O Estado de São Paulo, n. 44501, 20/08/2015. Política, p. A12

Camargo Corrêa reconhece cartel e pagará R$ 104 mi

Bernardo Caram e Lorenna Rodrigues

 

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) firmou ontem um acordo com a Camargo Corrêa, além de dois ex-dirigentes, em que a empreiteira assume participação em cartel de empresas com atuação na Petrobrás e se dispõe a passar informações sobre o funcionamento do grupo. O acordo prevê o pagamento de uma contribuição recorde de R$ 104 milhões.

No fim de julho, a empreiteira já havia assinado acordo leniência com o Conselho para delatar o cartel de licitações no setor elétrico, em obras da usina nuclear de Angra 3. Agora, o novo acordo, feito por meio de Termo de Compromisso de Cessação de Prática (TCC), diz respeito a obras civis e montagens industriais no setor de óleo e gás. O documento suspende o processo administrativo contra a empresa até que seja comprovado que ela colaborou.
 
A primeira empresa a firmar acordo de leniência foi a SOG (Setal Óleo e Gás). Segundo o superintendente-geral do Cade, Eduardo Frade, o acordo feito ontem é importante, porque, diferentemente da Setal, a Camargo Corrêa faz parte do chamado "Clube VIP", considerado o núcleo do esquema. O grupo seria composto por seis empresas: UTC, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e OAS, além da Camargo Corrêa.

"O fato de ter uma segunda pessoa jurídica confessando a conduta é muito relevante, especialmente sendo uma das grandes empreiteiras que participam do suposto clube VIP", disse Frade, destacando que a empresa traz um detalhamento sobre o funcionamento do cartel no âmbito da estatal.

Por conta da nova colaboração, além do benefício recebido por celebrar o acordo, a contribuição paga pela Camargo Corrêa é resultado de um desconto de 60%. O valor será pago em cinco parcelas, sendo a primeira de R$ 10,4 milhões já neste ano, seguida de outros quatro pagamentos anuais corrigidos pela taxa Selic.

Também firmaram o acordo o ex-presidente da empreiteira Dalton dos Santos Avancini e o ex-vice-presidente Eduardo Hermelino Leite, com o compromisso de prestar informações sobre o caso. Na divisão das contribuições pelo acordo, a empreiteira deverá pagar R$ 101,6 milhões e cada um dos ex-dirigentes, R$ 1,176 milhão.

Extensão. Com a assinatura do acordo com o Cade pelo Camargo Corrêa, anunciado ontem, crescem as chances de outras empresas envolvidas no cartel da Petrobrás pagarem multas bilionárias. 
Pelas regras do conselho, os descontos para empresas que firmarem acordos vão caindo à medida que novas denúncias são feitas ao Cade. Não há limitação do número de empresas que podem firmar TCCs, mas, na prática, o Conselho não assina mais de três ou quatro acordos, por caso, por entender que jatem as informações necessárias para condenar os demais participantes.

Estrutura. Fachada da Camargo Corrêa, na avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo 
Em troca do acordo, que livra as empresas de outras punições, a acordante tem que apresentar uma série de informações sobre o funcionamento do cartel. No total, a Camargo Corrêa cita 21 empresas como participantes do esquema.
 
Os valores pagos na celebração de acordo costumam ser mais baixos do que as multas finais. Pelo regulamento do Conselho, o primeiro investigado a propor um acordopode ter desconto de 30% a 50%. Para o segundo, varia de 25% a 40% e, para os demais, 25%.

PARA ENTENDER

Esferas para a leniência

O acordo de leniência é uma delação premiada para pessoas jurídicas. Permite que uma empresa infratora colabore com uma investigação em troca de redução ou extinção de sanções administrativas e multas. 
A Lei Anticorrupção, regulamentada em março deste ano, permite acordos que envolvem atos de corrupção, como pagamento de propina a agentes públicos. Esses acordos são fechados pela Controladoria-Geral da União. Já o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão antitruste, fecha acordos em casos concorrenciais, como a formação de cartéis. O Ministério Público pode fechar acordo no qual pode poupar empresas de ações de improbidade.