Correio braziliense, n. 19061, 03/08/2015. Economia, p. 7

País perderá R$ 350 bi até 2016

ROSANA HESSEL

O Produto Interno Bruto (PIB) potencial é uma medida usada pelos especialistas para determinar a real capacidade do país de crescer sem que a inflação fuja do centro da meta, de 4,5%, perseguida pelo Banco Central. 

Desde que Dilma Rousseff assumiu o governo, em janeiro de 2011, esse indicador só fez desabar. Era de 4,5% e hoje varia entre 1,5% e 2,5%, a depender da boa vontade dos analistas. Ainda que a conta leve em consideração a melhor das hipóteses, os 2,5%, o Brasil deixará de gerar riquezas de ordem de R$ 350 bilhões neste ano e em 2016, devido à contração do PIB nesse período.

As estimativas são de retração econômica por dois exercícios seguidos. Não é segredo para ninguém que o tombo da atividade se dará exclusivamente por causa dos problemas criados pela presidente: inflação, desemprego, juros altos e contas públicas desajustadas.

Seria de esperar, portanto, que o país buscasse no exterior uma forma de compensar o desastre provocado pela gestão do governo nos últimos quatro anos. Mesmo longe do seu apogeu, a economia global dá sinais consistentes de recuperação. Pelas contas do Fundo Monetário Internacional (FMI), o salto do PIB mundial deverá ser de 3,3% neste ano, puxado, sobretudo, pela locomotiva do planeta, os Estados Unidos, com avanço esperado de 2,5%.

Infelizmente não vamos tirar um naco sequer desse potencial. Exportações “Em vez de ganhar, estamos perdendo mercados no mundo”, diz José Augusto de Castro, presidente interino da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). “As exportações estão caindo em vez de crescerem”, acrescenta. A participação do Brasil no volume de produtos e serviços negociados no mercado internacional retornou ao nível de uma década atrás. Nem mesmo a constante valorização do dólar, que tornou nossas mercadorias mais baratas — em 12 meses, a queda do real chega a 51% — , foi suficiente para reanimar as exportações do país. Castro não esconde o desânimo. “Em 2015, o Brasil perderá uma fatia importante do comércio mundial. Vamos retroceder aos níveis de 2003 em termos de participação”, avisa. Ele estima que o país ficará com menos de 1% do total das exportações mundiais, que devem crescer 2% neste ano, segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). Há 12 anos, o Brasil respondia por 1% das vendas globais; em 2010, havia chegado a 1,3%. Nem mesmo a perspectiva de saldo positivo de US$ 8 bilhões na balança comercial deste ano deve ser comemorado, diz o presidente da AEB. “Teremos o que o mercado chama de superavit negativo, resultado da queda das importações e não do crescimento das exportações, que também estão em baixa”, explica. As estimativas de Castro são de que as importações retrocedam 9,5% em 2015, para US$ 207,2 bilhões, e as exportações recuem 4,3%, somando US$ 215,4 bilhões, pouco acima dos US$ 210 bilhões entregues por Lula em seu último ano de mandato.

O que mais preocupa, no entender do economista João Luiz Mascolo, professor do MBA Executivo do Insper, é que, além de encolherem, as exportações brasileiras estão cada vez mais centradas em produtos básicos, as commodities, cujos preços não param de cair.

“Se as cotações das commodities cedem, não tem câmbio que ajude. No caso do Brasil, os embarques de manufaturados, que agregam valor e tecnologia, perderam a relevância, o que é uma loucura num mundo tão competitivo”, avisa. Commodities A situação se complica porque o maior comprador de commodities brasileiras, a China, está desacelerando —o crescimento do país caiu à metade, para 7%, em relação à década passada.

“O dólar está mais alto, mas as exportações devem continuar caindo, pois não basta ter câmbio favorável. É preciso ter preço competitivo, porque o euro também caiu ante a divisa dos Estados Unidos, assim como as demais moedas de países emergentes. A concorrência só faz aumentar”, frisa. Na avaliação do presidente da AEB, para aumentar as exportações, o Brasil precisa ganhar espaço no mercado de produtos manufaturados. Entre 2004 e 2006, a participação desses itens de alto valor agregado chegou a quase 60% da pauta de vendas do país. Em junho deste ano, havia recuado para apenas 37%. “Pelas nossas projeções, o Brasil continuará perdendo espaço nesse segmento. A nossa estimativa é de que as exportações de manufaturados caiam neste ano para US$ 72,9 bilhões contra US$ 80 bilhões de 2014”, adianta. Castro lembra que o único destino em que o Brasil registra crescimento das exportações de manufaturados são os Estados Unidos, mas a recente visita oficial que Dilma fez a Washington trouxe pouquíssimos acordos na área comercial.

