Correio Braziliense, n. 19.117, 28/09/2015. Economia, p.6
Estudo da OCDE mostra que Brasil participará com 5% dos graduados no grupo das nações mais ricas em 2030. Apesar disso, a contribuição do país em áreas tecnológicas, consideradas as mais importantes no mundo globalizado, ainda será pequena
» ALESSANDRA AZEVEDO
O número de jovens com formação superior vai mais do que dobrar nos próximos 15 anos — movimento que tem como principais protagonistas os países em desenvolvimento. É o que mostra um estudo feito pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), conhecido como grupo dos países ricos. De acordo com a pesquisa, o número de jovens de 24 a 35 anos com nível superior no G20 — grupo formado pelas 20 economias mais desenvolvidas do mundo, do qual o Brasil faz parte — vai chegar a 300 bilhões, mais que o dobro dos 137 milhões calculados em 2013. A participação dos países em desenvolvimento, que, em 2005, era de 40%, corresponderá a 70% dessa força de trabalho em 2030.
A fatia do Brasil vai passar de 4% para 5%, o que representa quase o triplo do número de jovens formados (de 5,48 milhões, vai para 15 milhões). Mas, diferentemente dos países que mais crescem nesse sentido — China e Índia, que, sozinhos, responderão pela metade dos jovens formados em 2030 —, o processo no Brasil é desequilibrado. Segundo a OCDE, 75% dos diplomas emitidos no país ainda são da área de humanidades, enquanto apenas 10% são de cursos de exatas, ou seja, o país não tem priorizado formações relacionadas a tecnologias, como engenharia, que, em um contexto de globalização, são cada vez mais importantes.
Para o professor da faculdade de educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Luciano Mendes, essa desproporção é cultural e reflete a herança “bacharelista” do país. Por dar mais status social, os cursos de humanas, em especial de direito, são historicamente mais valorizados pelos brasileiros. Como consequência, o investimento nos outros cursos era pouco expressivo até poucas décadas atrás.
Preocupação
Essa realidade que continua preocupante nos dias de hoje. Os três cursos superiores mais procurados em 2013 foram na área de humanas: administração, direito e pedagogia, de acordo com o Censo do Ensino Superior divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O último pode ser explicado pela necessidade crescente de professores, o que incentiva a abertura de vagas. “É uma configuração da própria sociedade brasileira, que demanda profissionais nas áreas de humanas. Em países onde tem menos concentração de jovens, há menos necessidade de professores, por exemplo. É o caso de muitos países europeus”, exemplifica. Por isso, nesses países, a tendência é que haja menos oferta nessa área, enquanto nos países com maior número de jovens, como o Brasil e os Estados Unidos, a demanda é maior.
Segundo a OCDE, até 2030, três quartos dos diplomas de exatas serão dos países do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). A Europa e os EUA ficarão com 8% e 4%, respectivamente. Na contramão dessa tendência, o Brasil não deve contribuir tanto quanto a China e a Índia.
O diretor de Políticas e Programas de Graduação do Ministério da Educação (MEC), Dilvo Ilvo Ristoff, acredita que o problema não é falta de oportunidade na área de exatas, mas o fato de haver demandas mais atrativas na de humanas. “Como são pessoas preparadas e que podem atuar em diversas funções, as outras áreas chamam e elas vão”, explica. Para ele, os cursos de graduação, em quaisquer áreas, abrem portas para quem é qualificado. “Não dá para esperar que um curso de graduação forme necessariamente para aquela profissão, mas é certamente um grande gerador de oportunidades”, acredita. Ele ressalta o crescimento no número de brasileiros jovens com formação superior atualmente, que passou de 9%, em 2009, para 20%. A meta é chegar a 33%.
Curso a distância
Grande parte desse crescimento foi devido ao investimento em cursos a distância, que são característicos da área de humanas. Segundo o Censo da Educação Superior, em 2013, 15,8% do total de cursos de graduação oferecidos no país não eram presenciais, o que corresponde a mais de 1 milhão de matrículas.
Um ponto que pesa no investimento em cursos de exatas, principalmente em instituições privadas, é o preço. Abrir uma faculdade de engenharia, tecnologia ou matemática é muito mais oneroso que abrir algum na área de humanas, devido, principalmente, à necessidade de laboratórios e equipamentos caros. “Vagas para cursos na área de humanas são muito mais baratas, por isso há mais oferta. Acaba se tornando um ciclo vicioso”, diz o professor da UFMG.
Esse é um dos indicativos de que o Brasil ainda encontra entraves para o crescimento da formação superior, um deles sendo o baixo número de vagas em relação à demanda. A pesquisa mostrou que 73,5% dos estudantes de graduação frequentavam instituições privadas — ou seja, só 26,5% estavam matriculados em faculdades públicas. Segundo o professor, um dos percentuais mais baixos de vagas em instituições públicas no mundo. “Os cursos de graduação são muito concorridos. Podemos crescer muito mais do que estamos, mas a base é muito restrita”, afirma o professor.
Ele ressalta, ainda, que metade das vagas em faculdades e universidades privadas têm algum tipo de financiamento do governo, seja por meio de isenção de impostos ou bolsas aos alunos. Capital que, na opinião dele, poderia ser investido na abertura de vagas públicas, por meio da ampliação dos câmpus ou criação de novas universidades. No entanto, essas medidas implicam discutir o modelo de ensino superior público brasileiro. O custo do regime universitário, priorizado no Brasil, dificulta a expansão. “É o modelo mais oneroso. Uma vaga no regime universitário é muito cara”, explica o professor.