Petrobras aperta os cintos

 

O globo, n. 29992, 18//09/2015. Economia, p. 23

RAMONA ORDOÑEZ 

 

A Petrobras já começou a desligar 5 mil terceirizados, ou 30% dos que atuam na área administrativa. Após perder o grau de investimento, a estatal prepara forte ajuste, com corte em investimentos e venda de mais ativos. A Petrobras está refazendo as contas. Diante da queda do preço do petróleo no mercado internacional, da alta do dólar, dos efeitos da Operação Lava-Jato e da perda do grau de investimento pela Standard & Poor’s, a segunda agência a classificar a estatal como grau especulativo, a petroleira pretende cortar terceirizados, investir menos do que o previsto e vender mais ativos para fazer caixa. Uma das metas é cortar 30% dos terceirizados ligados à área administrativa, o equivalente a 5 mil pessoas.

Em algumas áreas foram encontrados mais terceirizados que funcionários próprios. O processo de desligamento já começou com a não renovação de alguns contratos e o cancelamento de outros. Segundo um dos principais executivos da estatal, a Petrobras já trabalha numa forte redução de investimentos com um ajuste em seu Plano de Negócios 2015-2019 em razão da piora do cenário.

‘AGORA É CORTAR NO OSSO’

Em 2015, o investimento será inferior aos US$ 27 bilhões previstos no plano, que já havia sido revisto para baixo em junho. Em 2016, ficará abaixo dos US$ 25 bilhões anunciados, informa o executivo. Não é só. Diante da desvalorização dos ativos, a companhia terá de vender mais bens para atingir a meta de US$ 15,1 bilhões até 2019. Os recursos são necessários para investir e pagar vencimentos da dívida em 2016, estimados em US$ 20 bilhões.

— Não dá mais para cortar na carne, agora é cortar no osso — resumiu um executivo da estatal, que pediu para não ser identificado.

Os cortes adicionais nos investimentos e nos custos administrativos serão discutidos em reunião do Conselho de Administração da estatal, no próximo dia 30. A revisão, segundo fontes, se faz necessária diante da mudança nas premissas do plano, que considerava a taxa de câmbio a R$ 3,10 neste ano e o barril do petróleo a US$ 60 (atualmente, está abaixo de US$ 50).

Na prática, o dia a dia da companhia já mudou. A empresa está renegociando contratos com todos os fornecedores e tem conseguido redução significativa de valores. Em outra iniciativa, a Petrobras tem paralisado equipamentos, como sondas de perfuração que começam a ser desativadas. Um dos sinais dessa necessidade de mais cortes de gastos é a demora para a assinatura do contrato renegociado com a Sete Brasil para o afretamento de sondas do pré-sal. No fim do mês passado, as partes teriam chegado a um acordo para a encomenda de 15 sondas contra as 28 previstas no contrato anterior. Nesta semana, a Petrobras informou a Sete, porém, que o assunto ainda está em avaliação pela área técnica.

Outra ação no horizonte da empresa é a venda de 25% das ações da BR Distribuidora, iniciativa que foi suspensa diante da piora do mercado. O conselho vai analisar de novo o assunto na reunião do dia 30. Caso não haja apoio à venda de uma fatia ao mercado, a estatal pode optar por buscar um sócio estratégico. O processo mais adiantado de venda de ativos em discussão é o da subsidiária Gaspetro.

As mudanças na Petrobras esbarram em resistências internas. A empresa pretende reduzir em cerca de 30% o número de gerências. Até agora, porém, o número aumentou. Segundo informou a própria companhia, existem 7.115 funcionários próprios em funções de gerência, um aumento de cerca de 3% em relação aos 6.897 registrados em julho. Segundo o executivo da estatal, mesmo assim, o corte nos cargos de gerente será feito. Em nota, a Petrobras informou que “a otimização das funções gerenciais se dará conforme o andamento do processo de reestruturação da companhia”.

Segundo um executivo da estatal, não se descarta impacto até mesmo na meta de produção de petróleo para os próximos anos. A deste ano, de 2,1 milhões de barris por dia, não deve ser afetada porque os projetos previstos já estão em operação.

— Se as metas de produção de petróleo para os próximos anos forem afetadas por causa dos cortes, isso será comunicado. Agora, na Petrobras, a vida é como ela é, não se vende ilusão — explicou o executivo.

EM BUSCA DE INVESTIDOR DE LONGO PRAZO

O encolhimento da Petrobras já resultou numa drástica redução das metas de produção de petróleo. Se antes a companhia sonhava dobrar de tamanho em cinco anos e pular de uma produção da ordem de 2 milhões de barris de petróleo por dia para 4,2 milhões de barris em 2020, a expectativa atual é mais modesta. Até agora, a previsão é chegar a 2020 com 2,8 milhões de barris diários. A produção conjunta de petróleo e gás já soma 2,88 milhões de barris por dia no segundo trimestre deste ano.

Em diversos aspectos, os números mostram que a estatal vive uma volta ao passado. Desde 2014 até agora, a empresa diminuiu drasticamente sua previsão de investimentos. Antes dos cortes adicionais em estudo, a Petrobras já havia reduzido US$ 90 bilhões de sua previsão para o período 2015-2019. Até agora, a estimativa para este ano soma US$ 130,3 bilhões, o menor nível desde 2008, quando o plano para cinco anos totalizava US$ 112,4 bilhões. O movimento também é visível no valor de mercado da companhia, que vale atualmente US$ 29 bilhões, o que significa uma volta aos patamares de 2003.

A situação da companhia ganha ainda mais peso diante do elevado nível de endividamento, de R$ 323,9 bilhões em 30 de junho, dos quais 81% são em dólar. Segundo uma fonte, a Petrobras não precisará recorrer ao mercado externo este ano para obter novos financiamentos além dos US$ 11 bilhões levantados no primeiro semestre. No entanto, a área financeira da estatal está estudando estruturas que poderão ser “desenhadas” para acessar um universo maior de investidores. Entre as alternativas em estudo estão instituições chinesas, como bancos de desenvolvimento e instituições financeiras comerciais e agências de fomento, entre outras.

Nos termos de um executivo, a Petrobras intensificará as buscas por um “investidor frio e profissional”, que enxergue o momento do país como oportunidade de investimento a longo prazo.