Lava-Jato chega ao Planalto; crise política se agrava

 

SIMONE IGLESIAS

O globo, n. 29981, 07/09/2015. País, p. 4

 

A Operação Lava- Jato chegou no último sábado ao Palácio do Planalto, a partir da autorização do ministro Teori Zavascki ( STF) para que o ministro Edinho Silva ( Secretaria de Comunicação Social) seja investigado por suspeita de ter conseguido dinheiro para a campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff depois de mencionar ao dono da UTC, Ricardo Pessoa, os contratos da empreiteira com a Petrobras. Pessoa diz ter doado dinheiro de propina. Numa mesma tacada, o braçodireito e mais forte ministro da Esplanada, Aloizio Mercadante ( Casa Civil), passou a ser investigado pela ProcuradoriaGeral da República pelo recebimento de dinheiro ilegal para campanha ao governo de São Paulo, em 2010.

Em meio às crises política e econômica em que o governo está mergulhado desde o começo do ano, as investigações tornam ainda mais turbulenta a rotina palaciana. Apesar das investigações, Edinho e Mercadante permanecerão ministros. Fontes do governo disseram ao GLOBO que não há motivo para afastá- los, e que a delação de Ricardo Pessoa, que diz ter doado ilegalmente aos dois, em anos e campanhas diferentes, não prova nada. A decisão do STF, porém, causou preocupação em integrantes do governo, no sentido de municiar mais a oposição contra Dilma, fragilizada pela falta de popularidade. No entanto, não há, segundo auxiliares de Dilma, motivo concreto para que a crise se agrave.

— Não vejo agravamento. A presidente não convocou nenhuma reunião de emergência — afirmou uma fonte ao GLOBO, que contou ainda que a presidente estava mais preocupada ontem com a mãe, Dilma Jane, que sofreu um acidente doméstico e precisou de cuidados médicos.

MINISTROS NEGAM DOAÇÃO ILEGAL

Hoje, após acompanhar o desfile do 7 de Setembro, em Brasília, Dilma receberá um grupo de ministros petistas, entre os quais Edinho, Mercadante, Jaques Wagner ( Defesa) e o assessor Giles Azevedo, para uma reunião de conjuntura. O almoço estava agendado para os petistas conversarem sobre o déficit orçamentário e formas de reduzir o rombo nas contas públicas. A pauta será ampliada para a Lava- Jato.

Ontem, os dois ministros negaram ter recebido recurso ilegalmente. Edinho afirmou ser “plenamente favorável” à apuração dos fatos, porque não teve conversa que não fosse legal, moral e ética com os empresários que doaram:

— Sou plenamente favorável que se apure todos os fatos e que todas as dúvidas sejam esclarecidas. Tenho a tranquilidade de quem agiu como coordenador financeiro da campanha presidencial de 2014 dentro da legalidade, as contas da campanha foram aprovadas por unanimidade pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Mercadante afirmou que a delação de Pessoa é “insustentável”. O ministro disse desconhecer o teor das declarações do empreiteiro porque pediu há três meses ao STF para ter acesso ao processo, mas teve o pedido negado.

Mercadante disse que não tem conhecimento oficial da investigação autorizada pelo STF: “Em toda a minha vida me reuni uma única vez com o senhor Ricardo Pessoa, por sua solicitação. Na oportunidade, não era ministro de Estado, mas senador e pré- candidato ao governo do Estado de São Paulo, em 2010. Segundo as notícias divulgadas pela imprensa, o senhor Ricardo Pessoa, em sua delação, teria afirmado que doou R$ 500 mil, sendo R$ 250 mil de forma legal e outros R$ 250 mil mediante recursos não contabilizados. Ora, essa tese é absolutamente insustentável, uma vez que são exatamente R$ 500 mil os valores declarados, em 2010, e devidamente comprovados em prestação de contas à Justiça Eleitoral, inclusive já aprovada sem qualquer ressalva", afirmou Mercadante por meio da assessoria. Ele anexou à nota o número dos recibos de doação feitas pela UTC e Constran e disse estar à disposição do Ministério Público Federal e do STF.

