Filhos de Lula e empresário citado por delator dividiram escritório

 

RENATO ONOFRE 

O globo, n. 30026, 22//10/2015. País, p. 5

 

 Acusado pelo delator Fernando Soares, o Fernando Baiano, de pedir propina de R$ 2 milhões para, supostamente, pagar uma dívida de uma nora do ex-presidente Lula, o empresário José Carlos Bumlai dividia em São Paulo, até o início da Operação Lava-Jato, o mesmo escritório usado por Fábio Luiz Lula da Silva e Luiz Claudio Lula da Silva, filhos de Lula.

Em sua delação, Baiano disse que se encontrava com Bunlai no endereço usado pelo empresário na capital paulista, justamente o prédio comercial onde funcionava também a LLCS, em nome dos filhos do ex-presidente.

Em depoimento à Procuradoria-Geral da República, Baiano relatou ter frequentado mais de uma vez o local. Em uma das visitas, Bumlai teria prometido marcar um encontro com Lula e representantes de empresas assessoradas por Fernando Baiano.

 

Baiano diz que era operador de Costa, não do PMDB

 

O delator Fernando Soares, o Fernando Baiano, confirmou em delação ter recebido dinheiro da construtora Andrade Gutierrez sem ter prestado serviços, apenas para intermediar contato com o então diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa. Segundo ele, foi assinado um contrato de R$ 3 milhões entre a construtora e uma de suas empresas, a Techinis — ele ficou com 70%, e 30% teriam sido pagos a um diretor da empreiteira.

Procurada, a Andrade Gutierrez informou que não se pronunciará sobre processos em andamento, “para garantir que não haja qualquer prejuízo à defesa de seus colaboradores e ex-colaboradores".

Baiano disse que não operou para o PMDB, mas para Costa. Estima ter movimentado cerca de R$ 25 milhões. Segundo o delator, até o julgamento do mensalão, o operador de Costa foi João Cláudio Genu, ex-chefe de gabinete do PP. Na avaliação dele, Costa e Genu se associaram para desviar propina que deveria ser paga ao PP, que indicou o diretor da Petrobras.

O lobista disse acreditar que Costa passou a apontá-lo como operador do PMDB para justificar o desvio. Contou que, certa vez, o então deputado Pedro Corrêa, do PP, lhe disse: “Então você é o Fernando Baiano que está levando o dinheiro da gente para o PMDB”, referindo-se às propinas.

— Foi surpresa muito grande que Paulo Roberto tinha conta no exterior . Isso aí, para mim, foi um “totó” que ele deu no PP — disse ontem o doleiro Alberto Youssef, ao depor à Justiça.

 

Salas alugadas em prédio na capital paulista estão fechadas

 

O painel de informação do hall do edifício Office Brigadeiro já não tem mais as placas com os nomes das empresas de Bumlai e dos filhos de Lula no conjunto 61. O endereço, no número 3.530 da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, na capital paulista, não é mais usado pelos empresários como sede dos negócios desde o ano passado.

Bumlai foi o primeiro a sair do edifício. A empresa São Fernando deixou de funcionar no local no mesmo período da deflagração da primeira fase da Lava-Jato. Quem viu Bumlai circular pelos dez andares do prédio lembra da forte estrutura que o cercava. Era comum ver o empresário chegar em utilitários blindados, acompanhado de seguranças:

— Parecia filme. Ficava gente vigiando a portaria enquanto ele estava lá em cima — relatou um manobrista ao GLOBO.

Se continuasse no local, Bumlai pagaria hoje cerca de R$ 11 mil por mês pelo aluguel das salas, que ocupavam pouco mais da metade do andar. O edifício, que pertence a uma construtora, tem entrada privativa e lanchonete no térreo.

O filho mais novo de Lula, Luiz Cláudio, usava o local para encontrar empresários de marketing esportivo. Ao GLOBO, funcionários confirmaram que os dois negócios funcionavam no mesmo local.

A defesa de Bumlai não quis comentar sobre o uso da sala, nem quem a frequentava. A defesa nega que o empresário tenha negociado propina para o ex-presidente Lula ou seus filhos. O GLOBO não conseguiu contato com os filhos do ex-presidente.

