Amigo de Dirceu que se tornou delator na Lava-Jato deixa prisão

 

JAQUELINE FALCÃO E CLEIDE CARVALHO 

O globo, n. 30038, 03//11/2015. País, p. 4

 

O lobista Fernando Antônio Hourneaux de Moura, amigo do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, preso na 17ª fase da Operação Lava-Jato, foi solto ontem de manhã, após passar três meses na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba. Preso em agosto, ele assinou acordo de delação premiada um mês depois.

GERALDO BUBNIAK/3-8-2015Em casa. Moura cumprirá prisão domiciliar no condomínio onde vivia Dirceu

Denunciado por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, por ter se associado ao ex-ministro para obter vantagens ilícitas em contratos da Petrobras, Moura cumprirá prisão domiciliar por três anos no mesmo condomínio Santa Fé onde morava Dirceu, em Vinhedo (SP).

Moura admitiu ter recebido R$ 2,3 milhões em propina até 2013. Em depoimento, disse ter atuado com o então secretáriogeral do PT, Silvio Pereira, em 2002, para selecionar os nomes que assumiriam os 32 mil cargos comissionados no governo federal no primeiro mandato do ex-presidente Lula. Por indicação de um dos sócios da empreiteira Etesco, emplacou Renato Duque na Diretoria de Serviços da Petrobras.

Com Duque no cargo, a empreiteira foi beneficiada com contratos. Foi Moura também quem aproximou da Petrobras as empresas Hope e Personal, que seguem investigadas na Lava-Jato. A Hope fechou R$ 3,5 bilhões em contratos com a Petrobras entre 2007 e 2014. A Personal, R$ 2,2 bihões.

Moura afirmou que a Etesco pagava 3% de propina sobre o valor dos contratos, dos quais dois terços eram destinados para o diretório regional do PT. Ele contou ter viajado com Sílvio Pereira para levar dinheiro a diretórios do PT no Rio, Vitória e Fortaleza nas campanhas municipais de 2004.

Quando Pereira foi flagrado no escândalo do mensalão, por ter recebido uma Land Rover da empresa GDK, o lobista procurou Dirceu e disse ter sido orientado a deixar o país “até a poeira baixar”. Em 2006, passou a viver em Miami e a receber “mesada” de R$ 100 mil mensais. Comprou um apartamento na Avenida Collins, em Miami Beach, e um automóvel Aston Martin.

A Polícia Federal estimou que Dirceu recebeu cerca de R$ 19 milhões em propinas (o ex-ministro nega) e que Moura ficou com R$ 5,9 milhões. Moura admitiu ter recebido menos da metade desse valor. Pelo acordo, 20% de seus bens no exterior serão confiscados, e ele pagará multa equivalente a 80% de seus bens fora do Brasil — a relação de bens não foi divulgada.

 

MP português apura suposta propina a petistas

 

 O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu completa hoje três meses de prisão na Operação Lava-Jato com um motivo a mais para se preocupar. Segundo reportagem publicada ontem no jornal português “Público”, a Procuradoria-Geral da República de Portugal investiga se a associação entre a Oi e a Portugal Telecom, em 2010, rendeu comissões a integrantes do PT no Brasil. Segundo o jornal, a exigência teria sido de 50 milhões de euros, com depósito a ser feito em Macau. O pagamento de comissão teria sido feito por acionistas da Oi, encabeçados pela Andrade Gutierrez, por movimentações via Angola ou Venezuela.

Em janeiro deste ano, a sede da Portugal Telecom, em Lisboa, foi alvo de operação policial. O jornal afirma que o negócio foi intermediado pelo escritório Fernando Lima, João Abrantes Serra e José Pedro Fernandes (LSF & Associados), ligado a Dirceu. Segundo a reportagem, o escritório recebeu pagamentos da Portugal Telecom de 50 mil euros mensais. Teria recebido 200 mil euros até os pagamentos serem suspensos por decisão interna. O jornal informa que o escritório confirmou ter atuado na negociação entre a Portugal Telecom e a Oi. O advogado de José Dirceu, Roberto Podval, disse que as investigações em Portugal são sigilosas e que não tem informações sobre o assunto.

Integrantes da força-tarefa da Lava-Jato confirmam que as informações sobre a Operação Marquês, que levou à prisão o ex-primeiro ministro português José Sócrates, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e outras derivadas dela, como a do Banco Espírito Santo e Portugal Telecom, estão sendo compartilhadas com o Brasil, que também colabora, como contrapartida.

— Há parceria e troca de informações com Portugal — afirmou a fonte.

Em nota, a Andrade Gutierrez informou que não fará mais pronunciamentos “para garantir que não haja qualquer prejuízo à defesa de seus colaboradores e ex-colaboradores”. Executivos da empresa são réus na Lava-Jato.