Título: Pressão total sobre o BC
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 31/08/2011, Economia, p. 8

A presidente Dilma Rousseff engrossa o coro para a queda dos juros ainda hoje. Taxa está em 12,50%

O Banco Central está sob fogo amigo. Os ministros da Fazenda e do Desenvolvimento, a base aliada no Congresso e até a presidente Dilma Rousseff pressionam para que a instituição derrube a taxa básica de juros (Selic) hoje, mesmo que em 0,25 ponto percentual. O movimento deve se intensificar ao longo desta quarta-feira, segundo e último dia da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que definirá o tamanho da Selic nos próximos 45 dias. A investida sobre o BC começou anteontem, com o anúncio do reforço de R$ 10 bilhões no arrocho fiscal deste ano para o pagamento de juros da dívida.

Em viagem a Pernambuco, Dilma disse que começava a ver a possibilidade de redução dos juros no Brasil. "Os R$ 10 bilhões (de aumento no superavit primário) decorrem dos esforços que fizemos tanto nos gastos de custeio quanto nas receitas", afirmou. "Nós preferimos utilizá-los para abrir um novo caminho, além do caminho de aumentar o investimento. A partir deste momento, nós começamos a ver a possibilidade de redução dos juros. Hoje, o Brasil pratica as mais altas taxas (do mundo)", reforçou a presidente, em entrevista a rádios locais, ao chegar a Caruaru, no agreste pernambucano.

Gritaria Na segunda-feira, quando anunciou a medida fiscal, que elevará o superavit para R$ 127 bilhões, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez apelo semelhante. "Queremos menos política fiscal e mais monetária (ou seja, juros baixos)", disse. Ontem, foi a vez de Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, engrossar a gritaria contra o BC. Durante audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ele afirmou esperar a queda nos juros "em um futuro próximo". "O governo está fazendo um grande esforço para criar as condições necessárias para que o Copom possa começar a reduzir a taxa de juros. Agora, se será nesta ou em outra reunião, depende do Copom. Mas o esforço fiscal tem esse objetivo, criar condições para que haja uma redução", afirmou.

Especialistas do mercado financeiro avaliaram negativamente as pressões políticas, mas ponderaram não haver risco de a reunião do Copom ser pautada pelos clamores governistas e populares. Eles se apegam ao perfil técnico do presidente da instituição, Alexandre Tombini, e dos demais integrantes da diretoria e acreditam que, hoje, mais uma vez, a instituição passará um atestado de profissionalismo e autonomia.

Tanto é assim que, no mercado de juros futuros, diminuíram as apostas em uma redução imediata da Selic. A maioria pondera que uma queda virá, mas possivelmente em alguma das duas últimas reuniões deste ano ¿ quando a taxa cairia dos atuais 12,50% ao ano para 12,25%. "O BC, como todo Banco Central do mundo deveria fazer, age conforme as metas inflacionarias, com base em dados objetivos. A instituição não se curvar a essas pressões", disse Jason Vieira, economista da Corretora Cruzeiro do Sul.

Alcides Leite, professor da Trevisan Escola de Negócios, tem opinião semelhante. Para ele, o BC brasileiro é técnico demais para se deixar influenciar por protestos. "O Copom leva em conta o comportamento da inflação atual e, nesse encontro, não pesará a medida de rigor fiscal. Ela é um dos elementos que vão entrar nas decisões tomadas nas próximas reuniões", observou.

Especulação Carlos Thadeu Filho, economista da gestora de recursos Franklin Templeton, prefere não entrar no debate político, mas observou que, por enquanto, há muita especulação quanto à decisão que será tomada hoje. "O que pode acontecer é o BC dar mais peso à crise do que ao quadro doméstico", disse. "Apenas o cenário doméstico não justifica uma queda nos juros", emendou.

Enquanto o governo diz que chegou a hora de cortar a taxa básica, o mercado se preocupa com a inflação acumulada em 12 meses, que está acima do teto da meta. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) alcançou 7,1% em 12 meses, enquanto o objetivo do governo é limitar esse indicador a 4,5%.

Há desconfiança ainda acerca da política fiscal tocada pela Fazenda, baseado em aumento das receitas e não em corte de despesas e eficiência da máquina pública.

Para Jason Vieira, o anúncio da economia extra de R$ 10 bilhões pode gerar um alívio suficiente apenas para permitir uma parada no aperto monetário, não para cortes nos juros. "O governo tem de trabalhar sério. Apesar de a atividade do país estar em menor ritmo, o potencial inflacionário ainda é grande", alertou.

A Bolsa de Valores de São Paulo (BMF&Bovespa) ignorou as pressões sobre o BC e, pelo terceiro pregão consecutivo, fechou no azul, aos 55.385 pontos, com alta de 0,96%. O dólar foi na direção contrária e registrou queda, terminando o dia cotado a R$ 1,588 para venda.

Tombini entre os melhores O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, está entre os melhores presidentes de bancos centrais do mundo, segundo ranking divulgado pela revista norte-americana Global Finance. O levantamento conferiu avaliações que vão de A (desempenho excelente) a F (fracasso). Tombini ganhou nota B+ e aparece bem à frente do presidente do banco central dos Estados Unidos, Ben Bernanke, que mereceu apenas um C. A revista atribuiu nota máxima apenas aos chefes dos BCs da Austrália, de Israel, do Líbano, da Malásia, das Filipinas e de Taiwan. Foram avaliados presidentes de instituições monetárias de 36 países e do Banco Central Europeu (BCE).