Vice nega conspiração

 

SIMONE IGLESIAS

O globo, n. 29981, 07/09/2015. País, p. 3

 

O vice- presidente Michel Temer reagiu duramente ontem para afastar as especulações de que estaria conspirando para assumir a cadeira da presidente Dilma Rousseff e, em nota, negou qualquer movimento conspiratório, afirmando que trabalhará ao lado da petista até 2018, quando se encerrará o mandato, para que o Brasil fique “melhor do que está hoje”. Incomodado com as críticas, o peemedebista disse que o momento é de “união” e que as intrigas são adversárias do Brasil.

“A hora é de trabalho e de união. Apesar de seu zelo, e atento ao cargo que ocupa, não são poucas as teorias divulgadas de que suas atitudes podem levar à ideia de conspiração. ( Temer) repudiaa. Seu compromisso é com a mais absoluta estabilidade das instituições nacionais”, afirma trecho da nota da assessoria de imprensa.

O texto diz, ainda, que o vice- presidente sempre expôs suas posições políticas de forma franca e aberta e que “não se move pelos subterrâneos, pelas sombras, pela escuridão”.

“O vice- presidente... trabalha e trabalhará junto à presidente Dilma Rousseff para que o Brasil chegue em 2018 melhor do que está hoje. Todos seus atos e pronunciamentos são nessa direção. Defende que todos devem se unir para superar a crise. Advoga que a divisão e a intriga são hoje grandes adversários do Brasil e agravam a crise política e econômica que enfrentamos”, diz outro trecho.

O que mais causa desconforto em Temer é ter sua imagem associada a movimentos que podem ser considerados golpismo, especialmente porque é considerado um dos constitucionalistas mais importantes do país e também porque no começo da década de 1980 esteve na linha de frente da defesa das Diretas Já, segundo um peemedebista próximo ao vice. Soma- se a essas duas questões o fato de presidir o PMDB, partido nascido da luta pela democracia.

“Sua única cartilha é a Constituição. Especialmente a atual, que tem a democracia como seu fundamento estruturante. ( Temer) é legalista por convicção e por vício profissional. Seu limite é a lei. Sabe até onde pode ir”, diz mais um trecho da nota.

Apesar das explicações públicas do vice neste fim de semana, há mal- estar no entorno de Dilma com suas declarações. Uma fonte do Planalto disse ao GLOBO que não adianta o peemedebista culpar as intrigas, se participou voluntariamente de uma reunião com grupos que são contra o governo.

A relação entre Dilma e Temer, juntos no comando do país desde 2011, nunca foi de extrema confiança, muito menos de amizade, e vem se deteriorando desde o começo deste ano, ora motivada por brigas entre petistas e peemedebistas, ora por intrigas palacianas, e ora por declarações mais duras do próprio vice sobre as dificuldades enfrentadas pelo governo. De um mês para cá, a parceria esfriou completamente.

Na última quinta- feira, a um grupo de empresários paulistas ligados ao movimento oposicionista “Acorda Brasil”, Temer declarou que é difícil Dilma resistir até o fim do mandato com a popularidade em baixa como a registrada atualmente em pesquisas. O vice afirmou na ocasião que nada poderá fazer se a aprovação ao governo não subir. Segundo as últimas pesquisas, a popularidade da presidente está em torno de 7%. Nesse mesmo evento, ele também disse que não acreditava que Dilma renuncie, por ser uma mulher “guerreira”.

— Ninguém vai resistir três anos e meio com esse índice baixo. Se a economia melhorar, acaba voltando um índice razoável — afirmou Temer na quinta- feira passada: — Mas, se ela continuar com 7%e 8% de popularidade, fica difícil — acrescentou.

As declarações de Temer causaram forte reação entre os petistas e no governo, que consideraram sua fala “desastrosa”. Apesar da análise interna, ministros petistas disseram publicamente que a fala do vice foi tirada do contexto, numa tentativa de evitar um clima de conflagração no governo.

Antes desse episódio, no começo de agosto, auge do isolamento político do governo, o vice havia dito que o Brasil precisava de “alguém” capaz de unificar o país. Ao fazer um apelo público instando os políticos a se unirem contra a crise, afirmou:

— É preciso que alguém tenha a capacidade de reunificar, reunir a todos e fazer este apelo e eu estou tomando esta liberdade de fazer este pedido porque, caso contrário, podemos entrar numa crise desagradável para o país.

A posição gerou críticas internas e reacendeu a desconfiança entre petistas e peemedebistas, especialmente entre ministros e auxiliares presidenciais que viram na frase um “ato falho” de Temer, que, segundo eles, estaria tentando se colocar no lugar de Dilma. Um dia depois da declaração, ele colocou o cargo na articulação política à disposição, mas Dilma disse que nada havia mudado.

Distanciada de Temer e sem uma ponte com os peemedebistas, Dilma foi aconselhada pelo ex- presidente Lula a tentar uma reaproximação. Ela, então, chamou Temer para um almoço na semana passada. Convidou o vice a reassumir a articulação política, pedido rejeitado prontamente.

