Correio braziliense, n. 19059, 01/08/2015. Política, p. 2

Presidente da CPI sobe o tom contra advogada

 

EDUARDO MILITÃO
Deputado Hugo Motta, aliado de Eduardo Cunha, rebate declarações de Beatriz Catta Preta, que revelou ter sofrido "ameaças veladas" por parte de integrantes do colegiado.


O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acompanha passo a passo os movimentos da CPI da Petrobras — acusada pela advogada Beatriz Catta Preta de fazer “ameças veladas” a ela a fim de intimidar a defensora e seus clientes, que acusam parlamentares de cometerem crimes na Operação Lava-Jato. O principal canal do deputado é o presidente da CPI, Hugo Motta (PMDB-PB), indicado para o cargo pelo próprio Cunha. Ambos negam o controle, mas o grupo aliado do dirigente máximo da Câmara tem apresentado uma série de requerimentos para constranger delatores. Ontem, os peemedebistas reagiram às acusações da advogada e negaram qualquer ingerência sobre a comissão ou alguma tentativa de ameaça. Motta subiu o tom e disse que há “indícios” de “alguns atos ilícios que ela tenha cometido no âmbito do processo da Lava-Jato”.

Hugo Motta criticou a advogada e disse que, apesar da decisão do STF de impedir que ela revelasse dados dos clientes e de seus honorários, a convocação da defensora estava mantida. “O que é mais estranho é uma advogada criminalista alegar que está sendo ameaçada e não trazer nenhum fato concreto”, ironizou. “E vir a um jornal de rede nacional querer usar a vitimização para esconder, talvez, alguns atos ilícios que ela tenha cometido no âmbito do processo da Lava-Jato”, acrecentou o presidente da CPI.

Outro aliado de Cunha na CPI é o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ), professor de português em seu primeiro mandato e que apresenta a maioria dos requerimentos polêmicos. Saíram do gabinete dele os dois pedidos — ambos aprovados — para quebrar os sigilos da mulher, da filha e da irmã do doleiro Alberto Youssef. O delator o chamou de “pau-mandado do senhor Eduardo Cunha”. Pansera rejeita a pecha de perseguição: “Quem é que achaca? O bandido ou o deputado?”, afirmou ele ao Correio. O deputado também conseguiu aprovar requerimento para que Catta Preta explicasse a origem dos honorários. Os três requerimentos da CPI foram derrubados no Supremo Tribunal Federal (STF).

Na quinta-feira, Catta Preta disse, em entrevista à TV Globo, que recebia “ameaças veladas” de integrantes da comissão, e que essa “pressão” aumentou após o novo depoimento de seu cliente Júlio Camargo — ele disse ao juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, que Cunha lhe cobrou US$ 5 milhões de propina na venda de dois navios-sondas para a Petrobras.

“Autonomia”
Eduardo Cunha foi às redes sociais ontem se defender das suspeitas de controle da CPI e de intimidação indireta. “Não participei, não participo nem participarei de qualquer decisão sobre investigações da CPI, que tem a sua autonomia”, assegurou. O presidente da Câmara disse que Catta Preta foi convocada antes do depoimento de Júlio Camargo. “Desconhecia a sua convocação, que se deu, com certeza, antes do delator mudar de versão. E se pesquisarem na mídia, como fiz, fica claro que ela foi convocada antes do delator depor no último dia 16.” Antes disso, porém, já corria a informação no Congresso de que Júlio Camargo havia mudado seu depoimento e acusado Cunha. Segundo Catta Preta, uma oitiva já foi prestada na Procuradoria-Geral da República, mas não se sabe se isso ocorreu antes da convocação da CPI.

Hugo Motta disse que a empresa britância Kroll — contratada pela Câmara para conduzir uma investigação própria — pode ter delatores entre seus alvos. “Os delatores, confessadamente, assumiram que cometeram delitos. Nós precisamos investigar se eles devolveram tudo que desviaram no âmbito da Petrobras”, disse o peemedebista. Para o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), a intenção da CPI é anular toda a Operação Lava-Jato. “A Kroll foi colocada para encontrar algo que fosse divergente, anular as delações e dar uma grande gelatina”, afirmou. Ele duvida que Cunha não interfira na investigação da CPI após decretar sigilo ampliado do trabalho da empresa investigativa. “Como não tem interferência?”, questionou.

