Déficit nos sistemas de previdência pública dos Estados supera R$ 50 bi

Edna Simão 

14/10/2015

Assim como a União, as despesas dos Estados com pagamento de aposentadorias e pensões de servidores públicos são crescentes e de difícil sustentabilidade no médio e longo prazos. O déficit financeiro do Regime Próprio dos Servidores Públicos (RPPS) dos Estados somou R$ 50,898 bilhões no ano passado. A estimativa foi feita por técnicos do governo a pedido do Valor e usou dados do Relatório Resumido de Execução Orçamentária e demonstrativos enviados ao Ministério da Previdência. Em 2013, o rombo era de R$ 48,768 bilhões.

A situação dos governos estaduais é agravada pela queda da arrecadação de impostos devido ao período de recessão que atravessa o país. Muitos dos Estados e municípios ainda adotam o regime de repartição simples. Ou seja, os trabalhadores da ativa financiam os aposentados e pensionistas e, se faltar dinheiro, o governo local tem que cobrir a diferença. Sem conseguir recursos, alguns governos tentam aumentar a arrecadação elevando a alíquota do ICMS e parcelando pagamento de despesas, como a de pessoal.

O problema é que esses governos não têm espaço nos orçamentos para absorver um aumento nos gastos com pessoal. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) define um limite de gastos com pessoal em relação à receita corrente líquida. O limite prudencial dos Estados é de 46,55%.

Segundo levantamento repassado ao Valor no ano passado, o regime próprio dos Estados teve receita estimada de R$ 66,648 bilhões, porém as despesas somaram R$ 117,088 bilhões. Com isso, o déficit financeiro foi de R$ 50,898 bilhões. Dos 27 Estados, apenas Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins ainda registravam superávit financeiro no regime previdenciário. Por outro lado, o São Paulo tem o resultado negativo mais elevado (-R$ 14,071 bilhões), seguido por Rio Grande do Sul (- R$ 7,982 bilhões) e Minas Gerais (- R$ 6,978 bilhões).

Representantes dos regimes previdenciários dos Estados ressaltaram que, se não houver nova reforma da previdência, esses regimes não terão sustentabilidade. Para tentar equilibrar as contas no futuro, alguns Estados estão implementando a previdência complementar nos moldes da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp). Mas a medida não é suficiente. É preciso revisar, por exemplo, as aposentadorias especiais concedidas a profissionais da área de segurança, médicos e professores, que podem se aposentar com menos tempo de contribuição.

No caso de São Paulo, cujo déficit financeiro chegou a R$ 14 bilhões em 2014, foi instituída a previdência complementar para os servidores públicos em 2011 com o objetivo de garantir a longo prazo o equilíbrio financeiro de todo o sistema previdenciário estadual. Com essa legislação foi criada a Fundação de Previdência Complementar do Estado de São Paulo, responsável por administrar o novo regime previdenciário.

"Essa medida foi adotada após a realização de vários estudos técnicos para encontrar a solução que melhor se adequasse às necessidades dos futuros servidores sem onerar as contas públicas. Da maneira como a previdência complementar do Estado de São Paulo foi concebida, os gastos do governo serão relativamente baixos e, a longo prazo, será possível sanar o déficit previdenciário", explicou em nota a assessoria do órgão.

Sobre o déficit de 2014, ainda conforme a nota, deve ser examinado com base na receita corrente líquida. No caso de São Paulo, o valor é inferior a 11% dessa receita (R$ 137 bilhões no 1º quadrimestre de 2015) e corresponde a 7% do orçamento para 2015 (R$ 204,8 bilhões), o que deve se manter até aparecerem os primeiros efeitos da previdência complementar.

O coordenador de Orçamento e Planejamento da Secretaria de Fazenda do Paraná, João Luiz Giona Júnior, explicou que governo do Estado conta com dois fundos, um financeiro (repartição simples) e outro previdenciário (capitalização, onde os recursos dos servidores são aplicados, por exemplo, em títulos para bancar as aposentadorias).

Devido à falta de recursos, o governo local resolveu direcionar o pagamento de aposentados com mais de 73 anos - que estava no fundo financeiro e é deficitário - para o fundo previdenciário e superavitário. A medida, que possibilitou uma economia de R$ 121 milhões por mês, foi vista como uma manobra do governo para reduzir despesas com aposentadorias e ter espaço para investimento. "Uma justificativa para o remanejamento foi o investimento", disse Giona Júnior. O governo de Minas Gerais também fez operação parecida.

No Distrito Federal, onde o governo enfrenta sérias dificuldades financeiras, o déficit financeiro do regime de previdência atingiu R$ 1,937 bilhão no ano passado. Segundo o diretor-presidente do Iprev-DF, Roberto Moisés dos Santos, o governo local também tem dois fundos, como no Paraná. Ele disse que a situação do regime previdenciário no DF é complicada, porque, se não forem adotadas medidas, poderá chegar a déficit de R$ 5 bilhões apenas no fundo financeiro, já que o capitalizado tem um superávit.

Moisés dos Santos contou que não há ativos para serem vendidos para garantir o pagamento de aposentadorias e pensões dos servidores. Mas para tentar reverter a tendência negativa foi encaminhado à Câmara Legislativa do Distrito Federal um projeto de lei para criação da previdência complementar dos servidores públicos. A expectativa é que a proposta seja aprovada ainda neste ano.

O Estado do Rio tem dois institutos de previdência. O Rioprevidência era o único instituto até 3 de setembro de 2013. Todos os que se aposentaram até aquela data continuam recebendo pelo Rioprevidência, nas mesmas condições anteriores. Em 4 de setembro de 2013 entrou em operação o RJ Prev, instituto de previdência complementar.

O Rio também está com uma situação problemática. O déficit financeiro do regime de previdência do Estado atingiu R$ 1,159 bilhão em 2014. A expectativa é que o Rioprevidência feche o ano com rombo de R$ 1,99 bilhão. Esse valor só não é maior porque o fundo contou com uma receita de R$ 6,650 bilhões em depósitos judiciais.

O Estado destina parte dos royalties do petróleo para bancar essas despesas. Porém, com a queda do preço do petróleo, os repasses diminuíram prejudicando o financiamento da previdência dos servidores públicos. Cenário que deve permanecer no próximo ano.

"Estamos buscando alternativa par alocar recursos. O Estado está buscando fortemente receitas extraordinárias", disse o diretor-presidente da Rioprevidência, Gustavo Barbosa.

Valor econômico, v. 16 , n. 3861, 14/10/2015. Especial, p. A12