Partido da Mulher tem mais homens e é antiaborto

Cristian Klein 

02/09/2015

Depois do PSD, que afirmou em 2011 que não seria nem de "esquerda, nem de centro, nem de direita", o fenômeno da profusão de novas legendas no Brasil está prestes a dar à luz outra agremiação contraditória ou, no mínimo, surpreendente. O Partido da Mulher Brasileira (PMB) - em vias de obter o registro pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) - não é feminista. É um "partido de gênero". Não defende a legalização do aborto. E é composto por mais homens do que mulheres.

Com sede no Rio, junta-se à recente fornada de siglas que incluem o Partido Novo, formado por empresários e profissionais liberais, e o Rede Sustentabilidade, de Marina Silva. À espera da aprovação para participarem da eleição municipal, no ano que vem, os três elevarão para 35 o número de legendas no país.

"Somos o único que nasce sem pistolão", afirma a presidente do diretório mineiro Rosimere Machado de Jesus, 46 anos, assistente social, assim como a presidente nacional da legenda, Suêd Haidar.

Ambas negam que o PMB seja de direita, mas defendem bandeiras associadas ao campo conservador - ou que pelo menos não são progressistas sob o ponto de vista dos movimentos tradicionais liderados por mulheres. "Não somos feministas. Somos um partido de gênero, pela igualdade. O feminismo é muito radical", distingue Rosimere, que é a favor do aborto apenas nos casos já previstos em lei, como o estupro. "Sou totalmente contra. Já existe lei, mas não para engravidar e depois querer matar a criança", diz a dirigente.

Mais cautelosa em fixar a ideologia da legenda, Suêd Haidar, 57 anos, é a mentora do partido, fundado há sete anos. Também é contra a legalização do aborto. "Não podemos afirmar que alguém venha a matar as pessoas", defende. Mas é favorável ao casamento gay.

Maranhense, Suêd chegou ao Rio no fim dos anos 1970, com uma filha recém-nascida, de 27 dias. Sua mãe já estava na cidade e trabalhava de empregada doméstica. Sua primeira ocupação foi como faxineira. Mas uma tia de consideração havia lhe aconselhado a procurar Leonel Brizola, que, na volta do exílio, começava a fundar o PDT.

A tia - na verdade, prima de seu pai - era Maria José Aragão, líder do Partido Comunista do Brasil (PCB), no Maranhão. Com uma história de superação - para uma mulher, negra e muito pobre do começo do século passado - Maria formou-se em medicina na Universidade do Brasil e lutou contra a ditadura.

Com a dica, Suêd conheceu Brizola, o líder do PCB, Luís Carlos Prestes, e passou a militar em movimentos femininos e sociais. Na infância, entre 9 e 10 anos de idade, trabalhava numa pedreira com o irmão, quatro anos mais velho. Mesmo quebrando a mesma quantidade de pedras, ele ganhava mais. A diferença a revoltava.

No PMB, Suêd pretende lutar contra a desigualdade salarial em relação aos homens que exercem a mesma função. Outras bandeiras são a maior participação feminina na política e o combate à violência doméstica. No próprio partido, no entanto, conta, há mais homens do que mulheres, numa proporção de 60% a 40%. "Não vamos mudar isso do dia para a noite. É cultural. Mas vamos lutar por políticas para atrair as mulheres", diz. Por outro lado, dos 11 diretórios estaduais nove têm comando feminino. O estatuto do PMB estabelece que 70% dos cargos de direção da sigla sejam ocupados por mulheres.

Ainda assim, nas bases, a presença masculina é predominante. Em Minas Gerais, 70% são homens. "Vejo muitos homens indignados com a violência contra as mulheres", afirma a presidente da seção mineira.

Questionada se já foi vítima de agressão, Rosimere é enfática. "Eu? Não. Sempre fui muito independente. Eu não aceito. Quando a mulher é determinada, homem não faz gracinha. Não sou submissa. Sou exceção. E por sorte tenho uma pessoa que respeita o sexo feminino", diz, referindo-se ao marido, com quem tem quatro filhos, de 16, 17, 18 e 19 anos.

A dirigente do PMB é a favor da redução da maioridade penal. "Um garoto com 12 anos já pode ser pai. Pode usar uma arma. Com 16 anos, tem gente com cinco homicídios nas costas", afirma, embora defenda que "os meninos não sejam logo jogados nestas casas", pois precisam "ter uma primeira oportunidade". "Para mim é muito difícil. Vou estar sempre do lado do ser humano, mas também da vítima", equilibra-se.

Em relação à descriminalização das drogas, é bem mais decidida. "Sou totalmente contra. Vivo ajudando mães cujos filhos são dependentes. O casamento gay é diferente, não atrapalha a vida de ninguém. É liberdade. Droga é dependência. A pessoa faz coisas até contra a vontade dela. O gay não", diz.

Sobre a impopularidade de Dilma Rousseff - primeira mulher a presidir o país - afirma que o partido "não vai jogar pedra" porque sabe que "não é fácil mandar tendo um monte de homens ao redor". "Tem uma turma que fica com pena. Eu mesmo tenho dó. Vejo ela muito sozinha, muito magra, com muita olheira. A imprensa bate muito. Falo para o pessoal: não acreditem muito no que está no WhatsApp e no Facebook", diz a assistente social, que se identifica com Dilma. "Ela é mineira e eu também sou geniosa", afirma.

Valor econômico, v. 16 , n. 3833, 02/09/2015. Política, p. A10