Parlamentares propõem a Dilma elevar Cide sobre gasolina e diesel

Thiago Resende e Cristiano Zaia 

03/09/2015

A pressão para que o governo aumente a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre combustíveis (gasolina e diesel) aumentou sob argumento de aliviar o déficit orçamentário previsto para 2016. Encampada pela ministra da Agricultura, Kátia Abreu, a ideia - que beneficiaria a indústria de etanol - foi levada à equipe econômica e à presidente Dilma Rousseff, que ontem disse não "afastar" nenhuma fonte de receita.

A alta no valor da Cide pode ser feita por decreto presidencial, sem precisar do aval do Congresso Nacional. Fontes que acompanham as negociações, porém, relatam que o governo quer ter certeza do apoio da Câmara e do Senado em relação a esta medida para não correr o risco de um agravamento da crise política.

Foram parlamentares da Frente Sucroalcooleira do Congresso que apresentaram à Katia Abreu as propostas de elevação tributária sobre gasolina e óleo diesel. Os produtores de etanol - setor que enfrenta grave crise - sairiam ganhando porque os outros combustíveis perderiam competitividade.

Uma fonte do setor sucroenergético, que vem participando das conversas com o governo, disse que o Ministério da Fazenda estuda de maneira delicada elevar mais um tributo. "O governo não vê com maus olhos o aumento da Cide porque está precisando de arrecadação, mas tem preocupação natural com o impacto inflacionário. Dentro do governo tem gente que está com medo de isso gerar uma reação negativa da opinião pública", relatou.

Por causa da difícil aceitação dessa proposta pela população, o governo prefere dividir com o Congresso a responsabilidade de anunciar um aumento de imposto. Diante desse quadro, pode demorar um pouco para que seja assinado o decreto, avalia a fonte.

Uma das hipóteses colocadas ao governo prevê a recomposição total da Cide, que ficou zerada até o início do ano. Isso, segundo contas do setor, renderia R$ 10,6 bilhões aos cofres da União por ano. Estados e municípios teriam um incremento de R$ 4,3 bilhões na arrecadação, sem contar com a receita de ICMS que também subiria. Com isso, autores da ideia contam com o possível apoio de governadores e prefeitos.

Essa proposta, contudo, teria um impacto "mais forte" na inflação. Por isso, há ainda uma ideia de aumento intermediário, que renderia R$ 6,8 bilhões para a União e R$ 2,8 bilhões para Estados e municípios. "Essa seria menos 'danosa' para o índice de preços, mas vamos insistir na maior elevação possível da Cide", afirmou um parlamentar com trânsito no Ministério da Agricultura.

A alta da Cide sobre combustíveis é uma demanda antiga da União da Indústria de Cana de Açúcar (Unica). Diante da previsão de rombo de R$ 30,5 bilhões no Orçamento do próximo ano, a Frente Sucroalcooleira argumenta que esse seria "uma das soluções" para o problema fiscal e seria um incentivo para os produtores de etanol voltarem a investir e a contratar.

Os parlamentares ligados à proposta pretendem conversar com os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) em busca de apoio para a elevação do tributo que, apesar de não depender de votação no Congresso, não deve ser feito à revelia do restante da Câmara e do Senado.

Orçamento feito por Aécio volta a criar polêmica

Raphael Di Cunto e Thiago Resende 

Atual presidente do PSDB e um dos nomes do partido para concorrer à Presidência, o senador Aécio Neves (MG) encaminhou e aprovou projeto de lei orçamentária, quando governou Minas Gerais, com déficit de R$ 1,4 bilhão em 2004, no seu segundo ano de mandato, o que representava, na época, 7% da arrecadação.

Embora diferente pelo fato de Aécio estar no governo há um ano na época do déficit e o PT, há 12 anos à frente do governo federal, o caso é relembrado agora pelos petistas para rebater as críticas da oposição. "O Aécio fez uma manobra ao culpar o governo anterior pelo problema e depois dizer que resolveu tudo", diz o deputado estadual Rogério Correia (PT), que era líder da oposição.

Na época, Aécio alegou que o governo estava quebrado pelas gestões anteriores e tinha dificuldades de pagar salários. "Para o exercício de 2004 o governo de Minas Gerais sancionou um orçamento fiscal deficitário, evidenciando à população a real situação orçamentária do governo em equacionar as despesas do exercício, uma vez que não possuía receita suficiente para tal", afirma o relatório contábil da Secretaria da Fazenda sobre o ano de 2004.

