‘Pedaladas’: Dilma terá 45 dias para se defender

 

CRISTIANE JUNGBLUT

O globo, n. 30026, 22//10/2015. País, p. 7

 

Numa manobra para ajudar a presidente Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros, concedeu ontem prazo de 45 dias para o governo apresentar defesa prévia para o parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) que condenou as “pedaladas fiscais” e rejeitou as contas presidenciais de 2014. Na prática, a decisão de Renan atrasa ainda mais a tramitação das contas no Congresso e, principalmente, na Comissão Mista de Orçamento (CMO), jogando o julgamento para março de 2016, nas previsões mais otimistas.

AILTON DE FREITAS/07-10-2015Prazo mais longo. Renan durante sessão no Congresso: manobra do presidente do Senado beneficiou governo

À noite, o governo teve mais uma vitória: o líder do PDT no Senado, Acir Gurgacz (RO), foi escolhido relator das contas na CMO. Ele é considerado aliado de primeira ordem do Palácio do Planalto, e sempre vota com o governo. Dentro do PDT, Gurgacz é tido como aliado de Dilma e contrário a qualquer rompimento. ROSE DE FREITAS RECLAMA DA DECISÃO À noite, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, voltou a criticar o governo pelas “pedaladas”:

— O governo tem que aprender a fazer superávit real e não aprendeu a fazer isso até hoje (…). A pedalada já está virando motocicleta. Saiu da pedalada e virou motocicleta!

Renan explicou que o prazo inicial de defesa será de 30 dias, prorrogável por mais 15 dias, totalizando 45 dias. O Palácio do Planalto certamente utilizará todo o prazo possível, como fez na discussão do caso no TCU. A decisão provocou um bate-boca no plenário entre Renan e a presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), que ficou indignada com a manobra de Renan.

— O governo vai dizer se ele quer ou não quer exercer o contraditório. Se ele quiser o contraditório, como presidente do Congresso eu não tenho outra saída, pelas decisões já tomadas pelo Supremo Tribunal Federal, invocadas nessa circunstância única. Desde 1946, eu repito, essas são as primeiras contas com pareceres pela rejeição. E tudo nesta área é novo, absolutamente novo. O governo vai dizer se quer exercê-lo ou não, mas não deixará de exercê-lo por omissão do presidente do Congresso Nacional. Eu prefiro não errar por omissão — disse Renan, irritado com os questionamentos de Rose de Freitas.

Para justificar a manobra, Renan argumentou que, no TCU, o julgamento foi técnico e que, agora, no Congresso, se fará “um outro tipo de exame, de natureza política”. Segundo ele, o parecer do TCU será apenas um “elemento de formação” para a postura dos deputados e senadores. Pelas regras regimentais, os pareceres do TCU são analisados pela CMO e, depois, pelo plenário do Congresso. Como Renan é presidente do Congresso, poderá segurar a votação em plenário, porque os prazos existentes dizem respeito apenas à tramitação na CMO.

Somente depois destes 45 dias é que o caso será remetido à CMO, onde o prazo será de 77 a 82 dias. Renan assinou um despacho neste sentido na tarde de ontem. Na prática, ele criou um “rito especial” para a tramitação do processo das contas de Dilma, alegando que era preciso garantir “o direito ao contraditório”.

Rose pediu a palavra assim que Renan anunciou sua decisão. Ela disse que era “aliada” do presidente do Senado, mas queria saber se o governo já tinha se manifestado a respeito.

— Jamais negligenciei meus deveres. É de conhecimento do Brasil inteiro que essas contas foram rejeitadas por unanimidade — disse Rose. — Há uma intenção, claramente, de jogar as contas para 2016.

— Certamente, o governo se manifestará, porque esse prazo só correrá se o governo o desejar. Para que amanhã não sejamos responsabilizados por ter causado a nulidade de um processo que é importante, muito importante, num momento difícil da vida nacional — rebateu Renan.

Sobre o relator, Rose disse que seria um parlamentar da base aliada.

— A partir de agora ele (Acir Gurcacz) é a pessoa mais exposta neste processo e dedicada ao trabalho que vai fazer — disse Rose.

 

Relator da CPI da Petrobras exclui indiciados sem nome

 

EDUARDO BRESCIANI

 

O relator da CPI da Petrobras, Luiz Sérgio (PT-RJ), retirou do seu parecer final a proposta de indiciamento de pessoas que nem sequer tinham sido nominadas. A proposta de indiciar representantes de empresas sem apontar o nome é de dois sub-relatores, Altineu Côrtes (PR-RJ) e Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), e tinha sido acatada pelo petista, conforme revelou o GLOBO.

A comissão começou a discutir ontem à noite o relatório e votos em separado apresentados por partidos da oposição. O PSOL propôs o indiciamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDBRJ), enquanto o PSDB incluiu ainda a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Luiz Sérgio não propôs nenhum indiciamento diretamente no seu relatório, mas, diante da pressão de membros da CPI, acatou propostas apresentadas pelos sub-relatores. Sua assessoria argumenta que os indiciamentos sem nome acabaram passando por falta de tempo para revisão do trabalho. Altineu apontou como indiciados “responsáveis legais” de 16 empreiteiras envolvidas na LavaJato. No caso de outras oito empreiteiras o próprio Altineu indicou o nome dos executivos. Arnaldo Faria de Sá, por sua vez, propôs o indiciamento dos “representantes do grupo Schahin”, sem especificar quem seriam os acusados.

O relatório do petista, porém, permanecerá sem nenhum indiciamento de políticos. Luiz Sérgio argumenta que a CPI não é um Conselho de Ética e, por isso, não se analisou a conduta dos parlamentares. Ele manteve também as críticas à Operação Lava-Jato e ao que chamou de “excesso de delações premiadas”.

O PSOL apresentou um voto em separado pedindo indiciamento dos quatro parlamentares que já foram denunciados ao Supremo Tribunal Federal (STF): Cunha, o deputado Arthur Lira (PP-AL) e os senadores Fernando Collor (PTB-AL) e Benedito de Lira (PP-AL).

O voto em separado do PSDB vai além. Os parlamentares tucanos na CPI pediram a abertura de inquérito policial para apurar a prática de crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência contra Dilma, Lula, o ministro Edinho Silva (Comunicação Social) e os ex-ministros José Dirceu, Antonio Palocci, Guido Mantega, Gilberto Carvalho e Ideli Salvatti. Propuseram ainda denúncia de crime de responsabilidade contra Dilma, o que poderia resultar em impeachment.

“Além da prática de atos com ofensa à probidade na administração, não foi respeitado o dever de zelar pela moralidade administrativa, pois, ao assumir a Presidência da República, manteve-se inerte diante do que ocorria na Petrobras, mesmo sabendo dos atos criminosos ali praticados”, afirmam os tucanos sobre Dilma.

Em relação a outros 51 políticos citados na Lava-Jato, os tucanos recomendam a abertura de inquérito penal ou a inclusão das informações da CPI nos procedimentos já em andamento. Pedem ainda a abertura de inquérito cível contra eles. Estão nessa lista os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDBAL). Foram incluídos ainda nesse capítulo o ex-presidente do PSDB Sérgio Guerra, o exgovernador Eduardo Campos (PSB) e o ex-deputado José Janene (PP), todos já falecidos.