‘Governo tem o maior escândalo do mundo’

 

EVANDRO ÉBOLI, JÚNIA GAMA E FERNANDA KRAKOVICS 

O globo, n. 30024, 20//10/2015. País, p. 4

 

Em resposta à presidente Dilma, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse que o atual governo protagoniza o “maior escândalo do mundo”. A petista lamentara que a revelação de contas de Cunha na Suíça “envolva um brasileiro”. O deputado voltou a dizer que não renunciará à presidência da Câmara. E recorreu ao STF contra as liminares que suspenderam o rito do impeachment previsto por ele. - BRASÍLIA- Em sua primeira aparição pública após o surgimento de documentos que comprovariam a existência de contas secretas na Suíça, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), voltou a se negar a responder às acusações de que é alvo e insistiu na estratégia de dizer que não é o personagem principal da crise. Cunha reafirmou que não renunciará à presidência da Câmara e respondeu à presidente Dilma Rousseff que, no domingo, questionada sobre o caso de Cunha em entrevista na Suécia, disse lamentar que um brasileiro estivesse no centro do problema.

Teste. O primeiro- ministro sueco ( à esquerda) mostra a Dilma modelo do caça Gripen: ela descartou risco de “ruptura institucional” no Brasil

— Eu lamento que seja com um governo brasileiro o maior escândalo de corrupção do mundo — disse o presidente da Câmara.

O governo respirou aliviado com a reação de Cunha, considerada mais amena do que o esperado. Apesar de ele ter rebatido a presidente com uma declaração forte, o Palácio do Planalto apostava ontem que ele não dará o troco deflagrando o processo de impeachment esta semana.

— Ele rebateu uma frase com outra frase. O tom dele até surpreendeu, não esbravejou. Ele soltou essa frase forte, mas o tom geral foi tranquilo — disse um integrante do Planalto.

Segundo aliados, Cunha viu suas opções se afunilarem desde sexta- feira, com líderes da oposição cada vez menos dispostos a lhe prestar solidariedade, e com a fala de Dilma, considerada um mau sinal em relação à disposição do governo de ajudá- lo. A interlocutores, o peemedebista disse que será preciso reavaliar o cenário na Câmara esta semana, inclusive com uma recontagem dos votos que acredita ter para escapar do processo de cassação do mandato no Conselho de Ética. Ele convocou um almoço hoje em sua casa com aliados mais próximos para fazer uma avaliação mais precisa do quadro.

O presidente da Câmara voltou a rechaçar um afastamento voluntário do cargo e descartou a “solução Renan Calheiros”, levantada por diversos deputados, como forma de salvar o mandato renunciando à presidência. Para Cunha, seu grande trunfo, que o diferencia da situação de Renan em 2007, é justamente ter a caneta do impeachment nas mãos, algo que somente a Presidência da Câmara pode proporcionar.

Ontem, Cunha apresentou ao Supremo Tribunal Federal ( STF) os recursos às decisões liminares que barraram o rito do processo impeachment elaborado por ele. O peemedebista afirmou ter legitimidade para continuar no cargo e poder para decidir sobre o impeachment.

— Esqueçam, não vou renunciar. Tenho legitimidade para exercer todos os atos do cargo para qual fui eleito. Continuo com o poder de decidir, nada foi alterado em relação a isso. Fui eleito pela Casa e só cabe uma maneira de eu sair, que é renunciar. E não vou renunciar. Quem deseja minha saída terá que esperar o fim do meu mandato para escolher outro — reafirmou.

Momentos antes da fala de Cunha, o deputado Ivan Valente ( PSOL- SP) defendeu o afastamento do presidente:

— O deputado Eduardo Cunha não reúne condições política e moral para conduzir sequer mais uma sessão na Câmara. O desgaste já é enorme. Ele perdeu a legitimidade para votar o impeachment.

O governo observa com cautela os movimentos de Cunha. Segundo relatos, o clima no Palácio do Planalto é de “suspense”, pois não há clareza sobre como o peemedebista irá proceder em relação aos pedidos de impeachment. O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, tem mantido um canal direto de diálogo com Cunha, mas, ontem, o petista esteve com o vice- presidente Michel Temer, a quem pediu ajuda para controlar o presidente da Câmara.

Na conversa com Temer, Wagner pediu ao vice- presidente, que preside o PMDB, para fazer uma ponte com Cunha. Segundo integrantes do governo, Wagner pediu ajuda tanto para barrar a deflagração do processo de impeachment quanto para não paralisar a pauta de votações da Câmara.

A avaliação de Dilma é que o cenário hoje é bem melhor do que o do início da semana passada devido às liminares do STF, o enfraquecimento de Cunha e o fato de não haver grandes manifestações de apoio ao impeachment.