Cerco a Cunha se fecha

 

JAILTON DE CARVALHO

 

Objetivo agora é apurar repasse de recursos desviados da Petrobras para contas do deputado e familiares na Suíça; Baiano afirmou que pagou entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão ao peemedebista em dinheiro vivo

AILTON DE FREITASCunha. “Se estão fazendo aditamento da denúncia, significa que 60 dias atrás não era maduro se fazer denúncia. Quinta é o dia que sempre tem coisa com relação a mim”

O ministro Teori Zavascki, do STF, autorizou pedido do procuradorgeral da República, Rodrigo Janot, para abrir um segundo inquérito sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB), desta vez para investigar o recebimento de recursos desviados da Petrobras em contas na Suíça. A mulher, Cláudia Cruz, e uma filha de Cunha também serão investigadas. Em novo trecho da delação de Fernando Baiano, divulgado pelo “Jornal Nacional”, o lobista afirma ter pagado propina em dinheiro vivo a Cunha. - BRASÍLIA- A situação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), complicou- se ainda mais ontem com os novos desdobramentos das investigações sobre a corrupção na Petrobras. A pedido do procurador- geral da República, Rodrigo Janot, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal ( STF), autorizou à noite a abertura de novo inquérito para investigar se Cunha, a mulher dele, Cláudia Cruz, e a filha do casal, Danielle Dytz da Cunha Doctorovich, têm dinheiro em contas na Suíça não declaradas.

Janot também enviou ao tribunal uma ampliação à denúncia já apresentada contra o presidente da Câmara em agosto. O pedido tem como base a delação premiada do lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano. Em um dos depoimentos da delação, Baiano disse que entregou entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão em espécie ao presidente da Câmara, como informou o “Jornal Nacional”, da Rede Globo.

O dinheiro repassado a Cunha seria parte de uma propina de US$ 40 milhões que Julio Camargo, outro delator, confessou ter pagado ao parlamentar e a outros investigados em troca da compra de dois navios- sonda da Samsung Heavy Industries pela Petrobras. Baiano disse que entregou o dinheiro no escritório de Cunha, em outubro de 2011, a um homem identificado como Altair.

Segundo o “Jornal Nacional”, em sua delação Baiano afirmou que tinha um telefone para tratar desses assuntos com Cunha, e que o deputado acompanhava negociações de contratos com a Petrobras de perto. Baiano disse ao Ministério Público que Cunha chegou a enviar a ele e- mail com uma planilha informando os valores que ele ainda tinha a receber a título de “comissão”.

Além de confirmar as acusações de Julio Camargo e do doleiro Alberto Youssef contra Cunha, Baiano fez outras importantes revelações. Uma fonte disse ao GLOBO que as informações fornecidas pelo lobista “são devastadoras”. Em delação premiada, Julio Camargo e Youssef apontaram Baiano como intermediário da propina destinada a Cunha. Baiano está preso e já foi condenado a 16 anos e um mês de prisão pelo crime, pelo juiz Sérgio Moro, de Curitiba. STF VAI DECIDIR SE ACEITA A DENÚNCIA Na denúncia, o procurador- geral pede que o presidente da Câmara devolva US$ 80 milhões aos cofres públicos. Metade desse valor corresponde à propina paga por Julio Camargo, que atuou no caso como lobista da Samsung Heavy Industries. A outra metade é a multa. Camargo disse que pagou US$ 40 milhões a Cunha, Baiano e ao ex- diretor Internacional da Petrobras Nestor Cerveró em troca da venda de navios da Samsung para a Petrobras, em 2011. O crime já resultou na condenação de Cerveró, a 12 anos e três meses de cadeia, e do próprio Camargo.

Caberá agora ao plenário do STF decidir se acolhe ou não a denúncia do MPF contra Cunha ( e abre o processo) a partir do voto do ministro Teori Zavascki, relator do caso. A decisão do ministro dependerá da defesa prévia de Cunha. O STF não informou se Cunha terá 15 ou 30 dias para se explicar. Pela regra, o denunciado tem 15 dias para apresentar defesa prévia. Mas, na primeira fase da denúncia, Zavascki decidiu ampliar o prazo da defesa para 30 dias, contados a partir da notificação do deputado.

No caso do novo inquérito aberto pelo STF para investigar Cunha, mulher e filha, Rodrigo Janot quer que os três sejam investigados pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro desviado de contratos entre a Petrobras e empresas privadas. Um dos alvos é um negócio de US$ 34,5 milhões entre a Companie Beninoise des Hydorcarbures Sarl, empresa do Benin, e a estatal brasileira.

Janot tomou como base um relatório do Ministério Público da Suíça. Segundo o documento, Cunha e Cláudia têm quatro contas no banco Julius Baer, na Suíça, em nome de offshores sediadas em paraísos fiscais. Em depoimento à CPI da Petrobras, no início deste ano, Cunha disse que não tinha contas na Suíça.

Os procuradores suíços suspeitam que Cunha usou contas secretas para receber dinheiro de propina. Rastreamento de parte da movimentação financeira indica que uma das contas de Cunha, a Orion, recebeu cinco depósitos no valor total de R$ 5,3 milhões do lobista João Augusto Henriques, entre maio e junho de 2011. A série de depósitos começou menos de um mês depois da venda de 50% dos direitos de exploração de um campo de petróleo da Companie Beninoise para a Petrobras.

Sobre o aditamento da denúncia no caso dos navios- sonda, Cunha afirmou que a denúncia apresentada pelo MPF não estava “madura”, e afirmou já estar habituado a, toda semana, surgir algo novo contra ele.

