Dilma busca aval de Cunha e Renan a Orçamento

Andrea Jubé, Bruno Peres e Vandson Lima 

02/09/2015

Depois de enviar o Orçamento deficitário ao Congresso Nacional, a presidente Dilma Rousseff reuniu-se ontem, separadamente, com os presidentes da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Foi uma busca por respaldo político, diante do rombo declarado de R$ 30,5 bilhões, e uma tentativa de demonstrar estabilidade institucional. Após o encontro, Renan foi a público comunicar que não devolveria o Orçamento, enquanto Cunha - rompido com o governo desde julho - adotou tom conciliador.

Nos bastidores, contudo, auxiliares da presidente não esperam uma conciliação entre Dilma e Cunha. "Ela [Dilma] recebeu o presidente da Câmara dos Deputados, não o Eduardo Cunha", resumiu ao Valor um ministro palaciano. Já um líder pemedebista deu o tom do encontro: "Eles vão tentar mostrar harmonia institucional num momento de crise, mas nos bastidores seguirá o duelo de poderosos."

Dilma conversou, individualmente, com Renan, pela manhã, e Cunha, à tarde. O encontro com Cunha durou cerca de meia hora. A última vez que estiveram juntos foi em abril, quando ela o convidou para um jantar no Palácio da Alvorada.

Renan Calheiros, que já estendeu a mão para o governo, tranquilizou o Planalto ao anunciar que não cogita devolver a peça orçamentária, apesar dos apelos da oposição. Contudo, deixou claro que o Congresso não vai dividir com o Executivo a responsabilidade pelo rombo fiscal.

"Não é papel do Congresso apresentar soluções para a superação de déficit fiscal que está no Orçamento", avisou. "Cabe ao Congresso melhorar, dar qualidade à proposta orçamentária. E cabe ao governo sugerir caminhos para a superação do déficit", completou.

O pemedebista sinalizou, ainda, que o Congresso não pretende assumir a elevação de impostos, como deseja o governo. "O desafio passa primeiro pelo corte de despesa, o aumento da carga tributária não pode ser o único caminho", alertou. "Não é nosso papel", reforçou.

Quase dois meses após o rompimento - por atribuir ao Planalto a denúncia contra ele na Operação Lava-Jato -, o presidente da Câmara baixou o tom e relatou que compartilhou com Dilma a preocupação sobre o Orçamento. Em entrevista após o encontro, Cunha relatou que Dilma demonstrou preocupação com o aumento de despesas e "pautas-bombas". Ele, por sua vez, disse que o déficit "não é o principal problema" do país, mas assegurar que não haja aumento da dívida bruta. "Porque se você controlar a dívida, tem uma sinalização positiva que anula o problema do déficit. Sempre contestei que o superávit primário da forma como é feito não diz nada. Com adiamento de pagamentos, na realidade não é superávit primário. O que a gente precisa mostrar para o mercado é que nossa dívida bruta não será aumentada", completou.

Ele também mostrou à presidente preocupação com o aumento da taxa básica de juros. "À medida que a inflação vai cair é normal que os juros caiam também. Com a queda de juros, vai ter uma redução da dívida bruta", relatou. O presidente da Câmara voltou a defender a redução de ministérios como aceno positivo do governo à população. "Por menor que seja o corte que o governo faz é sempre muito importante o simbolismo".

Ainda na entrevista, Cunha negou que o encontro de ontem represente um recuo em sua determinação de romper com o governo. Na tentativa de criar um atalho com o PMDB da Câmara, Dilma abriu diálogo direto com o líder da bancada, Leonardo Picciani (RJ) - principal aliado de Cunha -, que se reuniu com a presidente há duas semanas.

Em outra frente, Renan - apontado como aliado do Planalto, desde o lançamento da Agenda Brasil, em parceria com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy - negou que esteja fechado com o governo. "Não sou governista e não sou oposição. Não é tentativa de aproximação política com ninguém, mas de afastamento da crise. Governo tem prazo de validade. O país não", afirmou.

Em tom bem humorado, Renan citou a funkeira Valeska Popozuda para pedir que haja união no Congresso em busca de soluções para a crise. "Tiro, porrada e bomba, para utilizar uma expressão tão contemporânea da música brasileira, não reerguem nações. Espalham ruínas e só ampliam os escombros. Não seremos sabotadores da nação nem agentes de mais instabilidade", avisou.

Líderes da oposição na Câmara pediram ontem a Renan que devolva o projeto orçamentário ao Executivo ou que promova ajustes no texto com base "nos parâmetros macroeconômicos que reflitam a realidade e promovam a neutralização do déficit anunciado".

Valor econômico, v. 16 , n. 3833, 02/09/2015. Política, p. A7