Dilma cogita substituir Mercadante em reforma

Raymundo Costa, Claudia Safatle e Cristiano 

17/09/2015

No momento em que a oposição dá a partida no processo de impeachment, ancorada numa figura venerável como o jurista Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT, a presidente Dilma Rousseff prepara uma reforma do ministério para tentar recompor politicamente seu governo, manter-se no cargo e recuperar a economia. A reforma pode ser divulgada até quarta-feira, antes de a presidente viajar para os Estados Unidos. Segundo aliados, esta pode ser a última chance de Dilma de viabilizar o seu governo.

Há mais de um cenário sobre a mesa da presidente da República, mas todos contemplam a hipótese de extinção de dez ministérios prometida pelo governo, ao anunciar as medidas para o ajuste do Orçamento. Se dependesse do PT, aproveitaria as mudanças para fazer uma ampla reforma ministerial, quase um recomeço de governo. Sob pressão dos partidos, no entanto, Dilma tem dificuldades até para cumprir a cota de ministérios que prometeu extinguir.

Segundo apurou o Valor, a presidente Dilma finalmente se convenceu de que o ministro Aloizio Mercadante não é "a Coca-Cola" que ela pensava e admite substituí-lo no cargo de chefe da Casa Civil. Isolada e fragilizada politicamente, no entanto, a presidente tem dificuldades para encontrar um nome de sua confiança para o cargo. Prova disso é que um dos cenários que circularam ontem previa a nomeação da ministra Kátia Abreu (Agricultura) para o cargo, mais por amizade do que por composição política com o Congresso.

O cenário com Kátia Abreu na Casa Civil prevê a nomeação do assessor Giles Azevedo para a Secretaria de Relações Institucionais (SRI), cuja extinção é prevista por um dos cenários da proposta, e do atual ministro da Comunicação de Governo, Edinho Silva, para a Secretaria-Geral da Presidência da República, no lugar do atual ministro Miguel Rossetto, que integra uma importante tendência de esquerda do PT, a Democracia Socialista, mas que é minoritária no partido. Edinho levaria para a SG a verba de publicidade da Secretaria de Comunicação.

"Se essa é a reforma do gabinete, resta saber se o impeachment virá antes ou depois dela", ironizou um aliado. "É pífio".

Na realidade, Kátia Abreu não soma o PMDB. Ela é cristã nova no partido e na ordem de precedência haveria outros nomes. Além disso, indicar uma senadora não significa facilitar ou dificultar o andamento dos assuntos de interesse atual de Dilma no Congresso, pois tanto o impeachment como a reedição da CPMF devem ter origem na Câmara. À noite, já havia uma avaliação de que, nessa hipótese, melhor seria manter Mercadante, que já é alvo claramente identificado das trapalhadas do governo e tem uma relação mais ampla que Katia Abreu com o Congresso.

A cúpula do PT aposta na manutenção de Mercadante. O partido, que se reúne esta noite em São Paulo, está mais preocupado com a manutenção da SRI, de preferência ocupada por um nome do partido. Dilma teria preferência pelo atual ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, mas na cúpula partidária o ex-presidente petista tem a fama de começar tarde no trabalho e de desligar o telefone às 22h. O ministro da Defesa, Jaques Wagner, era quase uma unanimidade no início do segundo mandato de Dilma para a Casa Civil. Agora volta a ser lembrado para a SRI. Mas tem problemas parecidos com os de Berzoini com o PT.

Segundo petistas, o presidente do partido, Rui Falcão, apoia o nome do atual líder do governo na Câmara, José Guimarães. Outra hipótese seria o do ministro da Ciência e Tecnologia, Aldo Rebelo, o que facilitaria para Dilma incluir o MCT na cota de extinção de dez ministérios. De acordo com fontes do PCdoB, partido de Aldo, o ministro só aceitaria o cargo como missão. Berzoini também prefere ficar onde está. O fato é que a SRI é obrigada a prometer muito, sem ter em contrapartida a caneta para atender os pedidos. Um nome do PMDB terá dificuldades para aceitar a função, pois Dilma estaria colocando no pacote da coordenação política o nome de Giles Azevedo, seu amigo há mais de 30 anos.

A criação do Ministério da Infraestrutura com a junção de transportes, portos e aeroportos esbarra na reação do PR, que ocupa os Transportes com o suplente da senadora Marta Suplicy (PT-SP), Antônio Carlos Rodrigues. Além disso, no momento, a pasta de Infraestrutura apenas pareceria poderosa, mas teria pouco a realizar com os cortes nos investimentos orçamentários. Mais fácil seria juntar Previdência Social e Trabalho, com a retirada do PDT, que já não vota mesmo com o governo. O problema é o impeachment. Mesmo o recém-chegado Renato Janine Ribeiro (Educação) estaria ameaçado, em eventual fusão do MEC com a Ciência e Tecnologia. "Por inoperância", segundo fonte próxima da presidente Dilma.

Deputados das frentes parlamentares da Agricultura Familiar e da Assistência Técnica e Extensão Rural do Congresso Nacional pediram em ofícios à presidente Dilma Rousseff que não acabe com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) ou o incorpore ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Alas do PT e movimentos sociais como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) também vêm reagindo à disposição do governo de alterar a estrutura do MDA. Se isso ocorrer, o PT preferiria que o ministro da nova pasta fosse Patrus Ananias (MDA), mas isso não só atingiria uma amiga da presidente, Teresa Campelo (MDS), como reduziria o número de mulheres no governo.

A possibilidade de renúncia de Dilma, apesar de todas as negativas da presidente, ainda não saiu de todo das cogitações políticas de aliados do governo. Diante da gravidade da situação, não se pode descartar mesmo as alternativas mais improváveis.

Valor econômico, v. 16 , n. 3843, 17/09/2015. Política, p. A9