CPMF poderá ser maior para atender estados

 

SIMONE IGLESIAS, ISABEL BRAGA, MARIA LIMA. GERALDA DOCA, CATARINA ALENCASTRO E ROBERTO MALTCHIK

O globo, n. 29989, 15//09/2015. País, p. 6

 

A alíquota da CPMF poderá ser maior que os 0,2% anunciados ontem pelos ministros Joaquim Levy ( Fazenda) e Nelson Barbosa ( Planejamento). Apesar de o governo ter decidido que toda a arrecadação da CPMF ficará com a União para custear a Previdência Social, a presidente Dilma Rousseff já sabia que, assim que a proposta fosse apresentada, o governo seria pressionado pelos governadores a dividir os recursos da nova CPMF com os estados, que também estão com seus caixas combalidos.

JORGE WILLIAMNegociação.

Com isso, o Planalto está ouvindo propostas dos governadores para ampliar a alíquota. A ideia é fazer uma troca em busca de votos no Congresso: os governadores definem um percentual além dos 0,2%, de forma que a diferença seja repassada diretamente aos estados, e os governadores assumem o compromisso de conseguir apoio de suas bancadas para aprovar a CPMF.

— Vamos fazer uma conversa franca sobre isso. Vamos ver o que cada um propõe. O importante é que o governo consiga abrir essa discussão ( da recriação da CPMF) com o Congresso — afirmou ontem um integrante do governo ao GLOBO.

JANTAR COM GOVERNADORES

Ontem mesmo, Dilma entrou em campo na defesa da aprovação da CPMF. À noite, jantou com 19 governadores aliados no Palácio da Alvorada. Ao longo do dia, ela conversou com líderes aliados na Câmara, entre eles, o deputado Leonardo Picciani ( PMDB- RJ), sugerindo a negociação.

Segundo os parlamentares, a presidente disse que a alíquota proposta seria mais baixa que os 0,38% cobrados anteriormente, sendo o imposto específico para custear a Previdência e temporário, mas que, se o Congresso quiser, poderá incluir estados e até municípios.

— Por mais duro que seja falar em aumento de impostos, neste momento é importante discutir isso sobretudo para estados e municípios. Em alguns casos, a situação fiscal é mais grave do que da União — afirmou Picciani.

Hoje pela manhã, Dilma recebe os líderes dos partidos aliados para tentar negociar a recriação do imposto. Há 20 dias, Dilma tentou colocar de pé a volta do imposto. A área econômica propôs uma alíquota de 0,38%, com redistribuição de 0,02% aos estados e 0,01% aos municípios. A previsão de arrecadação anual do tributo chegaria, pelo

Pezão e Dilma Rousseff no Palácio da Alvorada: “Estados também têm déficit na Previdência”, afirmou governador do Rio menos, a R$ 80 bilhões, com R$ 73 bilhões para a União; R$ 4,2 bilhões, com os estados; e R$ 2,1 bilhões, com os municípios. A distribuição foi considerada “injusta” por governadores que defendiam a volta do imposto.

Os governadores convidados para o jantar com a presidente foram pegos de surpresa com a notícia de que a proposta de recriação da CPMF não prevê o compartilhamento com estados e municípios, como era a ideia original.

O argumento dos ministros Joaquim Levy e Nelson Barbosa para não dividir o bolo de R$ 32 bilhões com estados e municípios — que ele se destinará exclusivamente a abastecer a Previdência Social, paga pela União — não foi aceito pelo governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, do PMDB. Ele avisou que, no jantar, pressionaria a presidente e os ministros a mudar a proposta para incluir estados e municípios.

— Eu acho que precisa haver, sim, esse compartilhamento com estados e municípios. Vou defender que a proposta seja alterada. Os estados também têm um déficit na Previdência. Aliás, o grande gargalo do meu governo é a Previdência — reclamou Pezão.

O governador do Maranhão, Flávio Dino ( PCdoB), também mostrou- se surpreso com a proposta que exclui estados e municípios. Disse que iria buscar mais informações para discutir o assunto com a presidente Dilma e os ministros durante o encontro.

