O globo, n.30.021, 17/10/2015. País, p.11

Estado de emergência

Angra faz racionamento e proíbe lavagens de calçadas e carros. Em Niterói, vazão é reduzida

“Não somos cacique nem meteorologistas. Não sabemos o que vai acontecer se as chuvas não vierem.” Jorge Briard Presidente da Cedae

A prefeitura de Angra dos Reis, na Costa Verde, decretou ontem estado de emergência hídrica em todo o município pelo prazo de 180 dias. Está proibido lavar veículos, barcos, calçadas, frente de imóveis, ruas, quintais, telhados, paredes, calhas e garagens; regar jardins; encher ou esvaziar piscinas, além de outras situações que elevem o consumo.

No município de 180 mil habitantes, onde já está sendo feito racionamento, a proibição de lavagens poderá ser prorrogável. Quem descumprir as normas deverá ser multado e ter o abastecimento cortado. O presidente do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Angra (SAAE/ AR), Marcos Mafort, disse estar preocupado:

— Hoje, a situação está além de crítica, estamos em estado de emergência em várias partes do município, onde as principais barragens (Banqueta e Jacuecanga) trabalham com volume de cerca de 10% a 20% de sua capacidade, o que não atende à demanda dos bairros, principalmente locais mais altos e pontas de rede. Queremos pedir a compreensão de todos. Nossa equipe está usando todos os recursos possíveis para tentar minimizar os transtornos provocados por esta situação, que se agrava a cada dia. Enquanto a natureza não cooperar e a chuva não cair, a tendência é só piorar.

A estiagem que castiga a região Sudeste também afetou em cheio o sistema de distribuição de água Imunana- Laranjal, que abastece 1,6 milhão de pessoas em Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Ilha de Paquetá. A Cedae informou que colocou em operação uma terceira e última medida emergencial para garantir o abastecimento sem provocar racionamento. Ontem, durante duas horas, houve o desligamento de bombas na captação do Rio Guapi-Macacu, em Guapimirim. O objetivo é regularizar uma vazão mínima que permita abastecer as cidades. O plano de contingência denota o que muitos moradores da região sentem no cotidiano: o alerta vermelho foi ligado e, se o verão não trouxer chuvas, medidas de racionamento serão inevitáveis. Em Niterói, já falta água em bairros como Fonseca e Pendotiba. E a Ilha de Paquetá está sem abastecimento há uma semana.

Ontem, após reunião com o governador Luiz Fernando Pezão e o secretário da Casa Civil, Leonardo Spíndola, o presidente da Cedae, Jorge Briard, disse ao GLOBO que todas as soluções emergenciais para o sistema Imunana-Laranjal já foram tomadas. Desde setembro, a vazão do Rio Guapi-Macacu chegou a 4,8 mil litros por segundo, o que representa uma redução de 31% em relação à vazão considerada ideal para o sistema: 7 mil litros por segundo. A falta de chuvas fez com que o sistema chegasse ao limite.

— O sistema hídrico do Leste (Niterói e São Gonçalo) não tem reservação, ao contrário do Paraíba do Sul. Essa característica, somada à atuação do homem na destruição de matas ciliares e florestas, colocou essa bacia numa situação preocupante. Ela é extremamente dependente das chuvas — disse Briard. — Então paramos de captar água durante duas horas para garantir que o nível do rio se eleve e possamos abastecer as cidades no restante do dia. Não somos cacique nem meteorologistas. Não sabemos o que vai acontecer se as chuvas não vierem.

A solução definitiva para o problema de abastecimento na região, acrescentou Briard, é a construção da barragem de Guapiaçu. A proposta já foi licitada, mas o projeto foi engavetado após muita polêmica. Agricultores são contrários à medida, pois a barragem alagaria uma área de 5 mil hectares em Cachoeiras de Macacu. Em maio de 2014, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) suspendeu o requerimento de licença ambiental prévia ao empreendimento. A Carioca Engenharia seria a responsável pela obra, estimada em R$ 350 milhões.

Embora negue a existência de racionamento na região, o presidente da Cedae não descartou que isso possa acontecer em breve, já que a medida dependerá da quantidade de chuvas. Ele garantiu, porém, que não há prejuízos à qualidade das águas.

— Conseguimos manter a qualidade que sai da Estação de Laranjal (em São Gonçalo).

SITUAÇÃO PREOCUPANTE

De acordo com o superintendente da concessionária Águas de Niterói, Nelson Gomes, a Cedae reduziu em 25% a vazão de água para a cidade. Gomes admite que a situação é preocupante, mas descarta o racionamento.

— Estamos distribuindo água, mas não com a mesma qualidade. É lógico que as regiões mais altas e as partes finais de rede são mais afetadas.

Ele disse ainda esperar que a previsão de chuvas para a próxima quinta-feira se confirme para afastar o risco de falta d’água:

— A situação está sob controle, mas, se não chover, pode piorar. As pessoas devem economizar água o máximo possível — disse Gomes.

Para o coordenador do Laboratório de Hidrologia da Coppe, Paulo Canedo, o desligamento de bombas pela Cedae na captação de água mostra que o quadro é grave.

