Irritação no PT com ministro da Justiça cresce após ação da PF

 

FERNANDA KRAKOVICS

O globo, n. 30031, 27//10/2015. País, p. 4

 

A operação de busca e apreensão feita pela Polícia Federal no escritório da LFT Marketing Esportivo, de Luis Claudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, fez crescer no PT a insatisfação com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, acusado de não ter controle da Polícia Federal. Também há reclamações sobre supostos excessos na Operação Lava-Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobras, e de vazamentos considerados seletivos. Lula tenta derrubar Cardozo desde o final do ano passado, mas, nesse período, Dilma já fez duas reformas ministeriais e não mexeu na pasta da Justiça.

— Acho um absurdo, é uma total arbitrariedade. Ninguém me convence de que não fizeram isso porque amanhã (hoje) é aniversário do Lula — disse o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), relator da subcomissão da Câmara para acompanhamento das operações da Polícia Federal alusivas ao sistema tributário nacional.

A investida da Operação Zelotes na empresa do filho de Lula também causou preocupação no Palácio do Planalto. O governo teme o “efeito dominó”. A avaliação é que o desgaste de Lula respinga no PT e, por tabela, na presidente Dilma.

DILMA RESISTE A DEMITIR CARDOZO

Para sustentar o discurso de motivação política nas ações da Polícia Federal contra Lula e o PT, Pimenta lembrou que o então tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, foi alvo de um mandado de condução coercitiva, no âmbito da Lava-Jato, na véspera do evento de comemoração de 35 anos do partido, em fevereiro. Vaccari acabou preso em abril, um dia antes de reuniões da Executiva e do Diretório Nacional do PT.

Lideranças petistas questionaram ainda o foco da Operação Zelotes no filho de Lula e cobraram ações da Polícia Federal contra as grandes empresas que teriam sonegado e corrompido conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ).

— O que o filho do Lula tem a ver com a corrupção no Carf? — questionou uma liderança petista.

Entre os presos pela Polícia Federal sob suspeita de envolvimento com fraudes no Carf está Mauro Marcondes Machado, sócio da Marcondes & Mautoni. Ele é acusado de negociar interesses de montadoras com conselheiros do Carf. A Marcondes & Mautoni Empreendimentos fez repasses à LFT Marketing Esportivo. Essa é uma das consultorias suspeitas de atuar a favor da medida provisória que prorrogou benefícios fiscais de montadoras de veículos, como informou o jornal “O Estado de S.Paulo”.

Apesar da pressão de Lula e do PT, Dilma resiste a entregar a cabeça de Cardozo. O próprio ministro já deu sinais de cansaço e de que gostaria de deixar o cargo, mas a avaliação no Planalto é que substituí-lo em meio à Lava-Jato seria uma péssima sinalização. Na ofensiva contra Cardozo, Lula já tentou emplacar no Ministério da Justiça até o vice-presidente Michel Temer.

Em reunião com deputados do PT em Brasília, no último dia 15, Lula se queixou, de acordo com participantes do encontro, de que toda semana há uma “saraivada de ataques” contra ele e sua família.

LULA DIZ TER ORGULHO DO QUE FEZ

O próprio ex-presidente é alvo de inquérito aberto pelo Ministério Público do Distrito Federal para investigar suposto tráfico de influência em favor de empreiteiras no exterior. Em depoimento prestado espontaneamente no último dia 15, Lula disse ter orgulho de defender empresas brasileiras e que essa seria prática comum de presidentes e ex-presidentes de outros países.

No mesmo depoimento, Lula admitiu que pode ter entregado ao então ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, uma carta de Cuba pedindo um financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), órgão que é subordinado ao ministério.

 

Para filho de Lula, ação foi ‘despropositada’

 

JAQUELINE FALCÃO E SÉRGIO ROXO

 

 O advogado Cristiano Martins, defensor de Luis Claudio Lula da Silva, disse que a nova fase da Operação Zelotes é “despropositada”. O defensor nega qualquer relação das empresas do filho caçula do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a LFT Marketing e a Touchdown, com o objeto da investigação.

Em nota, Martins diz que “a Touchdown organiza o campeonato brasileiro de futebol americano — torneio que reúne 16 times, incluindo Corinthians, Flamengo, Vasco da Gama, Botafogo, Santos e Portuguesa —, atividade lícita e fora do âmbito da referida operação. No caso da LFT Marketing Esportivo, que se viu indevidamente associada à edição da MP 471 — alvo da Operação Zelotes —, a simples observação da data da constituição da empresa é o que basta para afastá-la de envolvimento com as suspeitas levantadas”.

A nota ressalta que “a MP foi editada em 2009 e a LFT constituída em 2011”. E informa que “a prestação de serviços da LFT para a Marcondes & Mautoni ocorreu entre 2014 e 2015 — mais de cinco anos depois da referida MP e está restrita à atuação no âmbito de marketing esportivo”. Acrescenta que do contrato entre as empresas resultaram “quatro projetos e relatórios que estão de acordo com o objeto da contratação e foram devidamente entregues à contratante”.

“O valor recebido está contabilizado e todos os impostos foram recolhidos. A Touchdown e a LFT jamais tiveram qualquer relação com o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf )”, diz a nota. O advogado disse ainda que pediu acesso a todo “o material usado para justificar a medida”.

O ex-chefe de gabinete da Presidência Gilberto Carvalho classificou de “absurdo” o relatório da Polícia Federal que afirma que ele fez conluio com o lobista Mauro Marcondes.

— É um absurdo. Espero que a PF mude (o relatório) a partir do meu depoimento de hoje — afirmou Carvalho.

O ex-chefe de gabinete disse que foi intimado para depor na manhã de ontem porque algumas anotações de Marcondes indicavam que ele teria influenciado no lobby.

Papel apreendido na casa de outro lobista, Alexandre Paes dos Santos, preso ontem, traz a inscrição: “Café: Gilberto Carvalho”, no dia 16 de novembro de 2009.

— Expliquei para a delegada que a data em que está anotada lá que eu tive um café com o cara, eu estava em Roma com o presidente Lula.

Carvalho contou ter destacado ainda que não participava da discussão de mérito e das confecções das MPs. E disse que foi questionado pela delegada se tinha recebido algum presente de Marcondes.

— Em 2009, havia adotado duas meninas, e, como ficou público, várias pessoas que frequentavam o Planalto mandaram presentes. O Mauro mandou duas bonequinhas para elas. Por sorte, lembrei e falei isso quando a delegada perguntou por que ela tinha uma anotação apreendida em que estava escrito: “não esquecer de mandar duas bonecas para Gilberto Carvalho”.