Na proposta anterior, os recursos seriam destinados à Saúde, e, por isso, uma parte da fatia do governo federal também acabaria indo para estados e municípios, que têm pesados gastos com o setor.

Mesmo com esse repasse pequeno, a maioria dos governadores mostrou disposição de apoiar a recriação da CPMF. Agora, a reação será maior. Os governadores do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg ( PSB), e do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori ( PMDB), por exemplo, já afirmaram que apoiariam a recriação da CPMF, mas desde que o governo federal fizesse uma divisão mais justa.

O governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo ( SD), sempre se manifestou contra qualquer tipo de aumento de impostos. Ele também participou do jantar com 19 governadores ontem com Dilma para discutir o pacote.

PELO MENOS QUATRO ANOS

Para justificar a fuga da tradicional destinação dos recursos da CPMF à Saúde, o ministro Joaquim Levy disse que o dinheiro arrecadado com a nova contribuição — R$ 32 bilhões em 2016 — vai ajudar a cobrir o rombo do déficit da Previdência Social. E, como o regime de aposentadoria é de responsabilidade da União, as receitas não precisam ser divididas obrigatoriamente com outros entes da Federação.

— A previsão ( de receitas) é para a União. Com a desaceleração da atividade, a receita não está crescendo (...). Ninguém arca com a Previdência Social da União — disse o ministro da Fazenda, ao ser indagado na entrevista.

O ministro chegou a estabelecer um prazo de duração da contribuição, que tem caráter provisório:

— Nosso objetivo é que a CPMF não dure mais do que quatro anos. A gente está projetando superávit de 0,7%, e não podemos continuar com 0,7% a vida toda. O esforço terá que ser gradual ao crescimento da economia. O próximo governo pode revogar a CPMF — afirmou Levy.

Segundo ele, o governo optou pela CPMF porque a contribuição causa menor distorção na economia e menor impacto menor inflacionário, e porque toda a sociedade paga, sem sacrificar setores específicos.

— Incide tanto sobre as atividades de lazer quanto na atividade produtiva. Está pagando dois milésimos do valor que você vai comprar. Você vai comprar um ingresso para o cinema com o cartão, e teríamos dois milésimos ( do valor pago) entrando para ajudar a cobrir o rombo da Previdência. É uma contribuição provisória — justificou o ministro.

EM 2007, DIVISÃO NO SENADO

Dos 81 senadores que terão que a apreciar a proposta anunciada ontem pelo governo para recriar a CPMF, 16 estavam no Senado em dezembro de 2007, quando a Casa derrubou a cobrança do tributo. Naquela votação, nove deles se posicionaram de forma favorável à manutenção do “imposto do cheque”. Os outros sete engrossaram a maioria que pôs fim à CPMF.

Naquela época, votaram a favor do tributo os senadores do PMDB Romero Jucá ( RR), Valdir Raupp ( RO) e José Maranhão ( PB). Além deles, Magno Malta ( sem partido - ES), Edison Lobão ( PFLMA), Delcídio Amaral ( PT- MS), Antônio Carlos Valadares ( PSB- SE), Cristovam Buarque ( PDT- DF) e Marcelo Crivella ( PRB- RJ).

Contra a CPMF, em 2007, estavam os senadores tucanos Tasso Jereissati ( CE), Álvaro Dias ( PR) e Lúcia Vânia ( GO). José Agripino ( PFL- RN), Flexa Ribeiro ( PSDB- PA), Maria do Carmo Alves ( PFL- SE) e Paulo Paim ( PT- RS) somaramse a eles.

Todos foram reeleitos e estão na legislatura atual. Na noite em que a CPMF foi derrotada, em uma das mais duras votações que o ex- presidente Lula enfrentou ao longo de oito anos, o governo perdeu por pequena margem. O placar final foi de 45 a 34, sendo que o governo teria conseguido manter a cobrança se obtivesse 49 votos em seu favor.