Desemprego sobe mais no Rio e vai a 6,3%

 

DAIANE COSTA 

O globo, n. 30027, 23//10/2015. Economia, p. 19

 

A taxa de desemprego das seis maiores regiões metropolitanas do país ficou em 7,6% em setembro, a mais alta para um mês desde 2009. O número mostra um salto em relação aos 4,9% registrados no mesmo mês do ano passado, o que significa um aumento de 56,6% no contingente de desempregados, ou 670 mil pessoas a mais. Desse total, 25%, ou 170 mil, estão no Rio de Janeiro, região com maior crescimento do número de desempregados— alta de 86,5% em um ano. Com isso, mesmo se mantendo abaixo da média das regiões, a taxa de desemprego do Rio chegou a 6,3%, quase o dobro dos 3,4% registrados um ano antes, mostram dados da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE

Para o economista Fernando de Holanda Barbosa, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas, o mercado de trabalho fluminense está sendo fortemente afetado pela crise da Petrobras. A estatal cortou investimentos causando prejuízos a toda cadeia de prestadores de serviços de óleo e gás:

— O impacto da Petrobras é colossal. Complexo de refinarias, a indústria naval, estaleiros. Todos foram impactados, destruindo vagas. EFEITO VERÃO O economista Claudio Dedecca, do Instituto de Economia da Unicamp, aponta ainda as razões sazonais que pressionam a procura de vagas no Rio.

— É uma época em que muita gente que não estava trabalhando se lança em busca de uma oportunidade por conta da chegada do verão, para trabalhos turísticos e ligados à praia — explica.

Na comparação com os meses de julho e agosto, a taxa de desemprego das regiões cobertas pela pesquisa — Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre e Recife — ficou praticamente estável, quebrando a tendência histórica de queda do desemprego no segundo semestre. A única exceção foi São Paulo, onde a taxa recuou de 8,1% em agosto para 7,3% em setembro.

— A queda na taxa de desemprego ocorrida em São Paulo deveria estar acontecendo em todas as outras regiões, pois, historicamente, os meses de julho, agosto e setembro têm mais pessoas trabalhando em razão da demanda extra para atender as vendas do varejo no fim do ano — diz José Marcio Camargo, professor de Economia da PUC- RJ.

Para Dedecca, a queda em São Paulo reflete um estancamento das demissões, já que a indústria, que é a segunda atividade que mais emprega na região, já havia feito muito cortes e tem segurado pessoal para a produção para o fim de ano.

Adriana Beringuy, técnica da Coordenação de Trabalho e Renda do IBGE, acrescenta que parte dessa pressão extra no mercado — que não contrata — pode ter sido motivada pela queda na renda, que vem perdendo a corrida para a inflação. Na passagem de agosto para setembro, o rendimento médio real ( descontado o impacto da inflação) caiu 0,8%, e, em relação ao mesmo mês de 2014, a perda foi de 4,3%.

— O aumento expressivo da população desocupada pode ser reflexo justamente da queda na renda, pois impacta no rendimento do domicílio e leva mais pessoas da família, que estavam inativas, a pressionarem o mercado — analisa Adriana. CAGED MOSTRARÁ MAIS DESEMPREGO, DIZ MINISTRO A renda média do trabalhador do Rio caiu mais do que a média e, na passagem de agosto para setembro, a perda foi a maior dentre as regiões pesquisadas: 5,1%. Na comparação com setembro de 2014, o rendimento da região ficou 5,5% menor, em R$ 2.445,80. A queda no poder de compra atingiu todos os segmentos da economia fluminense, mas foi mais acentuada nos setores que mais empregam. É o caso do grupo de outros serviços, que engloba trabalhadores de hotéis, bares, restaurantes e motoristas de ônibus — cujo rendimento real caiu 11,9% na passagem de agosto para setembro. Para Dedecca, não fosse a queda na renda, o desemprego poderia ser ainda maior, pois as empresas teriam de demitir mais para equilibrar custos.

Em Brasília, o ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, adiantou ontem que Cadastro Geral de Empregados e Desempregados ( Caged), que deverá ser anunciado hoje, vai reforçar que o aumento do desemprego no país continua. No mês passado, o Caged demonstrou que 86.543 pessoas perderam o emprego. Rossetto não adiantou os números que estarão no Caged, mas foi taxativo sobre o desemprego:

— Haverá redução do nível de emprego formal. Sexta- feira ( hoje) vamos ter isso.

 

Analistas preveem taxa próxima de 10% ano que vem

 

O processo de ajuste no mercado de trabalho ainda está longe de seu fim, e o desemprego deve crescer com mais força no ano que vem e chegar ao pico no fim de 2016, acreditam economistas. E a piora tende a ser generalizada, castigando com força inclusive o setor de serviços, que nos últimos anos concentrou a criação de vagas.

