Título: Dois votos e um veto
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 21/09/2011, Mundo, p. 16
Chanceler palestino descarta diálogo com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e garante estar muito próximo de obter a maioria absoluta no Conselho de Segurança das Nações Unidas. A expectativa é de que os Estados Unidos barrem a proposta
Étarde demais para um diálogo com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. "Desse encontro, nada sairá agora", afirmou à agência de notícias EFE o chanceler palestino, Riyad Al-Malki. Ele sugeriu que o premiê demonstre vontade de negociar, "aceitando primeiro as fronteiras de 1967 e interrompendo por completo os assentamentos (judaicos)". De acordo com autoridades de Ramallah (Cisjordânia) ¿ sede do governo do presidente Mahmud Abbas ¿, o reconhecimento do Estado palestino já contaria com o aval de sete membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O próprio Al-Malki garantiu à rádio Voz da Palestina que a Organização da Cooperação Islâmica mantém negociações intensas com Turquia, Sérvia e Bósnia-Herzegóvina, na tentativa de convencê-las a aderir à causa e obter a maioria absoluta de nove votos a favor. O chanceler assegura que o Gabão ¿ membro não permanente do Conselho ¿ resolveu apoiar a demanda. O jornal israelense Jerusalem Post informou, na noite de ontem, que o ministro da Defesa, Ehud Barak, conseguiu dissuadir o presidente da Nigéria, Goodluck Jonathan, de avalizar os palestinos.
"Nós não precisamos dos nove votos, porque os Estados Unidos anunciaram que usarão o poder de veto", afirmou ao Correio, pela internet, Majed Abusalama, integrante do Comitê Internacional pelo Reconhecimento do Estado Palestino. "Desejamos ao menos atuar como observadores no Conselho de Segurança. Isso reforçará nossas posições com ferramentas pacíficas para combater o governo israelense, e o obrigará a implementar as negociações de paz e o direito internacional."
Ante a postura irredutível de Abbas, ministros israelenses voltaram a ameaçar com sanções econômicas e políticas ¿ uma tentativa desesperada de barrar a ofensiva diplomática palestina em Nova York. O chanceler nacionalista Avigdor Lieberman advertiu sobre as "consequências duras e graves" e acenou com o provável cancelamento de todos os acordos "fechados" com os palestinos, incluindo o repasse mensal de 60 milhões de euros a Ramallah, referentes ao reembolso das taxas alfandegárias e do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) a bens importados.
Sem o montante, a Autoridade Palestina não conseguirá cumprir com o pagamento de mais de 150 mil funcionários. "Os israelenses não tornarão nossa vida pior do que já é. Os palestinos têm todos os problemas e a injustiça nunca antes experimentados pelo mundo", disse Abusalama.
Complemento Husam Zomlot, porta-voz da Autoridade Palestina e representante da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) na ONU, admitiu ao jornal Haaretz que seu governo está pronto para considerar "qualquer proposta séria e crível" apresentada por Netanyahu. "Ainda que as negociações comecem imediatamente, ainda iremos às Nações Unidas para buscar o reconhecimento do Estado Palestino, porque vemos esses caminhos como complementares, e não contraditórios", explicou. "Tivemos 20 anos suficientes de acordos não implementados", emendou.
Conselheiro político da Embaixada de Israel em Brasília, Leo Vinovezky espera que os países "democráticos" se alinhem ao Estado judaico. "Nossa expectativa é de que eles entendam que não é possível decidir uma questão de fronteiras e de soberania sem diálogo. Ainda mais quando enfrentamos ameaças terroristas diárias", observa. Vinovezky critica o fato de os palestinos terem se recusado a aceitar a resolução nº 181 (sobre a partilha da Palestina). "Ali, começou uma onda de violência que perdura até hoje. Somos sempre nós que temos que reconhecer os palestinos", ironiza o diplomata.
Para Richard Falk, relator especial para a Palestina no Conselho dos Direitos Humanos da ONU e especialista em direito internacional pela Universidade de Princeton, o veto dos EUA pode bloquear as "legítimas" aspirações palestinas. "Isso reforçará o antiamericanismo no Oriente Médio", prevê. Por e-mail, ele afirmou que o impacto da medida dependerá da reação dos palestinos "que vivem sob ocupação" e em países árabes vizinhos. "Nos Estados Unidos, haverá um efeito, já que a maior parte da opinião pública apoia a adesão palestina à ONU. Tem havido uma opinião crescente de que Israel exerce demasiada influência sobre a política externa norte-americana", comentou à reportagem.
Críticas à "política perigosa" de Obama Rick Perry, aspirante à candidatura republicana à Presidência dos EUA, classificou a política de Barack Obama de "apaziguamento" dos palestinos como "ingênua, arrogante, desorientada e perigosa". Em sua primeira declaração sobre política externa desde que se tornou o principal pré-candidato do Partido Republicano, Perry insistiu que o governo dos EUA deveria cortar seus fundos para as Nações Unidas e os territórios palestinos. Além disso, defendeu fechar os escritórios da Autoridade Palestina em Washington caso a ONU reconheça um Estado palestino e o admita como membro de pleno direito.