PMDB complica reforma

 

JÚNIA GAMA, SIMONE IGLESIAS, CRISTIANE JUNGBLUT E WASHINGTON LUIZ

 

A falta de diálogo da presidente Dilma Rousseff com o vice- presidente Michel Temer nas últimas semanas levou a um impasse a reforma administrativa e ministerial que deveria ser anunciada até amanhã. A presidente convidou o vice para uma reunião ontem, logo cedo, com o objetivo de ouvilo sobre o espaço que caberia ao PMDB. No encontro, Temer aconselhou Dilma a simplesmente não fazer reforma ministerial neste momento para evitar arestas com os partidos da base no momento em que o governo precisa aprovar as medidas de ajuste. Segundo ele, as mudanças poderiam gerar “instabilidade no Congresso”. Dilma respondeu que não poderia voltar atrás na decisão já anunciada publicamente, levando Temer a dizer que ela poderia ficar à vontade em relação aos ministérios do PMDB e que ele não faria indicação de nomes.

GIVALDO BARBOSAPeemedebistas. Renan ( recebendo de Levy propostas para o pós- ajuste) e Jucá ( à esquerda) não querem indicar nomes do PMDB; Eunício ( à direita) deve consultar bancada no Senado

A posição do PMDB, cuja não indicação de ministros denotaria um rompimento formal com o governo, levou a presidente a promover uma série de reuniões. Após o primeiro encontro com Temer, Dilma reuniu seus ministros mais próximos na coordenação política e, em seguida, convidou Temer para um novo encontro, desta vez no Palácio da Alvorada, junto com o presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), e com o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira ( CE). A presidente chegou a telefonar à tarde para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), para convidálo a participar das discussões sobre reforma ministerial. Cunha, porém, recusou o convite, alegando não ter qualquer intenção de debater o tema. À noite, ela voltaria a receber o vice- presidente no Alvorada pela terceira vez. Ao deixar seu gabinete para o encontro, Temer disse apenas que “as conversas estão caminhando”.

Segundo interlocutores, Renan disse a Dilma que manteria sua postura de presidente do Senado e que ela deveria tratar com as bancadas. Temer também quer ficar longe da pecha de negociador de cargos.

— Renan tem a posição de que indicar nomes é incompatível com sua função de presidente do Senado — disse um interlocutor de Renan.

Dilma também conversou com o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani ( RJ), a quem pediu indicações da bancada do partido, e por duas vezes com o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, uma no Palácio do Planalto e outra no Alvorada. No primeiro encontro, a presidente pediu ajuda ao governador nas conversas com o PMDB.

— Pezão tem uma ótima relação com a presidente, e o PMDB do Rio é o mais importante do país. Ele é um interlocutor que precisa ser ouvido neste momento — disse um auxiliar presidencial.

HORA DE CORTAR GASTOS

Dilma disse aos dirigentes do PMDB que eles terão uma importância maior, embora com menos ministérios. Uma das conclusões é a unificação da Aviação Civil com Portos, ambos do PMDB. O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, deve permanecer. O maior problema é o destino de Henrique Eduardo Alves, do Turismo. Ontem, ele dizia a aliados que não quer sair do governo.

— Não temos que indicar nomes. O PMDB não pode cair nesta armadilha. Estou defendendo isso — disse o senador Romero Jucá ( PMDB- RR), que passou o dia em conversações com Renan.

Temer afirmou à presidente, no primeiro encontro do dia, que é hora de cortar gastos e que o PMDB não será um empecilho para isso. Apesar do vice dizer que não nomeará ninguém, outros peemedebistas pressionam por mais espaço no governo. Integrantes da cúpula do PMDB defendem que o partido feche posição de não indicar nomes para a reforma administrativa. Querem deixar claro que qualquer nome escolhido por Dilma será da cota da presidente, e não da legenda.

Em conversa durante o fim de semana, Renan disse a Temer que tampouco fará indicações para a Esplanada. O vicepresidente também recebeu ontem Eduardo Cunha, que está rompido com o Palácio do Planalto desde meados deste ano e não tem intenção de ter qualquer participação no governo. Após a série de encontros, Temer se reuniu à noite com a ala que ainda não deseja abandonar o governo. O vice encontrouse com Picciani e com Eunício, que devem consultar suas bancadas antes de tomar uma decisão.

— Para mim, é simples: vou fazer o que a maioria da bancada decidir. O governo também tem que sinalizar que quer que a bancada indique, porque até agora isso não aconteceu. Havendo algum tipo de sinalização do governo e também esse posicionamento do PMDB, vou submeter à bancada — afirmou Picciani ao GLOBO.

VIAGEM AOS EUA DEVE SER ADIADA

Picciani se aproximou do governo no vácuo deixado quando Temer e o ministro Eliseu Padilha ( Aviação Civil) se afastaram da articulação política do governo. O deputado foi chamado por Dilma para uma conversa em que houve comprometimento de que as demandas da bancada peemedebista seriam atendidas. A aliados, Picciani diz que o governo tem pouco tempo para finalizar os compromissos com o PMDB na Câmara e evitar uma debandada generalizada. O deputado tem afirmado que é preciso um ministro que realmente represente a bancada do PMDB para ajudar o governo nas votações do Congresso.

Aliados de Temer se queixam da forma como a reforma administrativa está sendo tocada, sem negociação prévia com os partidos. Segundo pessoas próximas a Temer, na reunião de ontem a presidente não adiantou como será a nova configuração na Esplanada.

— Quem provocou o distanciamento a princípio foi quem fez uma reforma ministerial sem trocar uma palavra com o PMDB. E, antes disso, quando anunciou que haveria redução dos ministérios, também sem combinar nada com o partido. Se tiver ministro do PMDB, será escolha da presidente Dilma. O PMDB não vai bancar esse ônus — disse um interlocutor de Temer.

Com dificuldade para fechar a reforma, Dilma deverá viajar aos Estados Unidos, para abrir a Assembleia Geral da ONU, somente na quinta- feira à noite. Ela iria amanhã, mas deverá alterar a agenda, ainda em tempo de não perder o encontro com o Papa Francisco, considerado uma agenda positiva em meio à crise. 

 

Demora para uma medida simbólica

 

SIMONE IGLESIAS

 

Apresidente Dilma Rousseff fará a reforma administrativa em meio a uma tempestade. Aconselhada desde a eleição a reduzir o tamanho da máquina, limando ministérios, deu de ombros. Podia ter virado a página há meses e, agora, escolhe um momento crítico para negociar trocas de comando e redução de pastas.

A manutenção de 39 ministérios se sobrepôs por sete meses à racionalidade de enxugar gastos. Mesmo com apenas R$ 200 milhões estimados de economia, um governo só pode acenar com aumento da carga tributária se der um sinal de que está apertando o cinto. Só em agosto Dilma cedeu e anunciou uma reforma, mas sem dar números, detalhes e negociar com os aliados. Até a última sexta- feira, no entanto, não havia conversado com nenhum dirigente partidário sobre o assunto.

Desde então, cometeu nova série de atropelos. Deu à ministra Kátia Abreu ( Agricultura) a missão de negociar com o PMDB a redução de ministérios. Diante da reação geral, ontem chamou Temer esperando que o vice sugerisse quais ministros peemedebistas iriam para a degola. Temer negou- se a assumir o papel de carrasco do próprio partido e retrucou, dizendo que abria mão de qualquer indicação. Às pressas, a presidente convocou reuniões com Renan Calheiros; com o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira; e pediu para seus ministros receberem dezenas de deputados aliados. Uma corrida de 100 metros com chance de morrer na praia.