O globo, n.30.014, 10/10/2015. País, p.6

Base e oposição já se articulam para sucessão de Eduardo Cunha

Com comando enfraquecido no PMDB, Picciani é preferido do PT

Com o cerco se fechando sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), devido aos indícios cada vez mais fortes de que ele teria recebido propina em contas secretas na Suíça, os partidos começam a debater o perfil do possível sucessor ao principal cargo da Casa. Apesar de muitos acreditarem que Cunha se manterá no cargo até o limite de suas forças, as movimentações se intensificaram na última semana e, nas bolsas de apostas, já traçam pelos corredores perfis para o novo presidente da Câmara.

Entre os deputados da oposição e de diversos partidos da base, há uma ideia de que o sucessor de Cunha terá de manter o trabalho de “independência” e afirmação de poder em relação ao governo. Ou seja, mesmo que pertença a um partido aliado ao Palácio do Planalto, deve se comprometer a não se submeter às vontades do governo Dilma Rousseff. Caso contrário, os partidos da base aliada, que vêm dando sucessivas demonstrações de força em relação ao Executivo, não chancelarão a escolha.

Um pensamento que é compartilhado por diversos deputados é sobre a influência que Cunha terá na sucessão. Mesmo que saia fragilizado da presidência da Casa após as denúncias de corrupção, será um eleitor importante por manter um amplo espectro de deputados sob sua tutela.

— Eduardo, se eventualmente renunciar, ainda vai ter muita influência na Casa. Será o maior eleitor da Casa. E o próximo presidente terá de ter perfil parecido com o dele, que valorize a Câmara e prestigie os setores. Se Eduardo disser que esse vai fazer o que ele faz, esse apoio dele vai ser fundamental. Ninguém se elege sem isso — afirma um peemedebista próximo a Cunha.

Um nome que vem sendo falado por alguns setores é o do líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), que inclusive já revelou seu desejo de ocupar a presidência da Câmara e, recentemente, disse se sentir preparado para assumir o posto. O peemedebista, no entanto, sofre resistência de setores ligados a Eduardo Cunha e à oposição por ter se tornado aliado de primeira hora do Palácio do Planalto.

Deputados da oposição e da base dizem que, apesar de o líder do PMDB, por comandar o maior partido, ser um candidato natural à presidência da Câmara, Picciani está enfraquecido pois não conseguiu manter o controle sobre sua própria bancada de 66 deputados, que conta hoje com cerca de 25 deputados dissidentes, que se manifestaram contrariamente às suas negociações com o governo no âmbito da reforma ministerial. Há também o fato de Picciani ter perdido o controle do bloco governista da maioria na Câmara, que tinha 149 deputados e era composto por 6 partidos.

Ele prefere não se manifestar sobre o tema: — Eu tô fora dessa discussão. Já no PT, o nome de Picciani é o que ganha mais força. Há no partido um consenso de que foi um “erro” ter brigado no início do ano para emplacar um candidato do PT e boa parte dos petistas agora acredita ser mais viável apoiar um nome de uma legenda aliada, que esteja afinado com o governo.

— A situação dele está ficando insustentável. Cunha mentiu, quebrou o decoro. A saída dele vai ser questão de dias. Do nosso lado, Picciani passa a ser o candidato mais forte da base de governo — afirma um petista.

O deputado Pauderney Avelino, líder da oposição no Congresso (DEM-AM), externa a posição de muitos oposicionistas, mas também de diversos integrantes da base, com exceção ao PT:

— Picciani não vale mais que uma nota de 3 reais. Ele pode ter apoio do PT, mas não tem do resto — afirma.

Para os deputados que defendem um nome com “estatura moral” e conhecimento do Congresso, surgem dois nomes: Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Miro Teixeira (Rede-RJ). Conta a favor de ambos o fato de terem postura independente em relação ao governo e ampla experiência política. Muitos apontam, porém, que o fato de Miro estar em um partido nanico pode inviabilizar seu nome.

NO PÁREO, ALIADOS DE CUNHA

Contra Jarbas, pesa o fato de se confrontar publicamente com Cunha. Em mais de uma ocasião, Jarbas criticou a condução de Cunha à frente da Câmara e, agora, passou a defender abertamente seu afastamento do cargo.

— Jarbas tem um pensamento político sofisticado, é um dos maiores quadros nessa legislatura. É preciso um quadro que tenha essa força moral e Jarbas cumpre esse papel. Mas, tem que ver se Eduardo toparia — afirma um deputado da oposição.

Outros nomes que aparecem nas bolsas de aposta são os dos concorrentes de Cunha na eleição de fevereiro, os deputados Júlio Delgado (PSB-MG) e Arlindo Chinaglia (PT-SP). Chinaglia, no entanto, sofre resistência pelo fato de ser do PT. Pesa contra Júlio Delgado o fato de ser investigado na operação Lava-Jato. Há um entendimento disseminado entre os deputados de que é preciso evitar que nomes comprometidos na investigação sejam alçados à presidência.

Há também especulações sobre nomes ligados a Cunha, como o do primeiro secretário da Mesa, Beto Mansur (PRB-SP), ou o de Osmar Serraglio, relator da CPI dos Correios. Como contraponto a Picciani, fala-se em lançar a candidatura de Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), que perdeu por um voto a disputa pela liderança do PMDB.