O deputado Ivan Valente (PSol-SP) disse ontem que pedirá a quebra de sigilo bancário de Eduardo Cunha e sua convocação na CPI. “Para provar sua versão, Eduardo Cunha deveria abrir os seus sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático. Seria coerente com sua política ofensiva, mas isso ele não faz”, ressaltou o socialista, por meio de nota. O deputado defende a convocação de Júlio Camargo, que, segundo Valente, nunca ocorreu por pressão de Eduardo Cunha.

“Para provar sua versão, Eduardo Cunha deveria abrir os seus sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático. Seria coerente com sua política ofensiva, mas isso ele não faz”
Ivan Valente (PSol-SP), deputado

“Não participei, não participo nem participarei de qualquer decisão sobre investigações da CPI, que tem a sua autonomia”
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara


» Personagem da notícia

Histórico na Satiagraha e no mensalão
Responsável por fechar nove das 24 delações premiadas decorrentes das investigações da Operação Lava-Jato, a advogada Beatriz Lessa da Fonseca Catta Preta (foto) tem histórico de atuação em casos de grande repercussão, como a Operação Satiagraha e o mensalão. No escândalo, descoberto em 2005, ela conduziu a delação de Lúcio Funaro, um operador financeiro próximo do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Formada pela Universidade Paulista (Unip), a advogada atuava, até fechar seu escritório, na área do direito penal empresarial. Sua tarefa é defender investigados acusados de crimes tributários e contra o sistema financeiro. Segundo a revista Veja, a advogada é casada com Carlos Eduardo Catta Preta, um ex-cliente, que foi preso em 2001 transportando US$ 50 mil falsos. Ela o defendeu e os dois se apaixonaram. O marido foi condenado a prestar serviços comunitários em 2003. O casal tem dois filhos. (EM)
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Duque vai negociar delação


O ex-diretor de Engenharia da Petrobras Renato Duque decidiu procurar o Ministério Público e tentar se tornar o 25º investigado a fechar acordo de delação premiada na Operação Lava-Jato. A negociação será feita com o advogado Marlus Arns, um dos que conduziu as tratativas com os executivos Dalton Avancini e Eduardo Leite, da Camargo Corrêa. Duque foi indicado para o cargo pelo PT. De acordo com os ex-dirigentes da estatal Pedro Barusco e Paulo Roberto Costa, parte da propina paga a Duque era destinada aos petistas.

A decisão frustrou os advogados Alexandre Lopes e Renato de Moraes. Eles vão deixar o caso e se disseram surpresos com a notícia. “Soube hoje (ontem) que Duque vai procurar o MPF para fazer delação, mas não há nada fechado ainda”, disse Lopes ao Correio. “Surpreendido, renunciarei à defesa, pois não concordo com a delação.” Anteriormente, Lopes disse que alegaria à Justiça que as contas no exterior atribuídas a Duque e a Jorge Zelada, outro ex-dirigente da Petrobras investigado, tinham sido abertas à revelia deles. Nessas contas, a Polícia Federal e o Ministério Público encontraram o dinheiro que julgam ser da corrupção na petroleira.

Prisão estendida
O juiz federal Sérgio Moro recebeu ontem a quinta denúncia contra Duque por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele ainda estendeu, por mais cinco dias, a prisão do executivo Flávio Barra, da Andrade Gutierrez, e do presidente licenciado da Eletronuclear, o almirante da reserva Othon Pinheiro. Na quinta-feira, o militar disse, à PF, que não recebeu propinas nas obras da usina de Angra 3.

Nas contas da empresa Aratec, de Othon, os investigadores encontraram R$ 4,5 milhões pagos entre 2009 e 2014 apenas pela Andrade Gutierrez e pela Engevix, empreiteiras que prestavam serviços à usina. Segundo Othon, quando ingressou na Eletronuclear, em 2005, emprestou a firma para sua filha, que é Othon negou que a empresa fosse de fachada. (EM)