Novo delator da Lava-Jato terá que devolver R$ 40 milhões

 

CLEIDE CARVALHO E RENATO ONOFRE

O globo, n. 30031, 27//10/2015. País, p. 5

 

 A Justiça Federal homologou, ontem, a delação de João Antônio Bernardi Filho, apontado como operador do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque. Bernardi é acusado de intermediar o pagamento de propina de empresas italianas e argentinas ao ex-diretor. Preso em junho durante a 14ª fase da Operação LavaJato, o novo delator foi solto e responderá ao processo em liberdade.

REPRODUÇÃO/TV GLOBOBernardi. Propina de US$ 9,4 milhões de grupo argentino

Além de fazer pagamento de propina em dinheiro, o Ministério Público Federal (MPF) afirmou que Bernardi pagava parte das vantagens indevidas a Duque por meio de obras de arte. Das mais de 130 obras apreendidas pela Polícia Federal em imóveis ligados ao ex-diretor da estatal, cinco estavam no nome dele.

O novo delator terá que devolver cerca de R$ 40 milhões (US$ 10 milhões) desviados no esquema. Além de pagar uma multa máxima de R$ 3 milhões. Bernardi também teve que abrir mão de imóveis e obras de arte confiscadas durante as operações da PF.

Aos investigadores, Bernardi relatou como passou a operar contas e imóveis em favor de Duque. De acordo com ele, Duque o procurou no início de 2009 pedindo que ele o ajudasse a receber alguns valores no exterior. Segundo o delator, os dois já se conheciam há 30 anos, quando trabalharam juntos na Petrobras.

Para atender ao pedido de Duque, em 2009, Bernardi procurou o escritório de advocacia de José Reginaldo Filpi, morto em 2015, que ajudou na criação da offshore Hayley S.A. no Uruguai. O operador deu detalhes de como a conta foi criada e como Duque operava a propina.

Bernardi disse que, para disfarçar, Duque chegou a usar cartão de crédito em nome de uma mulher quando viajava para o exterior. O cartão estava no nome de Christina Maria, advogada do escritório que ajudou a abrir uma offshore.

— (Duque) Não utilizou muito tal cartão porque estava em nome de uma mulher, o que causava certo desconforto quando o usava, sobretudo se requerida a apresentação de documento — disse Bernardi na delação.

O delator disse ainda que operacionalizou o pagamento de propinas para o grupo argentino Technit, por meio da sua subsidiária brasileira Confab. O valor foi de US$ 9,4 milhões. Bernardi também teria atuado para assegurar a contratação da empresa italiana Saipem pela Petrobras, para obra de instalação de gasoduto submarino. O GLOBO não conseguiu contato com os representantes da Confab e do Grupo Technit, nem com a empresa italiana.

Em cinco anos de operação do esquema montado por Bernardi, Duque comprou cinco lojas comerciais na Barra da Tijuca por US$ 2,1 milhões e um apartamento num bairro nobre da Zona Sul paulista por US$ 708 mil.

Bernardi ficou com a função de administrá-los e repassar o lucro do investimento ao ex-diretor. Os imóveis foram alugados, e, com o dinheiro recebido, Duque conseguiu comprar mais duas outras salas na Barra, duas no Centro do Rio e três apartamentos — dois na Barra e um em São Paulo.

DELATOR ADQUIRIU DEZ TELAS DE GUIGNARD

Em 2012, Duque resolveu diversificar os negócios. Ele orientou Bernardi a investir em artes, “pelo progresso do mercado no Brasil”. Em março deste ano, quando o ex-diretor foi preso, a Polícia Federal apreendeu na casa do ex-diretor 131 obras de arte. Entre elas, quadros de artistas brasileiros valorizados, como Guignard, Djanira e Heitor dos Prazeres. A coleção de telas de Guignard era de cerca de dez peças, que foram compradas por Bernardi. Por meio da Harley, ele comprou 14 peças no total.

Pelos termos da delação, Bernardi poderá ser condenado à pena máxima de 12 anos de prisão em regime fechado. Mas, conforme o acordo, ele não precisará mais permanecer em regime fechado, mesmo se for condenado. Nesse caso, terá de passar mais oito meses em regime semiaberto diferenciado, em prisão domiciliar, com possibilidade de sair para trabalhar.

O operador fica obrigado a renunciar a seu direito ao silêncio e a revelar autores de crimes ou integrantes de organizações criminosas. Ele não poderá deixar o país e precisará se apresentar à Justiça a cada 30 dias.

 

Bumlai pede a Moro acesso à delação de Baiano

 

O empresário e pecuarista José Carlos Bumlai pediu ao juiz Sérgio Moro acesso às delações do lobista Fernando Baiano. Bumlai quer obter o trecho onde o delator afirma que o pecuarista teria pedido propina para pagar dívida de uma nora do ex-presidente Lula. O pedido, feito na sexta-feira, ainda não foi atendido.

Além da íntegra da delação, a defesa de Bumlai pede o acesso total aos desdobramentos da investigação: anexos, mídias eletrônicas e outras provas relacionadas à Operação Lava-Jato em que seu nome tenha sido mencionado.

Na semana passada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, relator das investigações na Corte, negou o pedido de Bumlai para ter acesso ao depoimento de delação de Baiano. Para Teori, o pedido de Bumlai é “inviável” porque o conteúdo dos depoimentos é protegido por sigilo.

Além de citar repasse de R$ 2 milhões a Bumlai, Baiano disse ainda que o expresidente Lula se reuniu pelo menos duas vezes, em 2011, com o pecuarista e com João Carlos Ferraz, então presidente da Sete Brasil. O encontro teria sido intermediado pelo próprio Baiano e por Bumlai.

Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Bumlai disse que os valores recebidos eram relativos a um empréstimo pessoal e não tinham ligação com a família do ex-presidente. Desde que seu nome foi citado na Lava-Jato, o expresidente Lula, por meio da assessoria do Instituto Lula, vem negando ter intermediado qualquer tipo de pedido ou favor a empresas envolvidas ou não nas investigações.