Mudança de foco

Domingos Zaparolli 

11/09/2015

A nova realidade do mercado global de minérios - após uma queda acentuada dos preços internacionais - está levando as mineradoras a rever estratégias de negócios em busca de competitividade. "Há uma retração das receitas das empresas. O momento é de inovar com foco em eficiência dos processos, redução de custos e do consumo de recursos naturais", afirma José Fernando Coura, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).

Entre 2011 e 2014 o valor da produção mineral brasileira caiu 24,5%, para US$ 40 bilhões. A estimativa do Ibram para 2015 é que esse valor recue para US$ 38 bilhões. A projeção de embarque de minério de ferro é de 345 milhões de toneladas, 4,4% acima de 2013. No entanto os preços internacionais recuaram quase 70% desde 2011, para cerca de US$ 53 a tonelada, preço de quem oferece o produto com alto teor de pureza, acima de 60% de ferro.

"Há um excesso de capacidade de produção no mundo e muitas incertezas em relação à demanda, principalmente depois que a China reduziu seu ritmo de crescimento e passou a dedicar seus esforços mais para o consumo do que infraestrutura", diz o consultor Afonso Sartorio, da EY.

Fernando Coura diz que um dos impactos mais visíveis desse novo padrão de preços internacionais é uma redução de novos projetos minerais. No início de 2014, o Ibram projetou em US$ 53,6 bilhões os investimentos até 2018. O número agora parece otimista. "Desde o segundo semestre de 2014 observamos adiamentos de alguns projetos ou mesmo cancelamentos", afirma.

Afonso Sartorio diz que o foco das mineradoras mudou. Na última década, a atenção estava toda em aumento de capacidade. "Agora a prioridade é ganho de produtividade", diz.

A Vale adotou uma estratégia de ganho de competitividade combinando aumento de capacidade e redução de custos. Neste ano, a companhia reduziu o seu custo por tonelada de minério entregue na China de US$ 43,4 para US$ 39,1 e tem como meta chegar a US$ 37. O diretor financeiro Luciano Siani, em uma apresentação na BM&F Bovespa em agosto, afirmou que a Vale reduziu despesas operacionais, logísticas e financeiras, ao mesmo tempo em que otimizou seus planos de lavra e melhorou a produtividade de suas unidades.

Em Minas Gerais a companhia investe US$ 5,5 bilhões em um projeto que prevê a readequação de quatro unidades de beneficiamento na região de Itabira, que vai permitir à Vale reaproveitar minério com teor de ferro inferior a 40%, que foram acumulados como resíduo em quatro décadas de exploração mineral.

No Pará, a Vale desenvolve o maior projeto de mineração no mundo, o S11D, na Serra Sul de Carajás, que irá agregar 90 milhões de toneladas por ano à produção da empresa, estimada em 340 milhões de toneladas em 2015. O teor médio de ferro é de 66,48%. A nova mina está programada para entrar em operação no segundo semestre de 2016, após investimentos que superam US$ 16 bilhões.

Ganho de escala e de produtividade também é a estratégia da Samarco, segundo o diretor comercial Roberto Carvalho. A companhia controlada pela BHP Billiton e pela Vale é produtora de pelotas de minério de ferro obtidas a partir do beneficiamento de minério de baixo teor. Em 2014 a companhia inaugurou sua quarta unidade de pelotização, em Germano (MG). O investimento de R$ 6,4 bilhões aumentou a capacidade total para 30,5 milhões de toneladas por ano. Segundo Carvalho, a Samarco trabalha em capacidade plena, apesar da crise.

A empresa, diz o executivo, foi concebida nos anos 1970 para operar com baixos custos. Nos últimos anos, porém, a Samarco trabalha para aumentar sua eficiência operacional. "Adotamos metodologias consagradas de organização produtiva, como Lean, Seis Sigma e Kaizen, e criamos iniciativas próprias, como o Campo de Ideias, que estimula a participação da equipe na busca de soluções", diz. Apenas em 2014 ações realizadas a partir dessas metodologias, informa o executivo, proporcionaram uma economia de R$ 287 milhões.

No Brasil, a Anglo American atua há quatro décadas com níquel, nióbio e fosfato, em 2007 diversificou seu portfólio adquirindo um projeto de minério de ferro do empresário Eike Batista. O projeto Minas-Rio tem reservas com 45 anos de vida útil e envolve extração e beneficiamento nas cidades mineiras de Conceição de Mato Dentro e Alvorada, um mineroduto de 529 km até São João da Barra (RJ) e um terminal no Porto de Açu. Os embarques começaram em outubro de 2014, após investimentos de US$ 8,4 bilhões. A capacidade plena, 26,5 milhões de toneladas por ano, está prevista para ser alcançada no segundo semestre de 2016.