“Isso é o que se pode chamar de desperdício de oportunidade.” No governo Dilma, o país não conseguiu fechar nenhum acordo comercial relevante, que pudesse resultar em abertura de mercados. Nossos maiores concorrentes, no entanto, estão dando passos avançadíssimos no sentido de derrubar barreiras. É questão de sobrevivência. Pendurados nos juros Diferentemente do que aconteceu em outras épocas no país, muitas das grandes empresas estão capitalizadas. O problema não é dinheiro para investir,mas achar um motivo. Produzir mais para quê? Com os juros altos, a 14,25% ao ano, sem risco, a decisão sobre o que fazer como dinheiro ficou fácil.“ O custo de oportunidade do investimento, mesmo para quem tem recursos em caixa, é muito alto. Se não puder obter um retorno mais alto do que o da renda fixa, não vale a pena colocar dinheiro em novas máquinas”, explica o economista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. Para Sidnei Nehme, diretor executivo da NGO Corretora, deixar o dinheiro rendendo no banco virou o melhor negócio da praça.“O empresário brasileiro está descobrindo que a melhor coisa do capitalismo é ser capitalista”, ironiza. Não por acaso, diz Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Universidade de Campinas (Unicamp), a queda nos investimentos produtivos poderá ser superior aos 10%estimados pelo mercado. Ele cita o caso das indústrias de máquinas e equipamentos, que deverão ter queda de 25%, no ano, na produção. Os produtos dessas empresas são considerados investimento. Portanto, se as fábricas não estão comprando máquinas, é porque seus planos de investimentos foram cortados. Jorge Arbache, professor da Universidade de Brasília (UnB), também vê chance considerável de o recuo nos investimentos ser bem maior do que os 10%. “As empresas vão se limitar a implantar melhorias nas linhas de produção para aumentar a produtividade e reduzir custos. Muito poucas vão elevar a capacidade de produção.“ O que estamos vendo são empresas que tinham três turnos de trabalho passando a operar com apenas dois”, explica. No entender de Arbache, com a queda dos investimentos, a capacidade de crescer do país é cada vez menor. (PSP)

____________________________________________________________________________________________________________________

R$ 110 bi a menos em investimentos

PAULO SILVA PINTO

Para almejar taxas de crescimento maiores do que as que o Brasil tem sido capaz de apresentar, é preciso investir mais. Era o que Dilma Rousseff prometia quando subiu a rampa do Planalto pela primeira vez como presidente, em janeiro de 2011. Não conseguiu. Pior: os investimentos andaram para trás.

Nem o governo conseguiu levar adiante projetos que poderiammudar a realidade do país,sobretudo na infraestrutura, nem o setor privado se sentiu confiante o suficiente para retirar das gavetas projetos que ajudariam a resgatar a economia do atoleiro. Como paíssob o comando deDilma, primeiro,o ProdutoInterno Bruto(PIB) estagnou-se. Agora, caifortemente.

As expectativas para este ano são de redução de 2% ou mais. Uma das razões para isso é que os investimentos estão caindo a uma velocidade cinco vezes maior: a projeção é de uma redução de 10%em termo reais neste anoem relação a2014.Isso significa que, em 2015, deixarão de ser injetados R$ 110 bilhões na economia para gerar empregos e maior competitividade às empresas. "Não se pode esperar outra coisa se a Petrobras, que está sendo investigada pela OperaçãoLava-Jato, está cortando seusinvestimentos, que têmgrande peso no PIB", comenta Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central. A petroleira anunciou previsão de investimentos deUS$ 130 bilhões entre 2015 e 2019, volume 37% menor do que o apresentado para o período 2014-2018.

A retração dos investimentos não vem de hoje. Em 2014,foram investidos R$ 47 bilhões amenos do que no ano anterior. Em 2012, o recuo havia sido deR$ 5 bilhões. "Há um conjunto de fatores ruins no Brasil atualmente, com a persistência de problemas estruturais que o país não enfrentou e a perda de confiança", afirmaLucianoRostagno, economista-chefe doBanco Mizuho.

Pelas contas dele, o idealseria que o Brasil destinasse pelo menos 25% do PIB para investimentos e não 18%, como se vê. Na China, por exemplo, investe-se 48% do PIB. Na Índia, 31%. E não é preciso irtão longe. No Peru, o índice é de 27% e, na Colômbia, de 26%. ParaRostagno,somente em 2017 haverá algumamelhora, mesmo assim,seránecessário o paíspassar por reformas microeconômicas, reduzindo, por exemplo, a carga tributária das empresas, para torná-las mais competitivas. Será também necessário investir em infraestrutura.

O problema é que esse item depende do governo, que perdeu a capacidade de fazer obras devido à situação desastrosa das contas pú- blicas. Segundo Kent Kedl, diretor da consultoria Control Risk, o Brasil deve recorrer à China para tentar impulsionar osinvestimentos e, portabela, a economia. Ele concorda que é difícil fazer negócios com aquele país diante, por exemplo, da exigência de emprego de mão de obra chinesa nas obras. Mas ressalva que a China está cada vez mais disposta a negociar. "Os chineses estão percebendo que não são uma potência global, capaz de fazer qualquer exigência. Assim, se quiserem investir, terão de fazer parcerias e contratar mão de obra local", explica.