Governo vai manter corte no PAC e 'Minha Casa'

Claudia Safatle, Ribamar Oliveira e Leandra Peres 

24/09/2015

Os R$ 12,4 bilhões que o governo incluiu no planejamento de redução de gastos do pacote fiscal anunciado dia 14, mas pretende compensar com o uso de verbas do FGTS e das emendas parlamentares, pode se transformar em corte definitivo. Se as fontes alternativas de financiamento não se viabilizarem, o governo irá reduzir de fato os orçamentos da Saúde, do PAC e do Minha Casa, Minha Vida para 2016.

Para implementar a medida, o Executivo enviará nos próximos dias um pedido ao relator do projeto de lei orçamentária para reduzir em R$ 4,8 bilhões os gastos do programa habitacional. A previsão original, que era de gasto de R$ 15 bilhões, só será recomposta se as obras cortadas forem substituídas por recursos do FGTS.

O PAC foi abatido em R$ 3,8 bilhoes também para ser compensado por emendas parlamentares. A expectativa é que o governo consiga cobrir pelo menos metade do corte com essas emendas, de forma voluntária. Se isso não for aceito pelo Congresso, a tesoura será passada de fato.

O orçamento da Saúde será abatido em R$ 3,8 bilhões, passando, assim, de R$ 104 bilhões para R$ 100,2 bilhões. Esse valor é inferior ao gasto mínimo exigido pela Constituição. A regra só será cumprida porque o governo contabilizará as emendas parlamentares como parte da despesa obrigatória. Nesse caso, o mais difícil será casar a destinação das emendas com os programas de maior interesse do ministério.

A situação mais confortável é a do Minha Casa, Minha Vida, pois o governo tem voto no conselho curador do FGTS para usar recursos do fundo e suprir o corte de R$ 4,8 bilhões.

Já o adiamento do reajuste do funcionalismo público para agosto do ano que vem só atingirá os servidores do Executivo, segundo informou uma autoridade do governo. Como parte do pacote de ajuste, o governo propõe que o aumento de 5,5% seja aplicado apenas a partir de agosto de 2016, e não em janeiro, como previsto inicialmente.

O reajuste do Judiciário não será adiado para o segundo semestre, porque o acordo entre os dois poderes já estava fechado. Parte do aumento, cerca de 2,5%, será pago no início do ano e percentual semelhante no segundo semestre. Com isso, o impacto sobre as contas do governo equivalerá a um reajuste concedido em abril, em vez do início do ano. A previsão é economizar R$ 10,5 bilhões em 2016 com as alterações nas datas de reajuste.

O Ministério do Planejamento é o encarregado de negociar os salários dos funcionários do Executivo e só depois de concluídas as conversas é que o governo pretende enviar ao Congresso Nacional o projeto de lei prevendo as regras salariais. "As categorias que fizerem acordo com o governo terão reajuste. Quem não fizer, não tem aumento" explicou a fonte.

O governo descartou a elevação a Cide sobre combustíveis como fonte de receitas por considerar que o aumento da contribuição, em um momento em que a inflação deve começar a ceder do patamar de 9,5%, "seria uma barbaridade", disse a mesma fonte. Além de arrecadar mais, explicou, a opção de recriar a CPMF tem impacto mais diluído do que a Cide sobre os demais preços da economia.

A política fiscal é a parte mais difícil das três frentes que compõem a macroeconomia, ao lado do câmbio e da inflação, na avaliação de uma alta fonte da área econômica do governo. "É a mais difícil, mais lenta e a que leva a maiores incertezas", disse. "O que está atrasando a recuperação da atividade, que já deveria ter começado, é o grau de incertezas políticas", avalia.

No caso do câmbio, a desvalorização recente foi importante para reduzir o déficit nas contas externas. O patamar em que chegou ontem, quando o dólar foi cotado a R$ 4,14 é, para a fonte, um "overshooting". A taxa de câmbio, na sua avaliação, deve voltar para o patamar de R$ 3,50 a R$ 3,60. A terceira frente, a inflação, já estaria com o processo de queda contratado. Só não está claro o quanto o câmbio pode comprometer a trajetória de queda da inflação.

As incertezas, para a fonte, decorrem da hostilidade do Congresso à pauta do governo - ora aprovando medidas que aumentam o gasto público, ora votando medidas na direção correta, de redução da despesa, mas insuficientes. Nesse sentido, as votações, que na madrugada de ontem confirmaram os vetos presidenciais a propostas de elevação do gasto, deram algum oxigênio ao Planalto.

Pela dimensão dos problemas e das incertezas quanto às soluções, a perspectiva no governo é que a recuperação da economia virá em algum momento de 2016, mas não será uma retomada do crescimento em "V" e sim, segundo a fonte, em "U".

Ou seja, antes de o país voltar a crescer a recessão deverá se estabilizar - o que é esperado para o último trimestre do ano - para só depois a atividade voltar a apresentar expansão.

Valor econômico, v. 16 , n. 3848, 24/09/2015. Brasil, p. A3