Paulo Castellari, presidente da divisão de minério de ferro, diz que num momento de queda dos preços internacionais, fornecedores que entregam alta qualidade e preço competitivo são valorizados. Depois de beneficiado, o minério da Minas-Rio tem 69% de teor de ferro e pouca impureza. No momento, o custo FOB é de US$ 28 a tonelada, por volta de US$ 41 na China. "Já é suficiente para gerar caixa, mas a meta é reduzir os custos em seis meses", diz.

Para isso, uma das apostas é no modelo operacional com base no Lean, sistema de produção enxuta, que a Anglo American adaptou para o segmento mineral e chega ao Brasil no Minas-Rio, aliado a um programa de qualificação dos dois mil funcionários envolvidos no processo. "Já registramos ganhos de eficiência no trabalho de 30% com o sistema."

No segmento de metais não-ferrosos, a busca por eficiência e redução de custos também é intensa. A Votorantim Metais que tem negócios de bauxita (e alumínio), zinco e níquel estabeleceu como meta estar entre as mineradoras de menor custo operacional no mundo até 2025 e desenvolver processos que a coloquem como referência de sustentabilidade. "São as condições que garantem a sobrevivência de uma companhia no longo prazo, independentemente da flutuação dos preços, que é cíclica", diz Alexandre Gomes, diretor de engenharia, tecnologia e inovação.

Entre 2013 e 2014 a companhia investiu R$ 24 milhões em projetos de P&D com um retorno de R$ 113 milhões.

Investimentos ainda não se transformaram em produtividade

Roberto Rockmann 

11/09/2015

Os investimentos bilionários realizados pelas mineradoras nos últimos cinco anos no mundo ainda não resultaram em aumento de produtividade. Ao contrário, houve na média uma queda de 2% por ano no período, sendo que no Brasil, o recuo foi ainda maior, chegando a 4,9%. O resultado se deu pelos investimentos, que elevaram a oferta além da demanda.

"O problema estrutural é de oferta, mas estamos no ponto de inflexão, porque esses investimentos levam em média cinco anos para se transformar em ganhos de produtividade e de aumento de valor agregado", diz Clau Sgarzela, diretor da Accenture, que realizou um estudo sobre o assunto, a ser divulgado e detalhado no Congresso de Mineração. Para ele, a produtividade no Brasil pode manter-se estável a partir de agora. Com isso, em dez anos, poderia trazer ganhos de US$ 80 bilhões em valor adicionado à produção.

"Hoje o Brasil tem um parque mais evoluído e poderá extrair mais com menos", afirma. O estudo avaliou indicadores de cinco grandes produtores de metais: Brasil, Austrália, Indonésia, Canadá e Estados Unidos. O único a apresentar alta da produtividade foi o país asiático, em razão de seu parque produtivo ser um dos mais atrasados existentes entre os grandes produtores.

A segunda etapa do estudo deverá ser concluída em 2016. Vai focar em cada um dos metais, aprofundando a análise da competitividade e inovação em cada cadeia. Sgarzela aponta que o Brasil tem muito a ganhar com inovação e produtividade, assim como a indústria de mineração mundial, que é seguidora de outros ramos da indústria do que uma criadora de novas soluções tecnológicas.

"Vemos drones fazendo a inspeção de correias de máquinas no meio da Amazônia, locomotivas sendo conduzidas de centros de controle a mais de mil quilômetros de distância. Mas isso ainda é tímido, é pontual, terá de ganhar mais escala", observa. O desafio, diz, é como desenvolver em larga escala essas novas tecnologias. "Aí, sim, será possível dar um salto de produtividade estrutural."

Uma das barreiras é que as mineradoras atuam mais como observadoras do que ocorre em outros segmentos da indústria e da área de serviços, mantendo uma abordagem conservadora. "A velocidade de adoção da inovação é mais lenta, porque não se tem uma postura de criação de novas soluções, se adotam ideias de outros ramos. Será preciso uma mudança de paradigma, a mineração tem de ter um novo olhar", destaca.

Nesse caso, é preciso olhar as indústrias do futuro. "Uma manutenção da indústria ferroviária é feita sobre trens que podem parar, mas na indústria aeronáutica a manutenção é feita em jatos que transportam 300 pessoas, voam várias vezes por dia e não podem ter problemas", aponta o executivo. Telemetria é usada em grandes caminhões que operam nas minas fora da estrada, mas esse processo ainda é disperso. "As empresas terão de usar os dados de forma analítica e mensurar melhor a produtividade, para integrar ainda mais a logística."

Outro gargalo a ser superado é a gestão sistêmica da exploração da lavra. Na operação de uma mina, existem dificuldades para que sua operação cumpra o planejado. Além de chuvas, ventos, que podem atrasar o trabalho, há outras questões, como problemas ambientais ou trabalhistas. "Precisa haver uma conexão maior entre as áreas e a convergência de informações ", diz Sgarzela.

Valor econômico, v. 16 , n. 3839, 11/09/2015. Especial Mineração, p. F1