Título: Com tal base, a casa cai
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Fonte: Correio Braziliense, 28/08/2011, Opinião, p. 20

Visão do Correio

O resultado da Avaliação Brasileira do Final do Ciclo de Alfabetização (Prova ABC) não surpreende, mas preocupa ¿ e muito. Ao testar os alunos do 3º ano do ensino básico, série em que deveriam ter completado o período inicial da aprendizagem regular, o exame demonstra que as deficiências vêm da base e vão se agravando à medida que a criança avança nos estudos.

Nas duas disciplinas mais importantes, as cifras assustam. Em matemática, nada menos que 57% dos estudantes são incapazes de fazer contas de adição e subtração. Tampouco sabem ver as horas em relógio digital, que não exige nenhum típico de cálculo. Em português, 43% não correspondem às expectativas ¿ ler e entender textos simples e dominar as regras básicas da escrita.

A análise dos números comprova a manutenção de velhos desníveis. O desempenho da escola pública mostrou-se inferior ao das particulares. Diferença de 41,7 pontos percentuais separa uma da outra. As instituições privadas alcançaram média de 74,3%, contra 32,6% das mantidas pelo governo. O balanço regional repete outros índices da educação nacional. O desempenho dos alunos do Sul e do Sudeste superou o das crianças do Norte e do Nordeste nas duas disciplinas.

Vale a imagem. Comparado à construção de um prédio, o nível avaliado equivale aos alicerces. Os números mostram que a base não suporta o peso que a obra exige. Com estruturas tão frágeis, das duas uma: ou se interrompe a edificação, ou a casa cai. O mesmo ocorre na educação. A criança repete a série ou abandona os bancos escolares. O drama não se encerra aí. Permanecer no sistema não significa aprender. Significa reprisar a tragédia sem perspectivas de interferência de um deus ex machina. Em bom português: é ingenuidade apostar em milagres.

Mantido o desempenho, o cenário conservará as cores sombrias. Não há necessidade de convocar estatísticos ou matemáticos. O desafio que se impõe é fortificar a estrutura. Com base sólida, é possível prosseguir a edificação. O Brasil, é verdade, apresenta melhoras nos indicadores educacionais, mas o processo tem-se revelado muito lento, incapaz de acompanhar o dinamismo exigido pela era da internet e da globalização. Impõe-se não só diminuir o estoque de alunos com descompasso na aprendizagem, mas também estancar a formação de novos contingentes.