— Se estão fazendo aditamento da denúncia hoje, significa que 60 dias atrás não era maduro se fazer uma denúncia. Na prática, pode demonstrar aquilo que venho falando toda semana: quinta- feira já é o dia que sempre tem alguma coisa divulgada com relação a mim. Então, toda quinta e sexta eu espero, vamos ver o que vai ser na semana que vem. Toda semana é uma coisa, já estamos habituados — disse Cunha.

Sobre o novo inquérito a respeito das contas na Suíça, Cunha disse que, com o Supremo recebendo a demanda do Ministério Público, ele poderá ter acesso ao conteúdo das denúncias de que é alvo para melhor se defender.

— Prefiro que tenha alguma coisa às claras para que eu possa ter acesso. Na medida em que se pede instauração de inquérito, a gente vai ter acesso e vai se defender. Não vejo como um problema, pelo contrário, vejo como solução. É bom que tenha um instrumento para que a gente possa ter ciência e se defender — disse Cunha, alegando que ainda não foi notificado e que seu advogado irá tomar providências. ( Colaborou Júnia Gama)

 

O ataque como forma de defesa

 

Opresidente da Câmara, Eduardo Cunha, escolheu o ataque como a melhor forma de sua defesa. peemedebista tem deixado claro, em conversas com outros colegas deputados envolvidos em alguma denúncia, que a vez deles também irá chegar, caso compliquem sua situação política agora. A informação é do colunista do GLOBO Lauro Jardim.

As ameaças de Cunha são na linha “pensem bem o que vão fazer comigo, porque eu sou vocês amanhã”. O presidente da Câmara diz que a porteira estará aberta, e que outros deputados também serão julgados pelo Conselho de Ética.

Os ataques de Cunha miram também em outro alvo: o líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar ( RJ). O presidente disse a pessoas próximas que Alencar fraudou documentos em sua prestação de contas da campanha de 2014. Irregularidades que, entende Cunha, podem levar à perda do mandato do parlamentar do PSOL. Ontem, Alencar afirmou que o comportamento de Cunha demonstra seu desespero com sua situação, cada vez mais delicada.

— Entendo ser uma ameaça ridícula. Minhas contas são transparentes — disse o deputado.

Em nota enviada a Lauro Jardim, Alencar afirmou: “Cunha já me constrange, e aos demais deputados e deputadas, por estar sob tantas acusações e continuar na presidência da Casa onde exercemos nossos mandatos públicos. Minhas contas de campanha, aprovadas pela Justiça Eleitoral, são cristalinas e derivadas da contribuição nos limites legais de pessoas físicas, totalizando R$ 180.746,65 ( um dos menores gastos entre os eleitos pelo RJ)”. NA WEB bit. ly/ 1L4Y54j Infográfico: o caminho da propina de Cunha

 

Aécio agora diz que Cunha deveria se afastar do cargo

 

MARIA LIMA CRISTIANE JUNGBLUT E

 

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves ( MG), disse ontem que seu partido não tem qualquer compromisso com supostas irregularidades cometidas pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ). Aécio sugeriu que Cunha se afaste do cargo:

AILTON DE FREITASPanos quentes. Aécio minimizou divergências tucanas

— A posição do partido já foi colocada, e nós reiteramos. O caminho que achamos mais adequado é o afastamento do presidente da Câmara ( do cargo), para que ele possa se defender. E o PSDB votará no Congresso Nacional, e na Câmara dos Deputados de forma especial, com base nas provas que serão apresentadas.

Aécio disse ainda que, até agora, o partido mantém uma relação “às claras” com Cunha, diferentemente do governo, que está procurando o presidente da Câmara para acordos “às escuras”, para evitar que seja deflagrado o processo de impeachment contra a presidente Dilma.

Aécio minimizou as divergências entre os líderes do partido. O senador Cássio Cunha Lima ( PB) propôs uma reunião da Executiva Nacional para discutir a posição da bancada da Câmara, liderada pelo deputado Carlos Sampaio ( SP), que busca um entendimento com Cunha para o encaminhamento do impeachment.

— Ao contrário do governo, que tenta um acordo às escuras, a aliança do PSDB com Cunha é feita à luz do dia. Mas na votação do pedido de cassação no Conselho de Ética, o PSDB vai votar de acordo com as provas, não há possibilidade de acordo. Tínhamos um entendimento às claras com Cunha, que é da regra do jogo parlamentar. Ele ampliou o papel das oposições nas comissões, nas CPIs, nos deu a relatoria da reforma política. Mas, no momento em que essas denúncias em relação ao presidente da Câmara chegam, e elas são gravíssimas, obviamente cabe a ele se defender, e, obviamente, o PSDB não tem nenhum compromisso com eventuais irregularidades que possam ter sido cometidas por ele — disse Aécio.

Questionado se acha que o ex- presidente Lula está extrapolando ao articular com o PT e PMDB, em nome da presidente Dilma, um acordão para salvar o mandato presidencial, Aécio disse que Lula está fazendo o seu papel:

— Acho que não está, não. Para o Lula, não existem limites — respondeu o senador tucano.

Além de Aécio, tucanos tentaram colocar panos quentes entre Cássio, que rejeitou o que chamou de “ética seletiva” da oposição, e Sampaio. Cássio disse que Aécio ainda não marcou data para a reunião da Executiva, pedida por ele, para que o partido tenha uma posição única e oficial sobre Cunha.

— É um assunto superado. Tenho todo respeito pelo Carlos Sampaio, e o partido terá unidade, porque é assim que o Brasil precisa, apesar de divergências pessoais — disse Cássio. O senador Aloysio Nunes contemporizou: — Os dois têm razão. O Carlão está no olho do furacão. Lidera uma bancada que está muito incendiada querendo o impeachment. O nosso eleitorado todo não quer mais a Dilma de jeito nenhum. O pedido de cassação do mandato de Cunha já está no Conselho e não depende mais de nós.