 

Polícia Federal investiga se Bumlai usou notas frias para receber propina

 

A Polícia Federal investiga se o empresário José Carlos Bumlai usou notas frias para receber propina de negócios vinculados à Petrobras. Bumlai é amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tinha livre acesso ao gabinete dele no Palácio do Planalto. O lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, afirmou que foram depositados cerca de R$ 2 milhões na conta da empresa São Fernando, de aluguel de equipamentos, indicada por Bumlai para receber a suposta propina. A São Fernando, segundo Baiano, estaria em nome do empresário ou do filho dele.

No depoimento de delação, prestado em 16 de setembro passado, Baiano afirmou que Bumlai lhe pediu para antecipar uma parte da comissão que ambos dividiriam por terem aproximado a OSX da Sete Brasil, responsável pelo fornecimento de navios-sondas para a exploração do pré-sal.

O relato faz parte dos documentos enviados ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, e pelo ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, nos quais o lobista acusa Bumlai de pedir propina de R$ 2 milhões para pagar parte de um imóvel de uma das noras de Lula.

Baiano disse que procurou Bumlai para ajudar a OSX porque o então presidente da Sete Brasil, José Carlos Ferraz, teria sido indicado pelo ex-ministro Antonio Palocci, como revelou ontem o “Estado de S.Paulo”. Os dois dividiriam a comissão. Antes de fechado negócio, porém, Bumlai teria lhe pedido R$ 3 milhões para “resolver um problema” de uma nora de Lula. O lobista disse que não pediu o dinheiro à OSX porque as negociações com a Sete Brasil não haviam sido concluídas, mas se comprometeu a ajudar Bumlai com R$ 2 milhões.

O pagamento teria sido feito por uma terceira empresa, que prestava serviços ao grupo OSX. Ele afirmou que teria sido emitida uma nota fictícia para justificar o pagamento e disse acreditar que também deve ter sido assinado um contrato de prestação de serviços.

Segundo o lobista, a primeira reunião entre a OSX e Ferraz, da Sete Brasil, teria ocorrido no primeiro semestre de 2011, após sinal verde de Bumlai. Todo o desenrolar da negociação, disse, era repassado ao amigo de Lula.

Como o fechamento de um acordo demorou, Baiano teria dito ao empresário que precisava de “um peso maior” para que ele fosse efetivado. Bumlai se encarregou, então, de agendar uma reunião de Ferraz com Lula. Ferraz e Bumlai teriam se reunido antes no restaurante Tatini, em São Paulo, onde o empresário orientou o presidente da Sete Brasil sobre “o que falar com Lula”. Depois, Ferraz e Bumlai foram juntos para o Instituto Lula.

Baiano disse que Ferraz lhe contou que a reunião havia sido “muito boa”. Segundo ele, Ferraz teria pedido apoio de Lula para dar “mais velocidade” aos assuntos da Sete Brasil, “para viabilizar uma consolidação mais rápida da indústria naval brasileira”. Baiano afirmou que, na reunião com Lula, segundo Ferraz, foi marcado um segundo encontro no Instituto Lula, com a participação do ex-presidente e de representantes do setor naval. O negócio entre OSX e Sete Brasil não saiu, mas, segundo o lobista, Bumlai não lhe devolveu o valor adiantado.

O Instituto Lula informou que o ex-presidente nunca intermediou contratos de empresas e jamais autorizou Bumlai a usar seu nome em qualquer espécie de lobby. “Reiteramos que o ex-presidente Lula nunca atuou como intermediário de empresas em contratos, antes, durante ou depois de seu governo. Jamais autorizou que o sr. José Carlos Bumlai ou qualquer pessoa utilizasse seu nome em qualquer espécie de lobby. Não existe a dívida de 2 milhões supostamente mencionada na delação”, diz a nota.

Arnaldo Malheiros, advogado de Bumlai, disse que o empresário nunca participou de esquema de transferência de dinheiro para Lula ou sua família.