 

Temer diz que pode ter sido sabotado no governo

 

Apesar da declaração, auxiliares da presidente continuam a desconfiar da atuação do peemedebista nos bastidores

Após afirmar que dificilmente a presidente Dilma Rousseff chegará ao fim do mandato se mantiver baixa popularidade, o vice- presidente Michel Temer divulgou nota ontem para negar as “teorias” de que conspire contra a petista. O peemedebista disse que “a hora é de trabalho e de união” e que atua para o Brasil chegar em 2018 em melhores condições do que as de hoje. Apesar da manifestação de Temer, auxiliares de Dilma mantêm desconfiança sobre as atitudes do vice, que recentemente deixou a articulação política do governo. Na estreia do programa “Preto no Branco”, do Canal Brasil, o vice- presidente Michel Temer ( PMDB- SP) afirmou que houve uma tentativa de boicote a seu trabalho no comando da articulação política do governo. Apesar disso, negou que esse fato o tenha pressionado a deixar o posto há duas semanas. Em entrevista ao colunista do GLOBO Jorge Bastos Moreno, na noite de ontem, Temer disse que, como articulador político, “desmatou” para que outros agora possam trabalhar, e que viu de forma positiva o fato de integrantes do governo estarem procurando lideranças do PMDB para abrir um canal alternativo de diálogo:

— De alguma maneira esse fato se verificou ( tentativa de boicote). Foram esses desajustes que, muitas vezes, acontecem em qualquer governo. Mas não foi isso que me pressionou, não ( a deixar a articulação política), porque nós, da vida pública, temos que estar acima dos acontecimentos. Quando vi que, de fato, alguns tantos estavam procurando lideranças, disse: “Olhe só, que coisa boa: o governo está encontrando seu caminho”. Eu abri o caminho, a senda, desmatei e agora, com o caminho aberto, as pessoas podem trabalhar.

O vice teve sua atuação questionada depois de declarar, no início de agosto, que era preciso “alguém” para reunificar o país. A frase foi interpretada por ministros ligados a Dilma como um sinal de que Temer estaria de olho na Presidência.

— O que mais me ofendeu nesse episódio foi me darem o epíteto de asno, quer dizer, sou tão burro que sou capaz de verbalizar uma coisa como essa. Se estivesse querendo fazer isso, jamais pronunciaria aquela palavra. Eu agiria subterraneamente — afirmou Temer, que disse ter combinado com Dilma a declaração e que ela “não se deixou levar por intrigas”.

CANDIDATURA A PRESIDENTE

O peemedebista admitiu a possibilidade de se lançar candidato a presidente em 2018:

— Isso depende muito das circunstâncias. Não nego, nem deixo de aprovar. Na minha vida pública, nunca escolhi muito o que ia fazer, era levado pelas circunstâncias e tem que ser assim.

Ele admitiu, porém, que a aliança do partido com o PT está desgastada e apresentou uma hipótese “extrema” para 2018: a de a legenda lançar candidato e os petistas o apoiarem, uma combinação que seria inédita.

— Desgastada está ( a aliança com o PT), mas nunca se sabe o que vai acontecer lá para frente — ponderou o vice.

Sobre o envio ao Congresso do Orçamento de 2016 com déficit que pode chegar a R$ 70 bilhões, Temer voltou a defender um Orçamento transparente, ainda que tenha admitido que a previsão de rombo não tem boa repercussão.

 

Impopular, Dilma não fará pronunciamento

 

ELIANE OLIVEIRA

 

A presidente Dilma Rousseff acompanhará o desfile de 7 de Setembro, na Esplanada dos Ministérios, mesmo correndo o risco de ser vaiada. Junto com ela estarão o vicepresidente Michel Temer e outros dez ministros de Estado. O governo quer usar a imagem do peemedebista a da petista juntos no evento para passar a mensagem de que as arestas entre os dois começam a ser aparadas.

JORGE WILLIAMIndependência. Verde e amarelo nos preparativos para o 7 de Setembro, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília

Apesar de estar disposta a enfrentar o público em geral e os movimentos populares favoráveis ao seu impeachment, Dilma decidiu não se expor fazendo um pronunciamento à nação por meio de emissoras de rádio e televisão. Convencida de que há possibilidade de sua voz ser abafada por panelaços em várias localidades do país, a presidente resolveu gravar um pronunciamento a ser veiculado logo cedo nas redes sociais da internet, como o Facebook, e no site oficial do Palácio do Planalto ( planalto. gov. br).

Dilma também optou por usar a internet no Dia do Trabalho, em 1 º de maio deste ano. Ela quebrou uma tradição histórica pois, pela primeira vez, um presidente da República não falou à população brasileira por meio do rádio e da televisão nessa data. Na época, o ministro da Secretaria de Comunicação ( Secom), Edinho Silva, negou que a decisão se devia ao temor de um panelaço.

No ano passado, no auge da campanha pela reeleição, Dilma deu uma entrevista coletiva no Palácio do Planalto após o desfile do Dia da Independência. Naquele dia, a presidente já estava às voltas com as delações relacionadas ao escândalo de corrupção na Petrobras apurado pela Operação Lava Jato, e respondeu que nenhuma denúncia gerava suspeita sobre o governo.