Ao longo de 2004, o senador não conseguiu a receita de ativos prevista, mas elevou a arrecadação com um programa de refinanciamento de dívidas - batizado de "Minas em Dia" - e aumento do IPVA, do ITCD e taxas, de acordo com o relatório, além de incremento no ICMS. A receita prevista de R$ 20,6 bilhões cresceu para R$ 21,8 bilhões, já consideradas deduções.

Em nota, Aécio diz que a situação de Minas em 2004 "não guarda qualquer relação" com a situação de agora do governo federal "em razão da perda do controle sobre as contas públicas" e que apresentou um plano para resolver o problema, sem repassar a responsabilidade ao Legislativo. "Ao contrário do governo Dilma - que produziu o déficit histórico de R$ 30,5 bilhões -, o governo Aécio recebeu o Estado já em situação deficitária de R$ 2,4 bilhões, não tendo sido, portanto, o responsável pelo desajuste nas contas", afirma.

A situação se repete agora no Estado, mas foi a vez de o PT, que venceu as eleições com Fernando Pimentel, enviar orçamento com déficit. Eleito depois de três gestões do PSDB, o governador Fernando Pimentel (PT) acusou o adversário de superestimar receitas e subestimar despesas e refez o Orçamento de 2015 para incluir um rombo de R$ 7,3 bilhões. A peça orçamentária de 2015 foi inicialmente enviada pelo ex-governador Alberto Pinto Coelho (PP).

Câmara estende Simples para arquitetos e microcervejarias

O déficit orçamentário em 2016, exposto esta semana, não impediu a Câmara dos Deputados de ignorar o acordo feito com o governo e aprovar ontem dois destaques ao projeto de lei que amplia o teto de faturamento para as empresas ingressarem no Simples - e que já era criticado pelo Ministério da Fazenda- para aumentar ainda mais a renúncia de receita do Executivo.

Com a votação, os deputados concluíram ontem a análise do projeto, que segue para discussão no Senado. O Simples garante menor carga tributária e burocracia para as micro e pequenas empresas, que recolhem os impostos em guia única, geralmente com alíquota menor do que o das empresas fora deste regime.

Os destaques aprovados ontem, ambos com traição de partidos da base aliada, foram para reduzir a tributação sobre as empresas de arquitetura e urbanismo que optam pelo Simples; e para incluir todas as microcervejarias, vinícolas, produtores de licores e destilarias no regime - o relator, deputado João Arruda (PMDB-PR), tinha negociado incorporar apenas as de produção artesanal.

As duas mudanças vão reduzir a receita do governo, que ameaçou ontem vetar. "Não posso garantir o acordo [de sanção] se mudarmos o texto", afirmou o líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE). Não há estimativa do impacto das novas alterações, mas a estimativa é que, das 15,3 mil empresas de arquitetura e urbanismo do país, 13,8 mil são micro e pequenas e teriam a carga tributária reduzida.

No caso das bebidas alcoólicas, Arruda disse que retirar a limitação as fabricantes artesanais derruba o acordo feito para que a indústria de bebidas fique de fora. O objetivo, disse, é privilegiar as menores, mas os deputados argumentaram que a definição de quem pode ingressar no Simples é pelo faturamento, não pelo tipo de produção. A Receita e as grandes do setor trabalharam contra porque o segmento tem alta tributação - para as cervejas, é de 60% do faturamento-, e a redução pode gerar distorções.

O impacto total das mudanças no Simples, segundo a Receita Federal, será de R$ 11 bilhões na arrecadação, valor negado pelo ministro Guilherme Afif Domingos (PSD), da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, que aponta impacto de R$ 3,9 bilhões e chegou a trocar notas com acusações com o órgão subordinado ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

O projeto - cujo texto principal foi elaborado pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, quando era professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) - foi aprovado apesar da oposição de Levy, mas o líder do governo conseguiu negociar para que a mudança no teto de faturamento só se torne válido a partir de 2017.

A proposta dobra o limite de faturamento para que as empresas possam optar pelo Simples. O valor passará para R$ 900 mil por ano para as micro empresas, R$ 7,2 milhões para as pequenas e R$ 72 mil para o Microempreendedor Individual (MEI). Haverá ainda outra graduação para a indústria, de R$ 14,4 milhões, válida a partir de 2018.

A tributação dentro dos sub-limites de faturamento ainda passará a ser progressiva para evitar mudança mais brusca na alíquota -promessa de campanha da presidente Dilma Rousseff batizada de "Crescer Sem Medo".

Valor econômico, v. 16 , n. 3834, 03/09/2015. Política, p. A6