— Ainda estamos na metade do ajuste e vamos viver uma situação em que a taxa de desemprego vai dobrar em relação ao seu patamar mínimo, que foi há pouco mais de um ano. É um ajuste bem severo — avaliou Marcelo Kfoury, superintendente do Departamento Econômico do Citi Brasil.

A menor taxa de desemprego no país foi registrada em junho do ano passado, 4,8%. Agora, ela está em 7,6%. Na projeção do Citi, o ápice será a partir do terceiro trimestre do ano que vem, quando o índice deverá chegar a 9,4%, ou seja, atingirá o dobro da mínima histórica em pouco mais de dois anos. Kfoury compara essa evolução ao que aconteceu nos Estados Unidos, quando o desemprego dobrou entre o fim de 2007 e 2009.

Já nas contas do Santander, o auge do desemprego será em outubro de 2016, com taxa de 9,5%. Mas desconsiderando os efeitos sazonais, o pico será em fevereiro de 2017, quando chegará a 10,4%, para, então, começar a recuar.

— Estamos em um quadro recessivo há algum tempo, mas os empresários esperam um pouco para tomar a decisão de demitir, já que os custos demissionais e também de contratação e treinamento são elevados — avalia Rodolfo Margato economista do Santander.

Juan Jensen, professor de economia do Insper, diz que esse processo era previsto.

— Primeiro a empresa adota férias coletivas, depois faz acordos como o Programa de Proteção ao Emprego ( PPE) e por fim ocorre a demissão de fato.

Para os economistas, no entanto, o ajuste no mercado de trabalho tem seu lado positivo, inclusive para conter a inflação, via queda de consumo.

— Por mais perverso que possa parecer, era necessário um ajuste. Perdemos participação na indústria, porque ficamos caros, com a renda aumentando mais que a produtividade — afirmou Kfoury.

 

Falta vaga até para Papai Noel

 

Até os candidatos a Papai Noel sofrem com o desemprego. Em curso para encenar o bom velhinho, o número de alunos dobrou, mas o comércio pretende contratar menos este ano. A taxa de desemprego no Rio subiu para 6,3%. Apiora no mercado de trabalho não poupou nem o Papai Noel. A dois meses do Natal, a procura do comércio pelos profissionais que personificam o bom velhinho caminha a passos lentos. O diretor da Escola de Papai Noel do Brasil, Limachem Cherem, conta que lojistas têm sinalizado não ter condições de pagar mais do que no ano passado pelos cerca de 40 dias de trabalho e têm adiado a contratação para barganhar lá na frente:

ALEXANDRE CASSIANOSonho de Natal. Desempregado pelo setor naval há mais de um ano, Rodrigo Martin, de 60 anos, deixou a barba crescer e foi fazer curso para tentar trabalho como bom velhinho

— A procura está muito menor do que nos anos anteriores Quanto mais perto da data o comércio deixar para contratar, maior é a possibilidade de um Papai Noel aceitar o que for oferecido para não ficar sem trabalho — diz.

Para piorar o cenário, a escola recebeu o dobro de candidatos ao curso preparatório de Papai Noel do que em anos anteriores. Já são 200, muitos deles desempregados que não conseguem recolocação em sua área ou aposentados à procura de renda para complementar o orçamento da família.

Sem emprego desde junho do ano passado, quando a empresa na qual trabalhava o dispensou, o técnico em estrutura naval Rodrigo Martin, 60 anos, viu no curso uma chance de escapar de um Natal magro. Deixou até a barba crescer.

— A gente já tem bastante idade e se vê sem perspectiva. Eu e minha esposa tivemos de cortar tudo para viver da rescisão. Espero conseguir um bom contrato — conta esperançoso.

A maioria dos candidatos, porém, não conseguiu vaga no curso por não ter perfil para incorporar o bom velhinho — mais de 50 anos, barba e uma barriga avantajada —, diz Cherem:

— Teve gente desempregada de 25, 30 anos ligando para se inscrever. Mas nem os aceitamos no curso, porque seria perda de tempo para eles.

Os papais noéis formados na escola, que funciona no Rio, são indicados para trabalhos que podem render entre R$ 3 mil e R$ 15 mil por 40 dias de atuação em shopping. Numa visita à residência, empresa ou hospital é possível embolsar mais R$ 400.

Aldo Gonçalves, presidente do Clube de Dirigentes Lojistas do Rio, confirma que a retração no consumo vai afetar investimentos no Natal.

— Tem comércio que vai cortar a contratação de Papai Noel. Shopping até consegue manter esse investimento, já que o valor é rateado. Mas para o lojista pequeno fica mais difícil. Pode ocorrer até uma improvisação, e um funcionário da loja assumir esse papel.