— Se a Cedae não deixa o sistema de distribuição captar água na íntegra, isso é racionamento — diz o professor, que também defende a construção da barragem de Guapiaçu.

É ‘ primaverão’

Capital registra a terceira maior temperatura em cem anos de medições

“Por causa de um ciclone, deve haver a elevação do mar. No domingo, as ondas podem atingir entre 2 e 2,5 metros” Bianca Lobo Previsora do Climatempo

Mulher pega sol no desértico Piscinão de Ramos, esvaziado para manutenção. O Rio teve ontem temperatura de 42,8 graus, a 3ª mais alta da História. A crise hídrica fez Angra dos Reis decretar emergência, e os moradores não podem lavar carros ou molhar o jardim. Que calorão! A frase foi recorrente ontem nas ruas da cidade. E não é para menos. A dois meses do início do verão ( a estação começa oficialmente em 21 de dezembro), os cariocas tiveram de conviver com um novo recorde de calor : em Santa Cruz, o Instituto Nacional de Meteorologia ( InMet) registrou 42,8 graus às 15h. Além de recorde do ano, foi a temperatura mais alta já aferida pelo instituto em todas as primaveras. E mais: é a terceira no ranking histórico do InMet num período de cem anos.

MARCELO CARNAVALSob o céu inclemente. Uma mulher se protege do sol com um guarda-chuva na Praça da Bandeira, onde relógio digital marcava 43 graus: segundo meteorologistas, o dia de ontem foi o mais quente já registrado durante a primavera

— Só tivemos temperaturas maiores em 26 de dezembro de 2012 (43,2 graus, em Santa Cruz) e 14 de janeiro de 1984 (43,1 graus, em Bangu). Nesses dois dias, estávamos no verão — conta a meteorologista Marlene Leal, do InMet.

Por volta de meio-dia de ontem, o InMet já constatava 42,4 graus na Marambaia. Mas termômetros digitais do Centro da cidade chegaram a marcar 50 graus, no mesmo horário. Com o forte calor, apesar de ser uma sexta-feira, muita gente aproveitou para ir à praia. No Arpoador, a areia foi tomada por banhistas e guarda-sóis.

Anteontem, a máxima já tinha batido o recorde — até então — do ano: 42,1 graus. Segundo a meteorologia, uma massa de ar quente estacionada sobre a cidade foi o motivo de tanto calor.

SENSAÇÃO TÉRMICA MAIS ESTÁVEL

A sensação térmica, no entanto, afirma Marlene Leal, não foi muito superior à temperatura medida pelos equipamentos, ficando em torno dos 43 graus. Isso porque a umidade do ar estava baixa. A previsora Bianca Lobo, do Instituto Climatempo, explica que, muitas vezes, a primavera tem temperaturas mais altas que as do verão:

— Na primavera, predomina o ar seco, e a sensação térmica é semelhante à temperatura. No verão, formam-se nuvens mais cedo, e o sol não bate diretamente na terra. A temperatura pode não ser tão alta quanto a da primavera, mas a umidade do ar é elevada. Por isso, a sensação térmica dispara. Atinge 45, 50 graus.

O calorão não tende a perdurar neste fim de semana. Os meteorologistas preveem que a frente fria que estava na Região Sul, se deslocando para o oceano, chegará ao Sudeste hoje. A expectativa é que haja aumento da nebulosidade e pancadas de chuva. A temperatura deve cair. Também são esperados ventos. E há risco de ressaca.

— Por causa de um ciclone, deve haver a elevação do mar. No domingo, as ondas podem atingir entre 2 e 2,5 metros — diz Bianca.

MAIS UMA HORA DE LAZER

Com o sol a pino ou não, o início do horário de verão traz a reboque a prorrogação em uma hora das áreas de lazer em logradouros públicos. A partir de hoje, e enquanto os relógios estiverem adiantados em uma hora, as mais de 1.200 ruas e avenidas da cidade regulamentadas, que fecham para lazer aos domingos e feriados, funcionarão de 6h às 19h. A Secretaria municipal de Transportes publicou ontem um comunicado tratando da extensão do horário no Diário Oficial, uma prática que acontece desde 2006.

Na Zona Sul, as principais vias que ficarão abertas ao público, nas pistas junto à orla até 19h são: Avenida Atlântica, no trecho entre a Rua Francisco Otaviano e Avenida Prado Júnior, em Copacabana; Avenida Delfim Moreira, no Leblon; Avenida Vieira Souto, em Ipanema; além do Aterro do Flamengo (Avenida Infante Dom Henrique), no trecho entre o retorno em frente à Praça Cuautemoque e Trevo dos Estudantes.

Além da ampliação do horário nas ruas com áreas de lazer, a CET-Rio vai estender o funcionamento das faixas reversíveis até as 19h. A medida vale para as pistas junto aos edifícios das avenidas Vieira Souto e Avenida Delfim Moreira. A mudança também se estende à Avenida Atlântica, entre a Rua Joaquim Nabuco e a Avenida Princesa Isabel, e a toda extensão da Rua Joaquim Nabuco.