 

Força-tarefa vai se debruçar nas campanhas de Lula e Dilma

 

VINICIUS SASSINE E CAROLINA BRÍGIDO

 

O inquérito aberto no Supremo ( STF) para investigar o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Edinho Silva, não será a única frente de apuração de supostas irregularidades nas campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. O ministro Teori Zavascki, relator dos processos da Lava- Jato, já decidiu encaminhar para o juiz Sérgio Moro, em Curitiba, documentos que apontam suspeitas de arrecadação ilegal por parte das coordenações das campanhas de Lula em 2006 e de Dilma em 2010. Edinho foi o tesoureiro em 2014 e, por ser ministro, tem foro privilegiado.

Entre os que poderão ser investigados em novos inquéritos na 1 ª instância da Justiça Federal estão o ex- deputado e ex- secretário de Saúde da prefeitura de São Paulo José de Filippi Júnior e o ex- tesoureiro do PT João Vaccari Neto, segundo fontes com acesso às investigações. Filippi foi tesoureiro da campanha de Lula em 2006 e da campanha de Dilma em 2010. Vaccari só deixou a Secretaria de Finanças do PT após ser preso na Lava- Jato, em abril. Os dois foram citados em depoimentos na delação do dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa.

Segundo Pessoa, a campanha de Lula contou com repasses em espécie, sem registro no Tribunal Superior Eleitoral. A verba seria proveniente de consórcio com obras no exterior, integrado pela UTC. A entrega foi feita no comitê da campanha, conforme o empreiteiro. Pessoa relatou entregas de dinheiro a pedido de Vaccari.

O GLOBO apurou que a forçatarefa do Ministério Público Federal já foi avisada sobre o compartilhamento da delação do dono da UTC, em que ele detalha supostas irregularidades nas campanhas petistas. A expectativa dos investigadores é receber os depoimentos até quarta- feira. Os casos serão analisados individualmente e podem resultar em inquéritos diferentes.

O ex- ministro Antonio Palocci já é investigado na 1 ª instância por conta de suspeitas de arrecadação ilegal na campanha de Dilma em 2010, delatada pelo ex- diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

 

Senador tucano vai ser investigado por suposto caixa dois

 

O senador Aloysio Nunes ( PSDB- SP), que foi vice da chapa presidencial do PSDB na eleição do ano passado, recebeu com indignação a abertura de inquérito contra ele, autorizada pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal ( STF). O pedido da investigação foi feito pelo procurador- geral da República, Rodrigo Janot, a partir da delação premiada de Ricardo Pessoa, da UTC.

Em depoimento, o empresário disse que Aloysio recebeu R$ 200 mil por meio de caixa 2 para sua campanha de 2010 ao Senado, além dos R$ 300 mil que constam como contribuição oficial. Para o tucano, a denúncia tem o objetivo de desviar o foco da Lava- Jato:

— Recebi muito mal porque me parece absurda a mera suposição de que eu, dada minha posição de total oposição em relação ao PT, pudesse intermediar negócios da Petrobras. É algo fora da lógica. Não tenho nada a ver com essa história. Esse pedido de investigação desvia o foco da operação.

CONTAS APROVADAS, LEMBRA SENADOR

O senador negou que tenha recebido R$ 200 mil por meio caixa dois e destacou que a Justiça Eleitoral aprovou as contas de sua campanha de 2010.

O presidente nacional do PSDB, o senador Aécio Neves ( MG) divulgou nota em apoio ao seu vice na eleição do ano passado. Segundo Aécio, Aloysio “foi um dos primeiros a denunciar toda essa operação da qual, por razões óbvias, jamais poderia ter participado”.

Para a oposição, o fato de o ministro Edinho Silva ( Comunicação Social) passar a investigado reforça o movimento pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. O senador Ronaldo Caiado ( DEM- GO) afirmou que Edinho deveria se afastar do cargo para prestar esclarecimentos:

— Edinho não foi indicado por competência para a função. Há um claro objetivo de blindá- lo, já que, ao ser ministro, tem direito a foro privilegiado.

O presidente do DEM, senador Agripino Maia ( RN), considerou que a delação de Pessoa é grave:

— Isso fortalece o pedido de afastamento da presidente.

O secretário- geral do PSDB, deputado Silvio Torres ( SP), concorda:

— Os fatos vão tomando forma. Isso vai agravando o quadro político e a situação da presidente.