Petrobras terá de se ajustar ao novo dólar

Rodrigo Polito e André Ramalho 

28/09/2015

A disparada do dólar, que chegou a superar a barreira dos R$ 4 na última semana, afetará a Petrobras muito mais pelo lado do endividamento do que pela importação de petróleo e derivados. Apesar da valorização da moeda estrangeira, o impacto na comercialização de óleo e combustíveis da estatal será amenizado pela redução do preço do barril do petróleo e a desaceleração do consumo ao longo do trimestre, de acordo com especialistas ouvidos pelo Valor. Ainda assim, os preços da gasolina, contudo, seguem defasados.

Enquanto o dólar teve variação de pouco mais de 27% no acumulado do terceiro trimestre até a sexta-feira, o preço do petróleo tipo Brent passou do patamar acima de US$ 60 para abaixo de US$ 50, no mesmo período. Ainda não há dados sobre as importações da Petrobras no trimestre. No segundo trimestre, porém, a importação de derivados de petróleo da companhia foi de 315 mil barris/dia, 9% inferior ao trimestre anterior e 22,6% abaixo do apurado entre abril e junho do ano passado.

De acordo com cálculos do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a defasagem entre o preço da gasolina no mercado doméstico em relação ao preço internacional, pelo qual a estatal importa o combustível, estava em 7,2% no fim da última semana. Já o preço do diesel interno continuava superior ao mercado internacional, em torno de 6%.

Pelas contas da consultoria GO Associados, o preço médio da gasolina comercializada no Brasil, no acumulado de setembro até a sexta-feira, está apenas 2% acima do valor praticado no mercado internacional. Na mesma comparação, o preço médio do diesel no Brasil está 12% acima do valor no mercado internacional.

"Em setembro, o término das férias no Hemisfério Norte jogou para baixo o preço da gasolina no mercado internacional", disse Fabio Silveira, da GO Associados. Segundo o especialista, se o dólar se mantiver no patamar próximo de R$ 4 e o preço internacional do petróleo retomar uma trajetória de alta, motivada pela expectativa de adiamento da elevação da taxa de juros nos Estados Unidos, a "gordura" que a Petrobras vinha acumulando de margem na venda de combustíveis deve diminuir.

Para Flavio Conde, da consultoria WhatsCall, com a recessão da economia brasileira, o consumo de combustíveis já dá sinais de queda, diminuindo o impacto da defasagem de preços dos combustíveis pelo aumento da moeda americana. "O efeito da alta do dólar na importação líquida de petróleo e derivados da Petrobras será muito baixo", explicou.

Segundo ele, em 2015, a estatal recuperou cerca de R$ 11,8 bilhões com a variação positiva dos preços dos combustíveis, em relação ao mercado externo. Conde, porém, destaca que ainda falta recuperar cerca de R$ 77,6 bilhões relativa às perdas com a defasagem de preços no período de 2011-2014.

"Advogo que o preço da gasolina e do diesel tem de ficar mais caro que o importado até recuperar os R$ 77,6 bilhões", disse ele.

Para o ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e consultor David Zylbersztajn, a estatal precisa reajustar os preços dos combustíveis o quanto antes, para minimizar os efeitos do aumento do dólar sobre o endividamento da companhia. "A dívida da Petrobras cresce de acordo com o aumento do dólar e o déficit dos preços da gasolina também. É uma situação bastante complicada. Antes mesmo do que vender ativos ela deveria correr para ajustar seus preços, porque se ela não ajustar, o buraco [déficit] vai aumentar ainda mais. E, daqui a pouco, a venda de ativos não vai ser suficiente para cobrir a dívida", comentou.

Em relatório distribuído a clientes na última semana, o Bank of America Merrill Lynch (BofA) indicou que se a Petrobras praticasse um valor para gasolina e diesel 10% acima dos preços internacionais, ela teria um efeito positivo de US$ 8,5 bilhões no fluxo de caixa. Nesse cenário, segundo o banco, a empresa precisaria de apenas de US$ 8 bilhões de financiamento novo para sustentar seu plano de investimentos, contra o montante de US$ 26 bilhões previsto no cenário pessimista do banco.

O último reajuste feito pela Petrobras para os preços da gasolina e diesel foi em novembro de 2014.

Valor econômico, v. 16 , n. 3850, 28/09/2015. Empresas, p. B4