacional dos Estudantes (UNE) e a CMP. PSOL e PC do B aparecem como apoiadores e o PT usou inserções na TV para divulgar as manifestações.

Devido às diferenças políticas e ideológicas dos organizadores, foi definida uma pauta única enxuta, cujos eixos são a crítica ao ajuste fiscal e à Agenda Brasil, rejeição à pauta conservadora personificada pelo presidente da Câmara e a defesa da democracia.

O último item foi a forma encontrada para abordar a defesa do mandato de Dilma sem causar divergências. A ênfase varia conforme a orientação de cada grupo. O MTST, por exemplo, prioriza as questões econômicas e adota tom crítico ao governo. Já a CUT, UNE e CMP, abertamente contrários ao impeachment da presidente, levarão cartazes com a frase "Não vai ter golpe".

Embora não tenham sido formalmente convidados, políticos são esperados. O presidente do PT, Rui Falcão, é um dos que confirmaram presença.

Em São Paulo, os movimentos esperam levar mais de 50 mil pessoas às ruas. Até ontem estavam confirmados 350 ônibus para o transporte dos manifestantes até o Largo da Batata, local da concentração, às 17h. De lá seguem até a Avenida Paulista, passando pelas Avenidas Faria Lima e Rebouças.

Rio. Estão programados dois atos no centro do Rio hoje. Militantes do MTST se reúnem às 11h na Cinelândia. "Não é um ato em defesa do governo Dilma Rousseff. É um ato contra a ofensiva de direita conservadora", disse Felipe Brito, um dos coordenadores do MTST. Os manifestantes vão caminhar até o Largo da Carioca.

Já a CUT organiza o movimento Mais Democracia e Mais Direitos, a partir das 14h na Candelária e tem como principal bandeira a defesa da legalidade democrática e do Estado de Direito. Sua principal palavra de ordem é: "Contra o Golpe! Fora, Cunha!". Os militantes seguirão às 17h pela Avenida Rio Branco até a Cinelândia.

Minas. Em Belo Horizonte, cerca de 15 mil pessoas são esperadas no ato marcado para as 16h na Praça Afonso Arinos, no centro. O coordenador do MST em Minas, Silvio Neto, nega que o ato seja um contraponto ao protesto realizado no domingo contra a presidente que, segundo a Polícia Militar, mobilizou cerca de seis mil pessoas. "Foi um fiasco tão grande que nem damos mais bola para esses caras", diz Neto. / COLABORARAM DANIELLE VILLELA e LEONARDO AUGUSTO