China avisa que pode acionar OMC contra o Brasil

Assis Moreira 

07/10/2015

A China avisou ontem ao Brasil que não aceitará que, a partir de 11 de dezembro de 2016, o governo brasileiro continue sem reconhecer o país como economia de mercado e adotando metodologia flexível para impor sobretaxas contra produtos chineses.

Em reunião bilateral realizada em Istambul, o vice-ministro de Comércio da China, Wang Shouwen, deixou claro que, se o Brasil não reconhecer Pequim como economia de mercado a partir daquela data, Pequim acionará o Orgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio (OMC), assim como pretende fazer em relação a qualquer outro país com a mesma posição.

O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), Fernando de Magalhães Furlan, sugeriu a Wang que setores produtivos da China começassem a se relacionar mais com a indústria brasileira, para eventualmente convencê-la de que funcionam como economia de mercado.

A cobrança chinesa ilustra a dificuldade que setores da indústria brasileira, como têxteis, máquinas, calçados, automotivo e siderúrgico, terão dentro de pouco mais de um ano para se proteger da concorrência chinesa.

Em 2001, quando Pequim entrou na OMC, economias desenvolvidas, como EUA, União Europeia e Japão, se recusaram a reconhecer a China como economia de mercado. O argumento foi o de que os preços domésticos chineses eram estabelecidos por políticas e agências do governo e não pelas forças do mercado.

O governo chinês teve então de se submeter a uma cláusula de adesão com duração de 15 anos, pela qual os parceiros podiam usar metodologia mais flexível para calcular dumping contra produtos chineses. No comércio internacional, o dumping ocorre quando um país exporta mercadoria com preço abaixo do custo de produção, ou do preço interno.

Em 2004, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, numa visita a Pequim, aceitou reconhecer a China como economia de mercado. O compromisso jamais foi cumprido, apesar das cobranças da segunda maior economia do mundo. Hoje, cerca de 35% das sobretaxas antidumping no Brasil são aplicadas contra mercadorias chinesas, acusadas de terem preços deslealmente baixos.

Nos encontros bilaterais à margem da reunião de ministros de comércio do G-20, ontem na capital turca, representantes dos EUA disseram aos brasileiros que não vão reconhecer automaticamente a China como economia de mercado, e acham que Pequim de fato poderá abrir uma disputa na OMC. Tanto americanos como europeus acham não há como dar o status automaticamente a Pequim. O texto da cláusula que acaba no ano que vem é tema de debates polêmicos entre advogados.

Durante a reunião ministerial do G-20, Furlan afirmou que o Brasil está implementando facilitação de comércio e que até 2017 será reduzido em 40% a demora para autorização de operações de exportação e importação. Segundo o secretário, o prazo para obter a documentação para exportar cairá de 12 para 8 dias, e de importar de 14 para 10 dias.

Furlan faz parte da delegação brasileira em Istambul, integrada também por Marcio Cozendey, subsecretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty, Marcos Galvão, embaixador do Brasil na OMC, e Renato Resende, representante da Secretaria de Comércio Exterior.

Na reunião do G-20, o Brasil sugeriu que os países do grupo - as maiores economias desenvolvidas e emergentes - se comprometam no encontro dos líderes, em novembro, a não compensar a queda dos preços de commodities com a concessão de mais subsídios agrícolas, para não causar mais distorções no comércio internacional.

Valor econômico, v. 16 , n. 3857, 07/010/2015. Brasil, p. A3