Título: Tempo de diálogo
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 22/09/2011, Mundo, p. 26

Com a ONU dividida, Mahmud Abbas acena com paciência para que o Conselho de Segurança analise o pedido de ingresso de seu governo como o 194º membro.

O presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, cedeu parcialmente à pressão dos Estados Unidos e da Europa e acenou com a opção de dar "algum tempo" ao Conselho de Segurança das Nações Unidas para que analise o pedido de adesão da Palestina como 194º país-membro da ONU. A inflexão na estratégia da AP foi anunciada pouco antes de um encontro entre Abbas e o presidente dos EUA, Barack Obama, que terminou, na noite de ontem, sem declarações. O tema da soberania palestina dominou a abertura da Assembleia Geral da organização, em Nova York, e a expectativa dos representantes e observadores é pelos discursos que o presidente palestino e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, farão amanhã.

As divisões entre os líderes mundiais em torno do pedido palestino ficaram à mostra desde o discurso da presidente Dilma Rousseff, que abriu os debates ¿ privilégio que cabe ao Brasil, por tradição. Primeira mulher a inaugurar a Assembleia Geral, Dilma reiterou o reconhecimento do Estado palestino, anunciado no ano passado. "Chegou o momento de ter representada a Palestina a pleno título", declarou, emendando que apenas uma "Palestina livre e soberana" criará uma "paz duradoura no Oriente Médio".

Falando em seguida, Obama reafirmou a determinação de bloquear a admissão dos palestinos, sob o argumento de que o Estado desejado por eles só poderá surgir pela negociação com Israel. "Não há atalho para a paz", insistiu. "Estou convencido de que não há atalhos para pôr fim a esse conflito que se prolonga por décadas. A paz não é alcançada com declarações e resoluções na ONU. Se fosse fácil assim, já teria ocorrido", afirmou o anfitrião.

Washington se opôs à demanda palestina tão logo ela foi anunciada por Abbas, e ainda dias atrás antecipou um veto dos EUA, caso a adesão da palestina reúna os nove votos exigidos para passar no Conselho de Segurança (veja infográfico ao lado). Elogiado pelo governo israelense, Obama instou as duas partes a retomarem as negociações de paz, em um esforço para poupar-se de uma difícil opção diplomática. Em maio passado, o presidente defendeu um Estado palestino independente com as fronteiras baseadas nas de 1967, mas recuou depois de ter sido contestado por Netanyahu durante um encontro em plena Casa Branca.

Na opinião da analista Cristina Pecequilo, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o discurso de Obama foi também uma maneira de preservar o protagonismo norte-americano nas tentativas de negociação no Oriente Médio. "É uma tentativa de recolocar o debate de forma positiva para seu governo", explicou. O próprio Obama fez referência a essa participação ao lembrar que os EUA já desprenderam "muito esforço e tempo" na tentativa de chegar a uma solução. "Sei que muitos estão frustrados pela falta de progresso, mas ainda há a questão de como atingirmos esse objetivo", declarou Obama. "Paz é trabalho duro." O discurso foi acompanhado com aparente enfado por Abbas e recebeu duras críticas do Hamas, movimento islâmico que administra a Faixa de Gaza.

Buscando um tom intermediário, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, propôs, em seu discurso, um plano para a solução do conflito e também defendeu a retomada do diálogo direto entre israelenses e palestinos. Igualmente em posição desconfortável, no momento em que procura capitalizar o apoio às revoltas no mundo árabe, Sarkozy sugeriu que as conversações se reiniciem dentro de um mês, com a meta de alcançar em seis meses um entendimento sobre fronteiras e segurança, e um acordo definitivo no prazo de um ano. Até lá, segundo ele, a Palestina deveria obter o status de Estado observador, similar ao conferido ao Vaticano. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, afirmou que os palestinos merecem um Estado e Israel precisa de segurança, e afirmou que o impasse sobre a retomada das negociações precisa ser encerrado.