Congresso pode impedir aumento de imposto por decreto

Thiago Resende 

10/09/2015

Uma medida legislativa poderá impedir que a presidente Dilma Rousseff eleve alíquotas de tributos por decreto. Deputados e senadores da oposição e até do PDT na Câmara, que recentemente saiu da base aliada do governo para se declarar independente, defenderam a possibilidade de um decreto legislativo sustar os efeitos do ato do Palácio do Planalto.

O Ministério da Fazenda estuda elevar alíquotas de tributos que não precisariam do aval do Congresso Nacional. A previsão de déficit para o próximo ano é de R$ 30,5 bilhões.

Um decreto de Dilma é suficiente para aumentar a Cide (contribuição sobre combustíveis) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Só a primeira medida poderia render R$ 15 bilhões por ano para a União e R$ 5 bilhões a Estados e municípios. A proposta, porém, não é consenso no governo porque resultaria numa alavancada nos preços.

Presidente nacional do PSDB, o senador Aécio Neves (MG), disse que adotar essas medidas por meio de decreto é inconstitucional. Na Câmara, o líder do PPS, Rubens Bueno (PR), já informou que, se o ato de Dilma for publicado, vai apresentar um projeto de decreto legislativo para derrubar a alta de tributos.

O líder do PDT na Câmara, André Figueiredo (CE), também frisou que a única saída seria o Congresso anular a decisão do governo aprovando um projeto como o citado por Bueno.

O governo diz ter alternativas para tentar reverter o déficit fiscal. "Estamos seguros que vamos ajustar o Orçamento de 2016", disse o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS). Uma das ideias é aumentar o Imposto de Renda. Mas isso depende de aprovação no Congresso.

Segundo ele, governo e empresários discutem como tributar alguns setores sem efeitos "no processo inflacionário" e pode ser proposta uma alta de impostos "de transição curta" - vigoraria por pouco tempo para ajudar no enfrentamento da dificuldade fiscal.

Também está em estudo uma revisão nos gastos federais dos próximos anos. A equipe de Dilma está olhando todos os programas do Executivo, o que não necessariamente envolve apenas projetos sociais, informou o petista. Outra medida em análise é adiar novas obras e terminar as que já estão em execução.

Para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o governo está "se autodestruindo" ao aventar possíveis aumentos de tributos sem concretizar isso no Orçamento. "Você está fazendo Maquiavel ao contrário. Está fazendo mal aos poucos [...] É de uma falta de inteligência inominável", comentou Cunha.

Para Cunha, propor uma elevação de impostos, mantendo a previsão de uma despesa adicional de R$ 15 bilhões com reajuste de servidores é passar para a sociedade o custo da ineficiência da máquina pública.

Ontem, em debate com deputados, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que o reequilíbrio fiscal envolve várias iniciativas, como o realinhamento de preços e das taxas de câmbio; redução de subsídios; aumento de receitas, como a revisão feita em várias desonerações; e, sobretudo, um controle do crescimento do gasto. "Envolve também outras medidas podem ser tomadas se forem necessárias", frisou.

PMDB diverge sobre proposta para elevar tributos

Thiago Resende, Raquel Ulhôa e Andrea Jubé 

O PMDB não entra num consenso sobre apoiar eventual aumento de tributos para solucionar o problema orçamentário do governo. Parlamentares rejeitam qualquer medida nesse sentido. Ministros e governadores estaduais defendem a alta de impostos. Aliados ao Palácio do Planalto acreditam ainda que, com o retorno do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ao Brasil, uma negociação direta com congressistas do PMDB pode colocar o partido como protagonista.

Na Câmara dos Deputados e também no Senado, pemedebistas exigem que o ajuste nas contas públicas - cuja previsão é um déficit de R$ 30,5 bilhões no próximo ano - seja por meio de redução de gastos. "A elevação da carga tributária é uma coisa que mais adiante pode ser discutida, mas há uma preliminar, que é o corte de despesa e a eficiência do gasto público", disse o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (PMDB-AL).

A cúpula do PMDB reuniu-se na terça-feira em jantar oferecido pelo presidente nacional do partido, o vice-presidente da República, Michel Temer. Além de Renan, foram convidados governadores e lideranças da sigla e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que também se posicionou contra a alta tributária. Alinhado, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) declarou: "Todo aumento de imposto tem que ser calibrado. Há também impostos inflacionários. Tem que se estudar com muita calma".

Com dificuldades financeiras, os governadores do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e de Alagoas, Renan Filho, defenderam a recriação da CPMF, seguidos pelo governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, que sugeriu uma "reforma estrutural" dos Estados em nome do "reequilíbrio fiscal".

O PMDB, contudo, não vai endossar a defesa pelo aumento de impostos. O discurso oficial da legenda será de que iniciativa nesse sentido cabe ao Executivo, e a disposição do Legislativo é combater a sobrecarga tributária. "Há uma brutal queda de arrecadação. A solução deve ser feita por corte de gasto, sobretudo, na União", relatou o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ). Não cabe à sigla nem ao Congresso conduzir o debate para resolver o problema fiscal do país, acrescentou.

Perguntado sobre a possibilidade de aumento da Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico (Cide) - que Temer chegou a cogitar propor, mas recuou após a repercussão negativa -, Renan afirmou que a legenda não tem posição sobre a questão, mas deixou claro que rejeita discutir o assunto antes do corte de gastos pelo governo.

Com o recuo do vice-presidente, a manifestação favorável ao aumento da Cide, bem como à recriação da CPMF, coube aos ministros da Agricultura, Kátia Abreu, e dos Portos, Edinho Araújo.

Contrário às teses, Cunha interveio e reforçou que o Congresso não está disposto a aprovar aumento de impostos. Quanto à Cide, disse que é "inflacionária". Sobre a CPMF, ressaltou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com prestígio político, não conseguiu aprovar a prorrogação da CPMF por mais quatro anos em 2007, quanto mais Dilma sem nenhum respaldo popular.

Nem tudo foi discórdia no jantar. A cúpula do PMDB acredita na necessidade de uma reforma da Previdência Social. Além disso, também ficou combinado que Cunha vai pautar um pedido do partido para a Câmara discutir logo um projeto que muda o modelo de exploração do petróleo - voltaria o regime de concessões, afastando o de partilha. O assunto foi iniciado por Hartung.

O modelo de concessões deu certo por quase duas décadas, enquanto que o de partilha, talvez pela conjuntura nacional e internacional, se mostrou ineficaz e paralisou a indústria do petróleo, argumentou Picciani, cujo Estado - o Rio de Janeiro - também se beneficiaria. Segundo ele, o regime de concessões atrairia investimentos e pode representar receita imediata, como outorgas, para o governo federal e para Estados e municípios.

Valor econômico, v. 16 , n. 3838, 10/09/2015. Política, p. A5