O Estado de São Paulo, n. 44541, 29/09/2015. Economia, p. B4

Dívida pública sobe 3,16% em agosto

Lorenna Rodrigues e Rachel Gamarski

 

A dívida pública federal subiu 3,16% em agosto, chegando a R$ 2,686 trilhão, resultado de uma combinação de inflação e taxa de juros em alta. Também pesou no aumento da dívida a estratégia do Tesouro Nacional de emitir títulos da dívida para atender o apetite do mercado, atraído pelas altas taxas pagas pelo Brasil.

Como os papéis indexados ao IPCA (inflação) e à Selic (taxa de juros) respondem por mais de 53% do estoque da dívida, no mês passado, a alta desses dois indicadores pesou no custo do endividamento público, que atingiu o maior patamar desde fevereiro de 2009. O custo médio acumulado nos últimos 12 meses chegou a 15,93% ao ano. Além disso, o aumento da cotação do dólar aumentou a fatia da dívida externa brasileira em 4,35% no mês passado, para R$ 134,32 bilhões.

Mais cara, a dívida brasileira também está mais curta, o que coloca ainda mais pressão na gestão dos papéis pelo Tesouro Nacional. O porcentual que vence em 12 meses passou de 25,44% em julho para 25,20% do estoque total em agosto.
De acordo com o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública Federal, José Franco, em um cenário de maior aversão ao risco, os investidores tendem a migrar de papéis mais longos para os que vencem em mais curto prazo.

Ele ressaltou, no entanto, que não foi verificado um movimento de saída de investidores estrangeiros, mesmo após a retirada do grau de investimento do Brasil pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s, no início de setembro. “Tem muito investidor não residente se preparando para entrar no Brasil”, acrescentou.

Em agosto, o porcentual de estrangeiros com papéis do Tesouro brasileiro caiu para 19,4% do total, de 19,56% no mês anterior. A participação, no entanto, caiu porque houve um aumento maior na fatia de outros detentores, como fundos de previdência. O volume nas mãos dos estrangeiros em valores, no entanto, passou de R$ 484 bilhões em julho para R$ 488,5 bilhões no mês seguinte.

Em relação ao mercado externo, o Tesouro começa a sinalizar que não precisa se financiar em dólar em 2015, nem até meados de 2016, o que pode deixar para o ano que vem os planos de uma emissão de papéis no exterior, inicialmente prevista para este ano.

 

 

Historicamente Fitch não dá dois graus de ajuste de nota de crédito, diz diretor

 

 A Fitch "historicamente não dá dois graus de ajuste de ratings, a não ser que haja um evento", comentou Rafael Guedes, diretor-executivo da Fitch Rating, quando questionado se isso poderia ocorrer com a nota soberana do Brasil. "Provavelmente isso ocorreu na crise da Comunidade Europeia, que foi um evento", destacou. 

A nota do País na Fitch é BBB, com perspectiva negativa. Para perder o grau de investimento, o Brasil teria que descer dois níveis: ir para BBB- e depois para BB+ (primeiro nível abaixo do grau de investimento).

De acordo com Guedes, a "dinâmica da dívida é preocupação número 1 de analistas" da agência internacional para a avaliação da nota soberana do País. O diretor-executivo da Fitch, no entanto, afirmou que é "viável" para o País atingir um cenário econômico no qual evitará o avanço da dívida pública bruta.

"Essa dívida está em 65% do PIB e está encostando em 70% do Produto Interno Bruto", comentou. "Para estabilizá-la, é preciso um crescimento do País próximo a 2% e superávit primário ao redor de 2,5% do PIB. É bastante factível para que o Brasil atinja essas marcas", destacou. 

"Mas com investimento baixo, a 16% do PIB, o País não consegue crescer 2%", ponderou Guedes. Ele ressaltou que o desequilíbrio da economia pode também ser identificado na elevação expressiva do déficit nominal, que atingiu 6,5% do PIB em 2014 e caminha para 9% do PIB neste ano. 

Guedes também comentou que uma perda "significativa" de reservas é um fator que poderia causar rebaixamento de um país, mas que as reservas no Brasil "estão bem e são robustas". "Esse é o único ponto positivo", disse o diretor. Ele também apontou que outros dois fatores poderiam ser uma piora substancial das dívidas de bancos públicos e uma deterioração do perfil da dívida pública interna, que não está no seu cenário-base, inclusive porque apresentou grande melhora na última década. 

O diretor da agência afirmou ainda que os dois analistas que analisam o Brasil estão reavaliando os indicadores econômicos do País, depois que a Fitch reduziu a perspectiva soberana de estável para negativa em abril. "Havia antes de abril uma avaliação específica sobre a dinâmica da dívida pública até 2018", destacou. Segundo ele, como ocorreram mudanças no quadro econômico no últimos meses, os analistas estão fazendo avaliações.  Ele fez os comentários antes de participar de evento realizado pelo IBRI em São Paulo. 

Ajuste fiscal. Guedes também comentou que as medidas relativas ao ajuste fiscal proposto pelo governo para 2016, com uma meta de  superávit primário de 0,7% do PIB, podem ser aceitas pelo Congresso. "O ajuste não tem medidas difíceis de serem aprovadas, desde que haja consenso da base (do governo)", comentou. "Uma coisa é a vontade da equipe econômica, outra é a capacidade de passar medidas."

"Ajuste fiscal com economia em retração é extremamente difícil", comentou Guedes. "O primário de 0,7% do PIB depende de uma série de medidas." Ele ressaltou que no início deste ano o Congresso não ajudou o governo na aprovação de ações corretivas das contas públicas. Ele destacou que a perspectiva negativa do Brasil indica que há risco maior de 50% para que a nota soberana do País seja rebaixada entre 12 e 18 meses. / RICARDO LEOPOLDO