Correio braziliense, n. 19083, 25/08/2015. Ciência, p. 15

Torre de 100 andares para estudar a Amazônia

Brasil e Alemanha inauguram torre de 100 andares para estudar Amazônia

Brasil e Alemanha inauguram observatório que analisará a interação da floresta com o resto do planeta nas próximas décadas

O Observatório de Torre Alta da Amazônia: munida de instrumentos científicos, a estrutura de 325m ajudará cientistas a compreenderem o processo de aquecimento global


Ela é quase da mesma altura da Torre Eiffel, tem 1m a menos apenas — e também serve para observar. Seu topo, no entanto, não é destinado a turistas fascinados pela capital francesa, mas para instrumentos científicos que servem para monitorar a maior floresta tropical do mundo. A estrutura metálica que nasce em meio às árvores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã, a cerca de 350km de Manaus, é a estrela do Observatório de Torre Alta da Amazônia (ATTO, na sigla em inglês), projeto científico coordenado em parceria pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e o centro Max Planck, da Alemanha.

A função da obra, que alcança 325m (o equivalente a pouco mais de 100 andares), é ser um laboratório para estudar a relação entre a floresta e as mudanças climáticas em curso no planeta. Para chegar até a torre, é preciso precorrer estradas de terra e fazer parte da viagem por rio. Ali, não há barulho de civilização, só da mata e dos animais que a habitam. Sinal de celular ou internet, nem pensar. “O fato de estar distante das cidades e, portanto, da influência humana, garante a coleta de dados relativamente não adulterados”, explicou Meinrat Andreae, diretor do Instituto Max Planck.

Com 3 mil quilômetros de extensão de leste a oeste, a Floresta Amazônica tem o poder de impactar o mundo todo. Processos climáticos e atmosféricos que ocorrem ali podem ser sentidos em outras regiões do planeta. “Com essa torre, vamos entender melhor qual é o efeito da Amazônia, não só no clima local, mas também no global”, declarou à agência France-Presse Antonio Ocimar Manzi, coordenador do projeto do lado brasileiro.

A inauguração da obra ocorreu no sábado passado, mas, por enquanto, apenas alguns testes pilotos estão sendo realizados. Até 2017, serão instalados todos os instrumentos de análise, que incluem sensores e radares a laser em diferentes alturas para medições do solo (quantidade de água, temperatura e umidade), do ar acima e abaixo da copa das árvores. Também será avaliado constantemente o fluxo de vapor d’água e de aerossóis (partículas sólidas e líquidas em suspensão) importantes para a formação de nuvens. Estão previstas três décadas de análise. Uma das perguntas a serem respondidas é o que a Amazônia está fazendo com o excesso de CO2 que começou a ser produzido a partir da segunda metade do século 20 — quando a quantidade de gás emitida aumentou 1,5 vez.

Presente à cerimônia de inauguração, o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aldo Rebelo, afirmou que o projeto é uma grande conquista para a ciência mundial. “Os trabalhos desenvolvidos aqui serão para preservar a vida no planeta e dar alternativas para o desenvolvimento sustentável da humanidade. Somos muito gratos aos nossos amigos pesquisadores da Alemanha, do Inpa e aos profissionais que ajudarão a construir essa torre na maior floresta tropical contínua do mundo”, disse.

Maior alcance
Esse fenômeno vinha sendo investigado com a ajuda de duas torres também localizadas em Uatumã, de 50m e 80m, capazes de analisar a interação da mata e da atmosfera em um raio de 10m. Com a ATTO, esse raio aumentará para 1.000m. “Um estudo de longo prazo, de duas ou três décadas, determinará quais serão os efeitos que as mudanças climáticas vão ter sobre esses ecossistemas aqui”, esclareceu Antonio Manzi.

O projeto é inspirado no Observatório de Zotino, instalado em 2003, na Sibéria, para estudar as concentrações de carbono, metano e outros gases do efeito estufa na taiga (floresta boreal). “Estávamos debatendo em nosso instituto (Max Planck) e Andreae disse que seria perfeito ter algo como a torre siberiana na Região Amazônica. Eu disse a ele: ‘Excelente, mas quem vai pagar por isso?’”, contou Jurgen Kesselmeier, que acabou se tornando o coordenador alemão da inciativa.

O ATTO custou R$ 26 milhões e foi financiado em partes iguais pelos governos de Brasil e Alemanha. Toda a estrutura foi construída no Paraná por uma empresa brasileira que venceu a licitação, e o transporte das 15.000 peças que a compõem levou 15 dias. A torre pesa 142 toneladas e é sustentada por longos cabos de aço que também lhe dão estabilidade.